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Setembro 2020
Tempo Comum - Anos Pares
XXIII Semana - Quarta-feira
Lectio
Primeira leitura: 1 Coríntios 7, 25-31
Irmãos: 25A respeito de quem é solteiro, não tenho nenhum preceito do Senhor,
mas dou um conselho, como homem que, pela misericórdia do Senhor, é digno de
confiança. 26Julgo, pois, que essa condição é boa, por causa das angústias
presentes; sim, é bom para o homem continuar assim. 27Estás comprometido com
uma mulher? Não procures romper o vínculo. Não estás comprometido? Não procures
mulher. 28Todavia, se te casares, não pecas; e se uma virgem se casar, também
não peca. Mas estes terão de suportar as tribulações corporais e eu quisera
poupar-vos a elas. 29Eis o que vos digo, irmãos: o tempo é breve. De agora em
diante, os que têm mulher, vivam como se não a tivessem; 30e os que choram,
como se não chorassem; os que se alegram, como se não se alegrassem; os que
compram, como se não possuíssem; 31os que usam deste mundo, como se não o
usufruíssem plenamente. Porque este mundo de aparências está a terminar.
Paulo lembra às pessoas virgens uma verdade fundamental: «o tempo é breve» (v.
29), que poderia traduzir-se literalmente: o tempo já embrulhou as velas,
lembrando uma expressão das artes náuticas dos gregos, usada ao aproximar-se de
um porto. Paulo parece pensar o seguinte: qualquer que seja o tempo que falta
para o regresso glorioso do Senhor, o mundo futuro já está presente no meio de
nós, graças ao Ressuscitado; pela morte e ressurreição de Jesus, Deus já
inaugurou em nós, e no meio de nós, a novidade do seu reino. A esta luz, a
virgindade, livre e alegremente escolhida pelo Reino (cfr. Mt 19, 12), longe de
ser um desprezo pelo matrimónio, constitui um sinal escatológico que tende a
orientar a nossa esperança, e a dos outros, para a alegria definitiva. As
exortações são consequências lógicas da verdade anunciada. Em primeiro lugar, é
preciso viver a espiritualidade do «como se» (vv. 29-31). Depois vem da lógica
de «o que é melhor» (cfr. 7, 9: «é melhor casar-se do que ficar abrasado»; 7,
38.40: «quem a não desposa ainda faz melhor»). Paulo pretende propor à nossa
liberdade aquilo que ele, por experiência pessoal e pelo que o liga a Cristo,
está convencido de que é o melhor a desejar e a realizar.
Em segundo lugar - mas é apenas um conselho seu - quando alguém chega à fé em
Cristo, continue a viver como casado ou como virgem, na situação em que se
encontrava. Mas o mais importante - e é nisso que Paulo se apoia - é a
consciência de que fomos «comprados por um alto preço» (7, 23), por Cristo
Jesus, pela sua morte e ressurreição. É sempre o mistério pascal que projecta
luz sobre a nossa vida.
Evangelho: Lucas 6, 20-26
Naquele tempo, Jesus 20Erguendo os olhos para os discípulos, pôs-se a dizer:
«Felizes vós, os pobres, porque vosso é o Reino de Deus. 21Felizes vós, os que
agora tendes fome, porque sereis saciados. Felizes vós, os que agora chorais,
porque haveis de rir. 22Felizes sereis, quando os homens vos odiarem, quando
vos expulsarem, vos insultarem e rejeitarem o vosso nome como infame, por causa
do Filho do Homem. 23Alegrai-vos e exultai nesse dia, pois a vossa recompensa será
grande no Céu. Era precisamente assim que os pais deles tratavam os profetas».
24«Mas ai de vós, os ricos, porque recebestes a vossa consolação! 25Ai de vós,
os que estais agora fartos, porque haveis de ter fome! Ai de vós, os que agora
rides, porque gemereis e chorareis! 26 Ai de vós, quando todos disserem bem de
vós! Era precisamente assim que os pais deles tratavam os falsos profetas».
Lucas reduz as bem-aventuranças a quatro, acrescentando os quatro «ai de vós».
Segundo os exegetas, o texto de Lucas seria mais próximo da verdade histórica
das palavras de Jesus, o que lhe daria especial relevo. Mas convém recordar que
as mediações dos vários evangelistas, ao referirem os ensinamentos de Jesus,
não atraiçoam a verdade da mensagem. Pelo contrário, focalizam-no e relêem-na
para bem das suas comunidades.
Tanto as oito bem-aventuranças de Mateus, como as quatro de Lucas, podem
reduzir-se a uma só: a bem-aventurança de quem acolhe a palavra de Deus na
pregação de Jesus e procura adequar a vida a essa palavra. O verdadeiro
discípulo de Jesus é, ao mesmo tempo, pobre, manso, misericordioso, fazedor de
paz, puro de coração, etc. Pelo contrário, quem não acolhe a novidade do
Evangelho merece todas as ameaças que, na boca de Jesus, correspondem a
profecias de tristeza e de infelicidade. O texto de Lucas caracteriza-se pela
contraposição ente o «já» e o «ainda não», entre o presente histórico e o
futuro escatológico. Obviamente a comunidade para a qual Lucas escrevia
precisava de ser alertada para a necessidade de traduzir a sua fé em gestos de
caridade evangélica, mas também para a de manter viva a esperança, pela total
adesão à doutrina, ainda que radical, das bem-aventuranças evangélicas.
Meditatio
A Palavra de Deus oferece, hoje, um tema forte e actual para a nossa meditação:
que é melhor para um cristão: o matrimónio ou a virgindade. O que é mandamento
e o que é só conselho?
Paulo oferece à comunidade de Corinto, e a todos nós, uma doutrina clara e
equilibrada. Até que ponto a sua experiência pessoal teve influência nesta
doutrina? Não sabemos. Mas sabemos que o encontro com Jesus no caminho de
Damasco deu uma nova orientação à sua vida, fez nascer nele uma nova
mentalidade e, portanto, uma nova capacidade de julgar.
Uma doutrina clara: o Apóstolo leva-nos a considerar, tanto o matrimónio como a
virgindade, duas opções de vida dignas da pessoa humana, ambas boas de acordo
com a economia da criação, ambas em sintonia com a novidade de vida de quem
acredita em Cristo, ambas ricas de espiritualidade, ambas "lugares" onde
viver a caridade em sumo grau, ambas capazes de conduzirem os crentes aos cumes
da santidade.
Uma doutrina equilibrada: Paulo não impõe nada a ninguém, sabendo que se trata
de uma opção pessoal livre e alegre, digna da pessoa humana. Ninguém, nem sequer
Deus, pode fazer violência ao santuário da consciência humana.
Pela profissão religiosa e pela prática dos conselhos evangélicos,
concretamente do celibato consagrado, devemos ser as testemunhas por
excelência, no meio do povo de Deus, desta exigência das bem-aventuranças na
prática de uma autêntica vida cristã.
Se reflectirmos com atenção, as bem-aventuranças, tal como as lemos no
Evangelho de Mateus (cf. 5, 3-13), ultrapassam o campo moral, para envolverem
toda a nossa vida: damos espaço a Jesus para que seja pobre em espírito na
nossa pobreza, manso na nossa mansidão, sofredor pelos males do mundo na nossa
aflição, faminto e sedento de justiça, misericordioso, puro de coração, obreiro
de paz, perseguido em nós perseguidos...
Se também reflectirmos no facto de que as bem-aventuranças se vivem praticando
todas as virtudes teologais e morais de modo habitual, com facilidade, sob o
influxo dos dons do Espírito Santo e irradiando os seus frutos saborosos (cf.
Gl 5, 22), então compreenderemos como viver as bem-aventuranças seja viver o
mandamento do Senhor, a caridade: o amor de Deus e o amor do próximo (cf. Mt
22, 37-39; 1Jo 4, 7-21). Se isto é válido para todos os cristãos e para todos
os religiosos, é especialmente válido para os «Oblatos, Sacerdotes do Coração
de Jesus» (Cst. 6), que têm como «carisma profético» (Cst. 27) a oblação de
amor unida «à oblação reparadora de Cristo ao Pai pelos homens» (Cst. 6). Desse
modo, também praticamos os nossos votos religiosos, nas «perspectiva
espiritual» do Pe. Dehon «reconhecida pela Igreja», isto é, «procurar... como o
único necessário, uma vida de união à oblação de Cristo» e realizar «o nosso
carisma profético» que nos coloca «ao serviço da missão salvífica do Povo de
Deus no mundo de hoje» (Cst. 27). «Professamos os conselhos evangélicos com os
votos de celibato consagrado, de pobreza e de obediência (cf. LG 44, PC 1)»
(Cst. 40). Mais do que os votos de pobreza e de obediência, é o voto de
celibato consagrado que caracteriza o estado religioso como forma de vida. Mas
também os outros votos, sendo vividos «segundo o espírito das bem-aventuranças»
(Cst. 40), que são a vida de Cristo pobre, manso, aflito... em nós, são reais
estados de vida, de acordo com as exigências radicais do Evangelho; não são,
portanto, apenas obrigações jurídicas que temos de cumprir.
É assim que o Pe. Dehon quer que compreendamos e vivamos os nossos votos
religiosos. Escreve nas Cst de 1885: «Os votos de pobreza, de castidade e de
obediência, que constituem formalmente o estado religioso, são comuns a todas
as congregações; mas diversificam-se na sua aplicação prática, conforme o fim
especial que se propõe cada uma das congregações. Os Sacerdotes do Coração de
Jesus compreenderão que... estes votos, constituem já (por si mesmos) o
religioso em estado de vítima, em união com Jesus Cristo».
Oratio
Senhor Jesus, obrigado por nos teres escolhido e chamado a professar os
conselhos evangélicos com os votos de celibato consagrado, de pobreza e de
obediência, que nos libertam para um amor autêntico, segundo o espírito das
Bem-aventuranças. Agradecemos-te, hoje, de modo particular o dom do celibato
consagrado, que intimamente nos aproxima da tua caridade total e oblativa. Com
ele queremos expressar a nossa doação integral ao Pai, a consagração total da
mente, do coração, da alma e do corpo: "Seduziste-me, Senhor, e eu
deixei-me seduzir"(Jer 20, 7). Mas queremos também significar o dom de nós
mesmos aos irmãos, em pobreza, mansidão, pureza de coração, trabalho pela
justiça e pela paz.
Dá-nos o teu Espírito para que, vivendo a nossa condição de redimidos e de
chamados a partilhar o teu estilo de vida, e a tua missão, sejamos teus
cooperadores na construção do mundo novo. Amen.
Contemplatio
A virgindade é mais do que a castidade. Ela dá às almas o privilégio de ter no
céu uma intimidade particular com o Sagrado Coração. «As virgens, diz S. João,
seguem o cordeiro onde quer que Ele vá» (Ap 14).
A Bem-Aventurada Margarida Maria vai-nos ensinar, pelos seus exemplos, mais
ainda do que pelas suas palavras, como é preciso responder ao apelo do Esposo
das virgens, que modelo é preciso seguir e que meios é preciso empregar.
O apelo que Nosso Senhor dirige a algumas almas privilegiadas, de se alistarem
sob o estandarte virginal, quer no sacerdócio, quer na vida religiosa, quer no
meio do mundo é uma graça de predilecção. As almas que o escutam devem
apressar-se a responder-lhe, depois de terem consultado os seus directores.
... Felizes as almas generosas e vigilantes que, escutando o apelo do Esposo
divino: Ecce sponsus venit, se levantam imediatamente para O seguirem! Fá-las-á
entrar no seu divino Coração, verdadeira sala do festim nupcial: Intraverunt
cum eo ad nuptias.
Felizes também as almas que, depois de se terem dado, perseveram e progridem
nesta virtude cara ao Coração de Jesus!... O templo do Senhor é a alma
santificada pela virgindade. Deus queria que no templo da antiga lei tudo
brilhasse pela pureza... A este preço, o Senhor estava lá especialmente
presente. E o mesmo se passa com a alma virgem. Se ela é fiel, Deus promete-lhe
uma presença especial de protecção e de amor.
A alma virgem tem, portanto, como modelo a pureza do próprio Jesus e as suas
imolações, simbolizadas pela branca hóstia do tabernáculo (Leão Dehon, OSP 2,
p. 449s.).
Actio
Repete frequentemente e vive hoje a Palavra:
«O tempo é breve» (1 Cor 7, 29).
| Fernando Fonseca, scj |
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