-Claretianos
Domingo, 20 de abril de 2014
Domingo da Páscoa do Senhor
Santos do Dia: Hugo de Anzy-le-Duc
(monge), Inês de Montepulciano (dominicana, virgem), Marcelino
de Embrun (bispo), Vicente e Domnino (todos mártires da
África), Marciano
de Auxerre (monge), Sulpício e Serviliano (mártires
de Roma),
Teodoro Trichinas (eremita), Teótimo de Tomi (bispo),
Vítor, Zótico, Zenão, Acindino, Cesário, Severiano, Teonas,
Antonino e outros Companheiros (mártires da Nicomédia).
Primeira leitura: Atos dos Apóstolos 10, 34a.37.43
Comemos e bebemos com ele depois que ressuscitou dos mortos.
Salmo responsorial: 117, 1-2.16ab-17.22-23
Este é o dia que o Senhor fez para nós: alegremo-nos e nele exultemos!
Segunda leitura: Colossenses 3, 1-4
Esforçai-vos por alcançar as coisas do alto, onde está Cristo.
Evangelho: João 20, 1-9
Ele devia ressuscitar dos mortos.
Comemos e bebemos com ele depois que ressuscitou dos mortos.
Salmo responsorial: 117, 1-2.16ab-17.22-23
Este é o dia que o Senhor fez para nós: alegremo-nos e nele exultemos!
Segunda leitura: Colossenses 3, 1-4
Esforçai-vos por alcançar as coisas do alto, onde está Cristo.
Evangelho: João 20, 1-9
Ele devia ressuscitar dos mortos.
Evangelho para
missa vespertina: Lucas
24,13-35
A) Primeiro
comentário
Para este domingo de Páscoa a liturgia nos
oferece como primeira leitura um dos discurso de Pedro, uma vez transformado
pela força de Pentecostes: aquele que pronunciou em do centurião Cornelio,
a propósito do consumo de alimentos puros e impuros, o que estava em íntima
relação com o tema do anúncio do Evangelho aos não judeus e de seu ingresso à
nascente comunidade cristã.
O discurso de Pedro é um resumo da proclamação típica do Evangelho que
contem os elementos essenciais da historia da salvação e das promessas de Deus
cumpridas em Jesus. Pedro e os demais apóstolos pregam a morte de Jesus pelas
mãos dos judeus, porém, também sua ressurreição por obra do Pai, porque “Deus
estava com ele”.
De modo que a morte e ressurreição de Jesus são a via de acesso
de todos os homens e mulheres, judeus e não judeus à grande família
surgida da fé em sua pessoa como Filho e Enviado de Deus, e como Salvador
universal; uma família onde não há exclusões de nenhum tipo. Esse é um dos
principais sinais da ressurreição de Jesus e o meio mais efetivo para comprovar
ao mundo que ele se mantém vivo na comunidade.
Uma comunidade, um povo, uma sociedade onde
há excluídos ou marginalizados, onde o rigor das leis divide e separa uns de
outros, é a antítese do efeito primordial da ressurreição; e em muito maior
medida em se tratando de uma comunidade ou de um povo que diz chamar-se cristão.
O evangelho de João apresenta Maria Madalena
madrugando para ir ao sepulcro de Jesus. “Contudo estava escuro”, sublinha o
evangelista. É preciso ter em conta este detalhe porque João gosta de usa esses
símbolos em contraste: luz-trevas, mundo-espírito, verdade-falsidade, etc.
Maria, pois, permanece às escuras; não experimentou ainda a realidade da
ressurreição.
Ao ver que a pedra com eu haviam tapado o
sepulcro tinha sido retirada, não entra, como o fazem as mulheres no relato lucano,
mas que volta para buscar a Pedro e o “outro discípulo”. Ela
permanece submissa à figura masculina; sua reação natural é deixar que
sejam eles quem vê e comprovem e que depois digam, eles mesmos, o que viram.
Este é outro contraste com o relato lucano. Porém, inclusive entre
Pedro e o outro discípulo que Jesus “amava muito”, existe no relato de João uma
certa rejeição de tipo hierárquico: em que pese que o “outro discípulo” correu
mais, devia ser Pedro, o de maior idade, quem deveria entrar por primeiro
e olhar. Efetivamente, na tumba somente estão as amarras e o sudário; o corpo
de Jesus desaparece. Vendo isto creram, entenderam que a escritura dizia que
ele tinha que ressuscitar e partiram para comunicar tão transcendental noticia
aos demais discípulos. A estrutura simbólica do relato fica perfeitamente
construída.
A ação transformadora mais palpável da
ressurreição de Jesus foi a partir de então sua capacidade de transformar o
interior dos discípulos – antes desagregados, egoístas, divididos e
atemorizados – para voltar a convocá-los ou reunidos em torno da causa do
Evangelho e enchê-los do seu espírito de perdão.
A pequena comunidade dos discípulos, não
somente havia sido dissolvida pela falta de justiça contra Jesus, mas também
pelo medo de seus inimigos e pela insegurança que deixa em um grupo a traição
de um de seus integrantes. Os corações de todos estavam feridos. À
hora da verdade, todos eram dignos de reprovação: ninguém havia entendido
corretamente a proposta do Mestre. Por isso, quem não havia traído o havia
abandonado à própria sorte. E se todos eram dignos de reprovação, todos estavam
necessitados de perdão.
Voltar a dar coesão à comunidade de seguidores, dar-lhes unidade
interna no perdão mútuo, na solidariedade, na fraternidade e na igualdade, era
humanamente impossível. Contudo, a presença e a força interior do ressuscitado
conseguiu reunir novamente o grupo.
Quando os discípulos desta primeira
comunidade sentem interiormente esta presença transformadora de Jesus e quando
a comunhão é quando realmente experimental sua ressurreição. E é então quando
já não precisam mais das provas exteriores da mesma. O conteúdo simbólico dos
relatos do ressuscitado atuante que apresentam à comunidade, revela o processo
renovador que opera o ressuscitado no interior das pessoas e
do grupo.
Magnífico exemplo do que o efeito da
ressurreição pode produzir também hoje em nós, no âmbito pessoal e comunitário.
A capacidade do perdão; da reconciliação conosco mesmos, como naquele punhado de homens tristes, covardes e dispersos a
que o milagre da ressurreição transformou.
B) SEGUNDO ESQUEMA – O RESSUSCITADO E O CRUCIFICADO
Como em outros anos, incluímos aqui um segundo
esquema
de homilia, nitidamente na linha da espiritualidade latino-americana
da libertação, que intitulamos “O Ressuscitado é o Crucificado”.
O que não é
a ressurreição de Jesus ?
Pode-se dizer teologicamente que
a ressurreição de Jesus não é um fato
“histórico”, com isto não se quer dizer que seja um fato
irreal, mas que sua realidade está mais além do
físico. A ressurreição de Jesus não é um fato
realmente que possa ser registrado pela
historia: ninguém teria a possibilidade de fotografar a ressurreição.
Objeto de nossa fé,
a ressurreição de Jesus é mais que um fenômeno físico.
De fato,
os evangelhos não narram a ressurreição: ninguém a viu.
As testemunhas falam a partir
de suas experiências de crentes: sentem que
o ressuscitado “está
vivo”, porém não são testemunhas do
fato mesmo da ressurreição.
A ressurreição de Jesus não tem semelhança alguma com o
“reavivamento” de Lázaro. Jesus não voltou a esta vida nem
aconteceu a reanimação de um cadáver (de
fato, em teoria, não teríamos problema em acreditar
na ressurreição de Jesus ainda que seu cadáver houvesse ficado entre nós,
porque o corpo ressuscitado não é, sem mais, o
cadáver). A ressurreição (tanto
de Jesus quanto a nossa) não é uma volta
para trás, mas um passo
adiante, um passo para outra forma de vida, a vida de
Deus.
Importa realçar este aspecto
para que nos demos conta de
que nossa fé na ressurreição não é
a adesão a um “mito”
como ocorre em tantas religiões,
que possuem seus mitos
de ressurreição. Nossa afirmação da ressurreição não tem por
objetivo um fato físico, mas uma verdade de fé com um sentido mais
profundo, que é o que queremos desenvolver.
A “boa noticia” da ressurreição foi conflitiva
Uma primeira leitura de Atos provoca estranheza:
por que a notícia da ressurreição suscitou a ira e
a perseguição por parte dos judeus? Noticias
de ressurreição não eram tão infreqüentes naquele mundo
religioso. Não deveria ofender a ninguém a noticia de
que alguém tivesse tido a sorte de
ser ressuscitado por Deus.
Contudo,
a ressurreição de Jesus foi recebida com uma gravidade extrema
por parte das autoridades judaicas. Faz pensar no forte contraste com a
situação atual: hoje ninguém se
irrita ao escutar essa notícia.
A ressurreição de Jesus hoje provoca indiferença?
Por que esta indiferença? Será que não anunciamos
a mesma ressurreição? Ou não anunciamos
a mesma coisa no anúncio da ressurreição de Jesus?
Lendo mais atentamente
o livro de Atos, percebe-se que
o anúncio mesmo que faziam os apóstolos tinha um ar
polêmico: anunciavam a ressurreição "desse
Jesus a quem vocês crucificaram”. Isto é, não anunciavam a ressurreição em abstrato,
como se a ressurreição de Jesus fosse simplesmente a afirmação do prolongamento
da vida depois da morte. Tampouco estavam anunciando
a ressurreição de alguém qualquer, como se o que importante
fosse simplesmente que um ser humano, qualquer que fosse, havia transpassado as
portas da morte.
O crucificado e o ressuscitado
Os apóstolos anunciavam uma ressurreição muito concreta:
a daquele homem chamado Jesus, a quem as
autoridades civis e
religiosas haviam rejeitado, excomungado e
condenado. Quando Jesus foi atacado pelas
autoridades, ficou só. Seus discípulos o abandonaram,
e Deus mesmo guardou silencio como
se estivesse de acordo. Tudo parecia concluir com a crucificação.
Porém, aí ocorreu algo. Uma experiência nova
e poderosa
se lhes impôs: sentiram que estava vivo. Foram invadidos
por uma certeza estranha: que
Deus confirmava a missão de Jesus e
se empenhava em reivindicar seu nome e sua honra.
“Jesus está
vivo; não puderam vencê-lo com a morte. Deus
o ressuscitou, sentou-o à sua direita, confirmando
a veracidade e o valor de sua vida,
de sua palavra, de sua Causa. Jesus tinha razão e não as
autoridades que o expulsaram deste mundo
e desprezaram sua Causa. Deus está do lado de Jesus, Deus
respalda a Causa do Crucificado. O crucificado ressuscitou e
vive!
E foi isto que verdadeiramente irritou as
autoridades judaicas: Jesus deixou-as irritadas estando vivo e,
igualmente, estando ressuscitado. Também a elas, o que
as irritava não era o fato
físico mesmo de uma ressurreição, que um ser
humano morra ou ressuscite; o que não podiam tolerar
era pensar que a Causa
de Jesus, seu projeto, sua utopia,
que já haviam considerado tão perigosa em vida
e que já acreditavam enterrada, voltasse e
se colocasse novamente em pé, isto é,
que houvesse ressuscitado. E não podiam aceitar que
Deus estivesse se comprometendo por aquele crucificado,
condenado e excomungado.
Eles acreditavam em outro Deus.
Crer com a fé de Jesus
Porém, os discípulos
que redescobriram em Jesus o rosto de Deus (como o Deus
de Jesus) compreenderam que Jesus era o Filho,
o Senhor, a Verdade, o Caminho, a Vida, o Alfa, o Ômega.
A morte não tinha nenhum poder sobre
ele. Estava vivo. Havia ressuscitado.
E não podiam senão confessá-lo e “segui-lo”,
“aderindo à sua Causa”, obedecendo a Deus antes
que aos homens, ainda que custasse a vida.
Trata-se de crer que
a ressurreição não é para eles
a afirmação de um fato físico-histórico,
que aconteceu ou não, nem uma verdade teórica abstrata (a
vida pós-morte), mas a afirmação contundente da validez suprema
da Causa de Jesus, à altura mesma de Deus
(à direita de Deus Pai),
pela qual é necessário viver e lutar até
a doação da própria vida.
E se nossa fé reproduz realmente
a fé de Jesus (sua visão da
vida, sua opção diante da
historia, sua atitude diante dos pobres... ),
será tão conflitiva como o foi na pregação dos
apóstolos ou na vida mesma de Jesus.
Se, no entanto, reduzimos a ressurreição de Jesus a um símbolo
universal da vida pós-morte, ou à
simples afirmação de uma vida
para além da morte, ou a um fato
físico-histórico
que ocorreu há vinte séculos... então essa ressurreição fica esvaziada do conteúdo que teve em Jesus e já não diz nada
a ninguém, nem irrita os poderes deste mundo,
mas chega até a desmotivar ou desmobilizar o seguimento e
o compromisso pala Causa de Jesus.
O importante não é crer em Jesus,
mas crer como Jesus. Não é
ter fé em Jesus, mas ter
a fé de Jesus: sua atitude diante da história, sua opção pelos
pobres, sua proposta, sua luta decidida, sua Causa...
Crer lucidamente em Jesus na
América Latina, ou neste Continente “cristão”, onde a
noticia de sua ressurreição já não irrita a tantos
que invocam seu nome para justificar inclusive
as atitudes contrarias às de Jesus,
implica voltar a descobrir o Jesus histórico e o
sentido da fé na ressurreição.
Crendo com essa fé de Jesus,
as “coisas de cima” e as
da terra não são já duas direções opostas, nem sequer distintas.
As “coisas de cima” são da Terra Nova que
está enxertada já aqui embaixo. É preciso fazê-la
nascer no doloroso parto da História, sabendo que nunca será
fruto adequado de nossa planificação,
mas dom gratuito daquele que vem. Buscar as
“coisas de cima” não é
esperar passivamente que soe a hora escatológica
(que já soou na ressurreição de Jesus), mas
tornar realidade em nosso mundo o Reinado
do Ressuscitado e sua Causa: Reino de vida, de Justiça,
de Amor e de Paz.
Oração comunitária
Ó Deus, origem e fonte de nossa vida,
que
nos enches de alegria por ocasião das festas da Páscoa, ajuda-nos.
Renovados pela grande alegria experimentada pela comunidade,
queremos trabalhar sempre para vencer
a morte e fazer crescer a vida, até que a
experimentemos em sua consumação plena.
Por teu Filho Jesus, morto e ressuscitado. Amém.
Complementamos a reflexão com este
soneto de Pedro Casaldáliga:
“Eu mesmo O verei”
E seremos nós, para sempre,
como és Tu o que foste, em nossa terra,
companheiro de todos os caminhos.
E seremos nós, para sempre,
como és Tu o que foste, em nossa terra,
companheiro de todos os caminhos.
Seremos o que somos, para sempre,
porém gloriosamente restaurados,
como são tuas essas cinco chagas,
imprescritivelmente gloriosas.
porém gloriosamente restaurados,
como são tuas essas cinco chagas,
imprescritivelmente gloriosas.
Como Tu és o que foste, humano, irmão,
exatamente igual na tua morte,
Jesus, o mesmo e totalmente outro,
exatamente igual na tua morte,
Jesus, o mesmo e totalmente outro,
Assim seremos para sempre, exatos,
o que fomos, somos e seremos,
totalmente outros, porém, tão nós mesmos.
o que fomos, somos e seremos,
totalmente outros, porém, tão nós mesmos.
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