19 Abril
2019
Sed unus militum lancea latus ejus aperuit; et
continuo exivit sanguis et aqua. Et qui vidit testimonium perhibuit... Facta
sunt enim haec ut Scriptura impleretur: Os non comminuetis ex eo. Et iterum:
Videbunt in quem transfixerunt (Jo 19, 34- 36).
Mas um dos soldados perfurou-lhe o lado com
uma lança e logo saiu sangue e água. Aquele que o viu é que o atesta... E isto
aconteceu para que se cumprisse a Escritura: nem um só dos meus ossos se há-de
quebrar. E ainda: Hão-de olhar para aquele que trespassaram (Jo 19, 34-36).
Primeiro Prelúdio. O último acto da Paixão de
Cristo, a abertura do seu lado, explica e resume toda a vida do Salvador. Tomou
um Coração para o abrir como a fonte de todas as graças.
Segundo Prelúdio. Dai-me, Senhor, a graça de
beber nas fontes da santidade e do amor.
PRIMEIRO PONTO: A ferida. - Vamos ao Calvário,
depois da morte de Jesus. A multidão afastou-se, os amigos ficam. Alguns
soldados vêm verificar ou, se é o caso, apressar a morte dos pacientes, para
que o espectáculo do seu suplício prolongado não entristeça o dia do sabbat.
Um dos soldados adiantou-se, portanto, e abriu
o lado de Jesus com uma lança. É um grande mistério da história sagrada, onde
tudo é mistério e acção divina. A ferida exterior é aqui a revelação simbólica
da ferida interior, a do amor. O amor, eis o algoz de Jesus! Cristo morreu
porque quis, foi o amor quem o matou ... É assim que a Igreja canta, para
saudar o Coração trespassado do seu esposo: «ó Coração vítima de amor, Coração
ferido por amor. Coração morrendo de amor por nós! O Cor amoris vidime, amore
nostro ssuaum, amore nostri languidum! (Hino do Sagrado Coração).
Nosso Senhor permitiu este golpe de lança para
chamar a nossa atenção para o seu coração, para nos fazer pensar no seu amor
que é a fonte de todos os mistérios da salvação: as promessas do Éden, as
profecias e as figuras da antiga lei, a acção providencial sobre o povo de
Deus, a incarnação, a vida, os ensinamentos e a morte do Salvador. A abertura
do lado de Jesus, é como a fonte que regava o paraíso terrestre, é como a fenda
do rochedo que deu a água para saciar o povo de Israel.
SEGUNDO PONTO: O sangue e a água. - E saiu
sangue e água, diz S. João. O ferro ao retirar-se deixou jorrar uma dupla fonte
de sangue e de água, na qual os Padres da Igreja viram o símbolo desta outra
maravilha de amor, os sacramentos, canais preciosos da graça da salvação. - Rio
de água que, no santo baptismo e no banho da penitência, lava a alma da mácula
original; rio de sangue que cai todas as manhãs nos cálices dos altares, para
se expandir pelo mundo fora, consolar a Igreja sofredora do Purgatório e
reanimar a Igreja que combate sobre a terra; rio refrescante, onde o coração,
ressequido pelos trabalhos e pelas tentações, vai saciar-se de piedade, de
caridade e de santa alegria.
Senhor, concedei-me beber desta água e deste
sangue, para não mais tenha esta sede doentia das coisas do mundo que me
tortura, e que eu seja inebriado pelo vosso amor.
TERCEIRO PONTO: «Olharão para dentro daquele
que trespassaram». - É a palavra do profeta Zacarias, recordada por S. João. O
profeta não disse: «Olharão para aquele que trespassaram», mas «olharão para
dentro daquele que trespassaram: Videbunt in quem transfixerunt» (Jo 19, 38).
S. João aplica estas palavras à abertura do lado de Jesus; devia pensar no
interior de Jesus, no Coração mesmo de Jesus que ele pôde entrever pela chaga
aberta do lado, no momento do embalsamamento.
Esta ferida entrega-nos e abre-nos o Coração
de Jesus. Espiritualmente, nós aí lemos o amor que tudo deu, mesmo a vida.
Neste amor mesmo, nós reconhecemos o motivo e o fim de todas as obras divinas:
Deus criou-nos, resgatou-nos, santificou-nos por amor. No Coração de Jesus, é o
fundo mesmo da natureza divina que nós penetramos na sua mais maravilhosa
manifestação. «Deus é emot». S. João leu isto no Coração de Jesus.
Tenho necessidade de contemplar esta ferida
para ver como eu sou amado e como por minha vez devo amar. Lá hei-de aprender
como um coração amante deve agir, sofrer, tudo dar, até à morte, por Deus e
pelas almas.
Vamos mais profundamente ainda, e vejamos tudo
o que sofreu o mais delicado dos corações: os desprezos, as calúnias, as
traições, os abandonos, as desistências. Todas as dores estão reunidas neste
Coração e transbordam. Sentiu-as todas, a todas santificou. Nas nossas dores,
por mais extremas que sejam, tenhamos confiança na simpatia e na compaixão
deste Coração, que quis assemelhar-se a nós no sofrimento, para ser mais
compassivo e mais misericordioso (Heb 2, 17).
Comecemos nós mesmos lamentar este amor que
não é amado e por compadecer com as suas dores.
Resoluções. - A abertura do Coração de Jesus
recorda-nos o seu amor, a sua bondade, o seu sofrimento. Ele espera de mim o
amor em troca, a gratidão, a compaixão. Eisme aqui, Senhor, para viver convosco
e em Vós. Não permitais que eu jamais me separa de vós e que vos esqueça.
Colóquio com Jesus na cruz.
(Leão Dehon, OSP 3, p. 367ss. Tradução do Pe.
José Jacinto Ferreira de Farias, SCJ)
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