15 de Fevereiro
de 2015
Pouco a pouco o Evangelho de Marcos vai mostrando
quem é Jesus. O episódio de hoje é o terceiro milagre recordado em vista desse
objetivo.
Já vimos, na I leitura, a situação de marginalidade em que se
encontrava o leproso. Essa situação era mais grave no tempo de Jesus, pois tudo
girava em torno do puro/impuro. Quem controlava esse rígido código de pureza
eram os sacerdotes. Cabia a eles declarar o que podia ou não podia ter acesso a
Deus. Deus estaria sob o controle dos sacerdotes e do código de pureza.
O leproso certamente sabia disso. Sabia também que sua vida – e sua
libertação da marginalidade – não dependiam do Templo e dos sacerdotes, pois
estes só constatavam a cura ou a permanência da doença em seu corpo. Diante
disso, o leproso toma uma decisão radical: não vai ao sacerdote, e sim a Jesus.
Ajoelha-se diante dele e pede: “Se quiseres, podes curar-me”. Reconhece que o
poder da cura que o tira da marginalidade não vem da religião dos sacerdotes, e
sim de Jesus. Notemos outro aspecto importante: ao invés de ficar à distância e
gritar sua marginalização, aproxima-se e manifesta sua adesão a Jesus enquanto
fonte de libertação e vida: “Se quiseres, podes curar-me”. Viola a lei para ser
curado.
Jesus quer curar o leproso de sua marginalização, devolvendo-lhe a
vida. Para os homens daquele tempo, curar um leproso era sinônimo de
ressuscitar um morto. Mas a ação de Jesus é precedida por uma reação. De acordo
com a maioria das traduções, a reação de Jesus se traduz em compaixão. Algumas
traduções, porém, em vez de ler “compaixão”, lêem “ira”. Jesus teria ficado
furioso. Não certamente contra o leproso, mas contra o código de pureza que, em
nome de Deus, marginaliza as pessoas, considerando-as como mortas. É contra
esse sistema religioso que Jesus se revolta. E o transgride também.
De fato, acreditava-se que a lepra fosse contagiosa. Jesus quebra o
código de pureza, tocando o leproso. Com isso, de acordo com o sistema
religioso vigente, torna-se impuro: torna-se leproso e fonte de contaminação.
Por exemplo no Lv 5,5-6, além de ficar impuro Jesus deveria oferecer um
sacrifício!. Torna-se marginalizado e não poderá mais entrar publicamente numa
cidade: deverá ficar fora, em lugares desertos, como os marginalizados. O Filho
de Deus foi morar com os marginalizados. Aqui o Evangelho de Marcos mostra quem
é Jesus: é aquele que rompe os esquemas fechados de uma religião elitista e
segregadora, indo habitar entre os banidos do convívio social.
Curado o leproso, Jesus o expulsa. É esse o sentido da expressão “o
mandou logo embora”. A expressão é forte e, ao mesmo tempo, estranha. Mas não é
estranha se a lermos na ótica da ira de Jesus contra o código de pureza que
marginaliza as pessoas: ele não quer que elas continuem vítimas de um sistema
social e religioso que rouba a vida.
Jesus dá uma ordem ao curado: “Não conte isso a ninguém! Vá,
mostre-se ao sacerdote e ofereça o sacrifício que Moisés mandou, como prova
para eles!” Tudo leva a crer que a tarefa da pessoa curada consiste não em
divulgar o milagre, mas em colaborar para que o código de pureza seja abolido.
De fato, ele deverá se mostrar ao sacerdote para que este constate sua cura.
Sinal de que a cura não depende do código de pureza, nem da religião do Templo.
A expressão “como prova para eles” tem este sentido: o sacrifício serve como
testemunho contra o sistema que o declarava um punido por Deus e banido do
convívio social. O sacrifício tem, pois, caráter de denúncia e de abolição do
código de pureza.
Não sabemos se a pessoa curada teve a coragem de testemunhar contra
o sistema religioso que o mantinha na marginalidade. Marcos diz que o curado
“foi e começou a contar e a divulgar muito o fato” (v. 45a). A reação a esse
anúncio é evidente: Jesus não pode mais entrar numa cidade, pois, segundo o
código de pureza, está contaminado e é fonte de contaminação. Todavia, de toda
parte o povo vai procurá-lo, sinal de que está aberto um novo acesso a Deus.
Deus, em seu Filho, pode ser encontrado fora, na clandestinidade, entre os que
o sistema religioso e social discriminou.
muito bom. saber que temos um Deus rico em misericórdia
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