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Novembro 2020
Tempo Comum - Anos Pares
XXXI Semana - Quarta-feira
Lectio
Primeira leitura: Filipenses 2, 12-18
12Caríssimos, 12na mesma medida em que sempre fostes obedientes - não só como
aconteceu na minha presença, mas agora com muito mais razão na minha ausência -
trabalhai com temor e tremor pela vossa salvação. 13Pois é Deus quem, segundo o
seu desígnio, opera em vós o querer e o agir. 14Fazei tudo sem murmurações nem
discussões, 15para serdes irrepreensíveis e íntegros, filhos de Deus sem
mancha, no meio de uma geração perversa e corrompida; nela brilhais como astros
no mundo. 16Conservai a palavra da vida. Para mim será um motivo de glória para
o dia de Cristo, por não ter corrido em vão nem me ter esforçado em vão. 17Mas
alegro-me até mesmo se o meu sangue tiver de ser derramado em sacrifício e
oferta pela vossa fé; sim, com todos vós me alegro. 18Do mesmo modo,
alegrai-vos também vós; sim, alegrai-vos comigo.
Paulo dirige algumas recomendações aos cristãos de Filipos. Cada uma tem a sua
motivação e explicação.
Em primeiro lugar, os cristãos devem dedicar-se com temor e tremor à sua salvação
(v. 12); ao mesmo tempo, devem lembrar-se de que só Deus pode suscitar neles a
capacidade de viver de acordo com a sua vontade (v. 13).
Em segundo lugar, os cristãos devem resplandecer como astros no mundo (v. 15);
não para se exibirem, mas para conservarem «a palavra da vida» (v. 16ª).
Em terceiro lugar, os cristãos hão-de contribuir para o crescimento da alegria
do Apóstolo, na medida em que se dispuserem a oferecer a vida em sacrifício
agradável a Deus, em oblação; isto, não por simples satisfação pessoal, mas
para se assemelharem a Cristo Jesus e se disporem para a comunhão com o Pai (v.
16b-17).
Evangelho: Lucas 14, 25-33
Naquele tempo, 25Seguiam com ele grandes multidões; e Jesus, voltando-se para
elas, disse-lhes: 26«Se alguém vem ter comigo e não me tem mais amor que ao seu
pai, à sua mãe, à sua esposa, aos seus filhos, aos seus irmãos, às suas irmãs e
até à própria vida, não pode ser meu discípulo. 27Quem não tomar a sua cruz
para me seguir não pode ser meu discípulo. 28Quem dentre vós, querendo
construir uma torre, não se senta primeiro para calcular a despesa e ver se tem
com que a concluir? 29Não suceda que, depois de assentar os alicerces, não a
podendo acabar, todos os que virem comecem a troçar dele, 30dizendo: 'Este
homem começou a construir e não pôde acabar.' 31Ou qual é o rei que parte para
a guerra contra outro rei e não se senta primeiro para examinar se lhe é
possível com dez mil homens opor-se àquele que vem contra ele com vinte mil?
32Se não pode, estando o outro ainda longe, manda-lhe embaixadores a pedir a
paz. 33Assim, qualquer de vós, que não renunciar a tudo o que possui, não pode
ser meu discípulo.»
Depois de deixar a casa do fariseu, Jesus encontra-se com a multidão. E o seu
discurso torna-se mais íntimo e radical. No texto de hoje, temos duas parábolas
(vv. 28-32), precedidas (vv. 25-27) e seguidas por dois convites à renúncia (v.
33). Ambas as parábolas convidam à reflexão antes de empreender qualquer
iniciativa, para nos darmos conta se temos capacidade para as terminar. Há que
evitar a ligeireza e a temeridade. Uma vez que se decidiu, também é preciso
avançar com fidelidade: um fracasso devido à indecisão ou à saudade seria
imperdoável. Também o seguimento de Jesus, no caminho que o leva decididamente
para Jerusalém e para o Calvário, é uma empresa muito exigente pela qual é
preciso jogar toda a vida. É sobre esta realidade que se fundamenta o convite
inicial e final desta página evangélica, onde lemos uma das mais radicais
exigências de Jesus.
"Odiar" o pai e a mãe, carregar a cruz e seguir Jesus, renunciar a
todos os bens (vv. 26s., e 33), são algumas das exigências que não deixam
margem para dúvidas. Pelo contrário, o seu carácter paradoxal fere a nossa
sensibilidade e leva-nos a gritar de escândalo. Mas isso seria um modo, mais ou
menos elegante, de nos subtrairmos ao convite de Jesus, para continuarmos a
fazer o que nos é mais fácil.
Meditatio
A acção e as palavras de Jesus nada a ver com uma campanha eleitoral, como as
que nós conhecemos, onde o candidato promete mundos e fundos: tudo será melhor,
não haverá problemas, a vida será mais fácil e feliz para todos... Jesus, pelo
contrário, sendo seguido por «uma grande multidão» - e, portanto, tendo sucesso
- não lhe alimenta ilusões, mas dirige-lhe algumas das palavras mais duras que
Lhe saíram da boca. Apresenta claramente a exigência da radicalidade evangélica
de que falámos na lectio. Essa radicalidade não é genérica nem irracional. O
seu convite implica opções que deixam transparecer as grandes motivações da
radicalidade que Jesus exige aos discípulos.
A primeira das opções recai sobre a própria pessoa de Jesus: «Se alguém vem ter
comigo... Quem não tomar a sua cruz para me seguir não pode ser meu discípulo»
(vv. 26-27). A renúncia aos bens e às pessoas não é fim em si mesma, mas tem em
Jesus, mestre e salvador, a sua primeira e última motivação. Não se deixa a
família e os bens só por deixar. Deixa-se para alcançar Aquele que nos
alcançou. Poder tornar-se discípulo de Jesus é um ganho tão grande que vale a
pena deixar tudo e todos por causa d´Ele. O amor a Jesus Cristo é a grande
motivação de todas as nossas renúncias, incluindo, se tal for preciso, a
renúncia à própria vida. A opção por Cristo implica renúncias que não
apresentam uma racionalidade simplesmente humana, mas uma razão que acabará por
trazer a definitiva satisfação à mente e ao coração do discípulo.
É especialmente Lucas que recolhe estes ensinamentos de Jesus. Escrevia para
uma comunidade que precisava de ser incentivada a crescer na sua adesão ao
essencial do Evangelho. Precisa de evitar distracções com coisas secundárias
como preocupações terrenas e desculpas fúteis. Algo de muito actual também para
nós.
«Na Igreja, fomos iniciados na Boa Nova de Jesus Cristo: "Nós conhecemos e
cremos no amor que Deus nos tem" (1 Jo 4,16). Recebemos o dom da fé que dá
fundamento à nossa esperança... orienta a nossa vida e nos inspira a deixar
tudo para seguir a Cristo...» (Cst n. 9).
A nossa experiência de fé pode resumir-se em três pontos: é uma «adesão total e
alegre à Pessoa de Jesus» (Cst n. 14); é uma «união com Cristo no seu amor pelo
Pai e pelos homens» (Cst n. 17), por meio da oblação de amor, segundo as
exigências de
uma vocação reparadora, que comporta a experiência da cruz (cf. Cst nn. 17-25);
é uma participação na «missão da Igreja» no mundo de hoje (Cst nn. 26-39).
Note-se o radicalismo desta fé: adesão de toda a nossa vida à vida de Cristo,
isto é, uma fé que «orienta a nossa vida e nos inspira a deixar tudo para
seguir a Cristo» (Cst 9; cf. Cst nn. 13-14). Cristo é a motivação fundamental
das nossas opções pessoais e comunitárias. É, de verdade, a mais definitiva
razão das nossas renúncias e o baricentro da nossa vida.
Oratio
Senhor, Tu és a Verdade. Não Te enganas, nem nos enganas. E indicas-nos
claramente as condições da felicidade que nos prometes: queres-nos pobres,
pobres nos afectos, pobres nas coisas materiais, pobres naquilo que pensaríamos
dar-nos uma vida feliz.
As tuas palavras chocam-nos. Não nos mandaste amar-nos uns aos outros como Tu
mesmo nos amas? Porque nos mandas, agora, odiar pai e mãe e a nossa própria
vida? Queres com isso dizer-nos que havemos de renunciar a todo o amor
possessivo para avançarmos no caminho do amor oblativo, apoiando-nos em Ti.
Envia sobre nós o teu Santo Espírito que nos faça compreender que é bastante
rico quem te possui a Ti e que só é pobre de afectos quem Te recusa. Infunde em
nós o teu Santo Espírito, que faça crescer em nós a caridade verdadeira, e nos
dê a força necessária para que, carregando a nossa cruz, sigamos os teus
passos. Amen.
Contemplatio
Quem está no sacrário? É a pedra preciosa, junto da qual o ouro não é nada. O
reino dos céus, diz Nosso Senhor (Mt 13), é semelhante a uma pedra preciosa que
um negociante descobre. Vende tudo o que tem para a conseguir. Nós temos no
tabernáculo o Rei dos reis.
Está à nossa disposição com o seu reino que é a sua graça sobre a terra
aguardando a sua glória no céu. Não deveríamos deixar tudo e tudo sacrificar
por este reino?
Infelizmente deixei muitas vezes a Eucaristia e o Coração de Jesus pelas
criaturas, como o povo de Israel que sacrificava o serviço de Deus por um
bocado de pão (Ez 13, 19).
Mas a pedra preciosa não está longe. Ainda é tempo. Posso encontrá-la e
comprá-la, se faço os sacrifícios necessários. A Eucaristia está lá, o Coração
de Jesus está lá no tabernáculo. Mas Nosso Senhor fixa-me um preço de resgate,
é o tal sacrifício que é preciso fazer, é o tal apego que é preciso romper.
Conheço este preço pelo meu exame particular, conheço-o pelas minhas confissões
habituais. Sei o que é preciso sacrificar, mas a coragem falta-me.
Senhor, ajudai-me, peço-vos pela bondade do vosso coração e pela intercessão de
Maria. (Leão Dehon, OSP 3, p. 632).
Actio
Repete muitas vezes e vive hoje a palavra:
«Brilhai como astros no mundo» (cfr. Filip 2, 15s.)
| Fernando Fonseca, scj |
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