30/06/2015
Tempo Comum -
Anos Ímpares - XIII Semana - Terça-feira
Lectio
Primeira leitura: Génesis 19,
15-29
Naqueles dias, ao amanhecer, os
mensageiros insistiram com Lot, dizendo-lhe: «Ergue-te, foge com a tua mulher e
as tuas duas filhas que estão aqui, a fim de não morreres também tu no castigo
da cidade.» 16E como ele se demorava, os homens agarraram-no pela mão, a ele, à
mulher e às duas filhas, porque o Senhor queria poupá-los, e conduziram-nos
para fora da cidade. 17Depois de os terem conduzido para fora, um dos
mensageiros disse-lhe: «Escapa-te, se quiseres conservar a tua vida. Não olhes
para trás nem te detenhas em parte alguma do vale. Foge para o monte, de
contrário morrerás.» 18Lot disse-lhe: «Não, Senhor, peço-te 19Este teu servo
mereceu a tua benevolência, pois demonstraste a tua imensa generosidade para
comigo, conservando-me a vida, mas não poderei fugir até ao monte, pois a
destruição atingir-me-ia antes e eu morreria. 20Há aqui perto uma cidade, na
qual obterei refúgio. É muito pequena; permiti que eu vá para lá. É tão
pequena! E salvarei a minha vida.» 21Ele disse-lhe: «Concedo-te ainda o favor de
não destruir a cidade a que te referes. 22Apressa-te, porém, a refugiar-te
nela, pois nada posso fazer antes de lá chegares.» Por isso, deram àquela
cidade o nome de Soar. 23Erguia-se o sol sobre a terra, quando Lot entrou em
Soar. 24Então, o Senhor fez cair do céu, sobre Sodoma e Gomorra, uma chuva de
enxofre e de fogo, enviada pelo Senhor. 25Destruiu estas cidades, todo o vale e
todos os habitantes das cidades e até a vegetação da terra. 26A mulher de Lot
olhou para trás e ficou transformada numa estátua de sal. 27Abraão levantou-se
de manhã cedo e foi ao lugar onde tinha estado na presença do Senhor.
28Voltando os olhos para o lado de Sodoma e Gomorra e para a extensão do vale,
viu elevar-se da terra um fumo semelhante ao fumo de uma fornalha. 29Ao destruir
as cidades do vale, porém, Deus recordou-se de Abraão e salvou Lot do
cataclismo com que arrasou as cidades onde habitava Lot.
A imaginação, apoiada em vagas
orientações bíblicas, situa Sodoma na zona sul da margem ocidental do rio
Jordão. Ainda hoje aí se podem ver blocos salinos de formas caprichosas, que
causam forte impressão a quem os observa. Mas não há vestígios materiais que
permitam identificar a cidade. Os seus eternos vestígios consistem em ser
símbolo de um mundo corrompido e paradigma da justiça e do juízo de Deus. É
essa a perspectiva do autor sagrado. Sodoma, e a sua terrível destruição,
realçam o contraste entre a hospitalidade de Abraão e a falta de hospitalidade
dos seus habitantes. Lot, que escolheu a melhor parte, perde tudo: terra, bens,
mulher. A sua posteridade nascerá de incesto com as filhas. Abraão, pelo
contrário, tendo confiado na promessa de Deus, terá uma descendência numerosa e
possuirá a terra. O nosso texto começa com uma dramática tensão entre a
solicitude dos mensageiros e a demora de Lot. Só o parentesco com Abraão o
salva. Graças a esse parentesco, Deus usa de «uma grande misericórdia» para com
ele, permitindo-lhe refugiar-se em Soar.
A narrativa termina com Abraão a olhar, do alto de um monte, a desgraça das cidades pecadoras. Não se trata do olhar curioso de Sara, que ficou petrificada, mas do olhar de quem se sente objecto da “memória” de Deus que salva.
A narrativa termina com Abraão a olhar, do alto de um monte, a desgraça das cidades pecadoras. Não se trata do olhar curioso de Sara, que ficou petrificada, mas do olhar de quem se sente objecto da “memória” de Deus que salva.
Evangelho: Mateus 8, 23-27
Naquele tempo, 23Jesus subiu para
o barco e os discípulos seguiram-no. 24Levantou-se, então, no mar, uma
tempestade tão violenta, que as ondas cobriam o barco; entretanto, Jesus
dormia. 25Aproximando-se dele, os discípulos despertaram-no, dizendo-lhe:
«Senhor, salva-nos, que perecemos!» 26Disse-lhes Ele: «Porque temeis, homens de
pouca fé?» Então, levantando-se, falou imperiosamente aos ventos e ao mar, e
sobreveio uma grande calma. 27Os homens, admirados, diziam: «Quem é este, a
quem até o vento e o mar obedecem?»
De modo muito estilizado, Mateus
refere o episódio da tempestade acalmada. O propósito de Mateus não é tratar o
acontecimento em si, mas indicar o seu significado. A Igreja é uma barca em
tormenta, onde está Jesus e os discípulos. «Os discípulos seguiram-no», diz-nos
o texto (v. 23). Esta palavra traduz, para Mateus, o aspecto essencial do
discipulado: «seguir» Jesus. De facto, o verbo «seguir» é utilizado unicamente
quando se trata de Jesus. Indica a união do discípulo com o Jesus da história,
a participação na sua vida, a entrada no Reino através da pertença a Cristo
pela obediência e pela confiança. Dizer a Jesus: «Desperta, Senhor, porque
dormes?» (Sl 44, 24) e «Senhor, salva-nos, que perecemos!», significa
reencontrar-se como crentes, como fiéis, como discípulos, e encontrar Jesus
como Senhor e Cristo. Na sua presença não há tempestade, não há paixão, não há
morte que resistam. A sua autoridade e o seu poder restauram a ordem da graça.
Os discípulos nem sempre correspondem com fé e confiança ao senhorio de Jesus.
O sono de Jesus representa o drama da morte do Filho do homem, que desafia a
Igreja à fé e à serena confiança no Pai como Aquele que «se fez obediente até à
morte e morte de cruz» (Fl 2, 8).
Meditatio
A leitura do livro do Génesis
apresenta-nos o cuidado de Deus em salvar Lot da catástrofe das cidades
pecadoras. Impressiona-nos tal cuidado. O texto insiste em sublinhá-lo: «Ao
amanhecer, os mensageiros insistiram com Lot, dizendo-lhe: «Ergue-te, foge com
a tua mulher e as tuas duas filhas que estão aqui, a fim de não morreres também
tu no castigo da cidade» (v. 15). Lot não revelava pressa, adiava a decisão de
partir, queria permanecer na sua casa, no seu ambiente. Talvez esperasse para
ver e, se o perigo se tornasse iminente, então, partir. Mas os mensageiros
tomam-no pela mão e conduzem-no para fora da cidade. Depois insistem, mais uma
vez: «Escapa-te, se quiseres conservar a tua vida. Não olhes para trás nem te
detenhas em parte alguma do vale. Foge para o monte, de contrário morrerás» (v.
17). Mas Lot continua a protelar a partida, e atreve-se a pedir para não ir
para muito longe: «Há aqui perto uma cidade, na qual obterei refúgio. É muito
pequena; permiti que eu vá para lá» (v. 20).
O Senhor faz tudo para nos salvar. Mas nós, muitas vezes, somos reticentes, desinteressados. Não nos damos conta dos perigos que corremos. Teimamos em permanecer nos nossos hábitos e rotinas. Estamos apegados aos nossos bens, às circunstâncias comuns da nossa vida. Deus convida-nos a tomar caminhos seguros, honestos, e nós preferimos atalhos obscuros, ambíguos. Não queremos renunciar decididamente às situações perigosas. Mas Deus é perseverante e insiste. Temos sorte com um Pai tão cuidadoso, que conhece os perigos muito melhor do que nós e nos convida a escutá-l´O, a avançar, para atingirmos a vida em plenitude.
O evangelho apresenta-nos uma situação diferente. Os Apóstolos estão em alto mar, na barca com Jesus. «Levantou-se, então, no mar, uma tempestade tão violenta» (v. 24). Quando se está numa barca e se levanta uma tempestade, não há alternativas. Há que enfrentar decididamente o perigo, pois não é possível fugir. Os Apóstolos não encontraram outra solução senão rezar. Jesus dormia. Por isso, «aproximando-se dele, os discípulos despertaram-no, dizendo-lhe: «Senhor, salva-nos, que perecemos!» (v. 25). Jesus, «levantando-se, falou imperiosamente aos ventos e ao mar, e sobreveio uma grande calma» (v. 26). A oração dos Apóstolos, mais do que fé, manifestava medo. Por isso, Jesus repreende-os: «Porque temeis, homens de pouca fé?» (v. 26).
Quem embarcou com Jesus não deve ter medo. O mais importante é mesmo ter embarcado com Ele. Ainda que o Senhor pareça dormir, não nos abandona. Isso não significa que tenhamos sempre uma vida tranquila, sem problemas, sem dificuldades. Mas estamos certos da sua ajuda e da sua vitória final.
Tanto a primeira leitura, como o evangelho, nos garantem que o mais importante é estarmos unidos a Deus no amor. Essa união pressupõe o desapego de muitas coisas secundárias. Só os que são capazes de se desapegar do que é secundário podem salvar-se, podem chegar à vitória: «Em tudo isso – escreve Paulo - saímos mais do que vencedores,graças àquele que nos amou» ( Rm 8, 37). E continua o Apóstolo: «Estou convencido de que nem a morte nem a vida, nem os anjos nem os principados, nem o presente nem o futuro, nem as potestades, nem a altura, nem o abismo, nem qualquer outra criatura poderá separar-nos do amor de Deus que está em Cristo Jesus, Senhor nosso» (vv. 38-39).
O Senhor faz tudo para nos salvar. Mas nós, muitas vezes, somos reticentes, desinteressados. Não nos damos conta dos perigos que corremos. Teimamos em permanecer nos nossos hábitos e rotinas. Estamos apegados aos nossos bens, às circunstâncias comuns da nossa vida. Deus convida-nos a tomar caminhos seguros, honestos, e nós preferimos atalhos obscuros, ambíguos. Não queremos renunciar decididamente às situações perigosas. Mas Deus é perseverante e insiste. Temos sorte com um Pai tão cuidadoso, que conhece os perigos muito melhor do que nós e nos convida a escutá-l´O, a avançar, para atingirmos a vida em plenitude.
O evangelho apresenta-nos uma situação diferente. Os Apóstolos estão em alto mar, na barca com Jesus. «Levantou-se, então, no mar, uma tempestade tão violenta» (v. 24). Quando se está numa barca e se levanta uma tempestade, não há alternativas. Há que enfrentar decididamente o perigo, pois não é possível fugir. Os Apóstolos não encontraram outra solução senão rezar. Jesus dormia. Por isso, «aproximando-se dele, os discípulos despertaram-no, dizendo-lhe: «Senhor, salva-nos, que perecemos!» (v. 25). Jesus, «levantando-se, falou imperiosamente aos ventos e ao mar, e sobreveio uma grande calma» (v. 26). A oração dos Apóstolos, mais do que fé, manifestava medo. Por isso, Jesus repreende-os: «Porque temeis, homens de pouca fé?» (v. 26).
Quem embarcou com Jesus não deve ter medo. O mais importante é mesmo ter embarcado com Ele. Ainda que o Senhor pareça dormir, não nos abandona. Isso não significa que tenhamos sempre uma vida tranquila, sem problemas, sem dificuldades. Mas estamos certos da sua ajuda e da sua vitória final.
Tanto a primeira leitura, como o evangelho, nos garantem que o mais importante é estarmos unidos a Deus no amor. Essa união pressupõe o desapego de muitas coisas secundárias. Só os que são capazes de se desapegar do que é secundário podem salvar-se, podem chegar à vitória: «Em tudo isso – escreve Paulo - saímos mais do que vencedores,graças àquele que nos amou» ( Rm 8, 37). E continua o Apóstolo: «Estou convencido de que nem a morte nem a vida, nem os anjos nem os principados, nem o presente nem o futuro, nem as potestades, nem a altura, nem o abismo, nem qualquer outra criatura poderá separar-nos do amor de Deus que está em Cristo Jesus, Senhor nosso» (vv. 38-39).
Oratio
Senhor, meu Deus, como és grande,
como és benevolente! Os céus não podem conter-Te. Mas, ao vires à terra, fizeste-Te
pobre e completamente disponível. Fizeste-Te nosso pão de cada dia. Queres
saciar-nos de vida e de amor. Dá-nos um coração agradecido, um coração generoso
e alegre. Dá-nos um coração que nos permita testemunhar a tua benevolência, a
tua amizade por todos os homens. Torna-nos intercessores audazes, para que a
nenhum dos homens e mulheres deste mundo falte a alegria de saber-se pensado,
escolhido e amado por Ti, desde toda a eternidade. Amen.
Contemplatio
Se a alma for fiel a estas
primeiras sugestões da graça, Nosso Senhor reduplica a solicitude, porque o bom
acolhimento feito a uma graça leva-o a conceder outra. Se o pecador for surdo a
estas sugestões sem ser desprovido de generosidade, Nosso Senhor far-lhe-á a
graça de lhe enviar uma provação que provoque o regresso a si mesmo. Durante
esta prova, fala mais amigavelmente ao seu coração; faz-lhe sentir vivamente
toda a torpeza do seu estado, todo o perigo da sua situação. Procura promover
nele um sentimento de humildade. Se o pecador for fiel às sugestões da graça,
se não recuar diante do esforço a fazer para tomar consciência da miséria na
qual caiu, para ver a porcaria de que se sujou, a lepra de que se cobriu, Nosso
Senhor recompensa este primeiro sentimento tornando-o mais vivo. O coração penetrado
de um desprezo profundo por si mesmo abre-se à acção divina. Um toque poderoso
parte então este coração humilhado e ele confessa a sua falta. Geme pela sua
miséria, que lhe aparece então em toda a sua torpeza. Compara o seu estado ao
dos servos fiéis que vivem numa doce paz de alma sob os olhares benevolentes de
Nosso Senhor. O sentimento da sua indignidade é então tão vivo, que ele exclama
como o filho da parábola: «Meu Deus, não sou digno de ser vosso filho, mas
tende piedade de um pobre coração contrito e humilhado». Levanta-se então
resolutamente para entrar de novo em graça com Deus. O Coração de Jesus,
emocionado de compaixão, facilita a esta querida alma a penosa caminhada à qual
finalmente se resolveu. Nosso Senhor acolhe de braços abertos o infeliz que
desde este instante se torna de novo seu filho bem-amado. (Leão Dehon, OSP 4,
p. 123s.).
Actio
Repete frequentemente e vive hoje
a palavra:
«Senhor, salva-nos, que perecemos!» (Mt 8, 25).
«Senhor, salva-nos, que perecemos!» (Mt 8, 25).
01/07/2015
Tempo Comum -
Anos Ímpares - XIII Semana - Quarta-feira
Lectio
Primeira leitura: Génesis 21,
5.8-20
Abraão tinha cem anos quando
nasceu Isaac, seu filho. 8O filho cresceu até à idade em que deixou de mamar, e
nesse dia Abraão ofereceu um grande banquete. 9Sara viu que o filho que a
egípcia Agar dera a Abraão estava a brincar. 10E ela disse a Abraão: «Expulsa
esta escrava e o filho, porque o filho desta escrava não herdará com o meu
filho Isaac.» 11Esta frase desgostou profundamente Abraão, por causa de Ismael,
seu filho. 12Mas Deus disse-lhe: «Não te preocupes com a criança e com a tua
escrava. Faz tudo quanto Sara te pedir, pois de Isaac há-de nascer a
descendência que usará o teu nome. 13Contudo, farei sair também uma nação do
filho da escrava, porque também ele é teu filho.» 14No dia seguinte de manhã,
Abraão tomou pão e um odre de água, deu-o a Agar e pô-lo sobre os ombros dela;
depois, mandou-a embora com o seu filho. Ela partiu e, embrenhando-se no
deserto de Bercheba, por lá andou ao acaso. 15Tendo-se acabado a água do odre,
deixou o filho debaixo de um arbusto 16e foi sentar-se do lado oposto, à
distância de um tiro de arco, porque dizia: «Não quero ver o meu filho morrer.»
Sentou-se, pois, do lado oposto e começou a chorar. 17Deus escutou a voz do
menino, e o mensageiro de Deus chamou do céu Agar e disse-lhe: «Que tens tu,
Agar? Nada temas, porque Deus ouviu a voz do menino, do lugar em que está.
18Ergue-te, vai buscar outra vez o teu filho, toma-o pela mão, pois farei
nascer dele um grande povo.» 19Deus abriu-lhe os olhos e ela viu um poço onde
foi encher o odre e deu de beber ao filho. 20Deus protegeu o menino. Ele
cresceu, residiu no deserto e tornou-se um hábil arqueiro.
A narrativa do nosso texto deve
ser lida em paralelo com o capítulo 16, pois provavelmente se trata de uma
variante da mesma tradição. O objectivo desta narrativa é o mesmo. Quer mostrar
que o projecto de Deus avança, apesar da mesquinhez humana. Além disso, mais
uma vez se dá uma explicação popular dos nomes de Isaac (v. 9) e de Ismael (v.
17).
O banquete que assinala o desmame do filho da promessa oferece a ocasião para confrontar os dois filhos de Abraão. Esta narrativa, ao contrário da de Gn 16, apresenta Ismael quase da mesma idade que Isaac que brinca com ele. É o suficiente para suscitar os ciúmes de Sara, que pressiona Abraão para que afaste o filho de Sara (. 10). A reacção de Deus, que apoia a posição de Sara, não seria de esperar (cf. v. 12). Mas, mais uma vez, vemos como os caminhos de Deus são diferentes dos nossos. O Senhor convida Abraão a não afastar o filho Ismael, porque também ele será pai de numerosa descendência. É um momento carregado de emoções, bem apresentado pelo autor sagrado. Deus é sempre aquele que escuta o grito do pobre e do oprimido que, neste caso, são Agar e o filho destinado a morrer. O «mensageiro de Deus» abriu os olhos a Agar que viu um poço perto dela e deu de beber ao filho. A intervenção divina deu coragem a Agar e perspectivou um futuro feliz para Ismael. Assim se vão delineando os destinos de dois povos irmãos, os ismaelitas e os israelitas, ainda hoje unidos por um destino de hostilidades e de partilhas.
O banquete que assinala o desmame do filho da promessa oferece a ocasião para confrontar os dois filhos de Abraão. Esta narrativa, ao contrário da de Gn 16, apresenta Ismael quase da mesma idade que Isaac que brinca com ele. É o suficiente para suscitar os ciúmes de Sara, que pressiona Abraão para que afaste o filho de Sara (. 10). A reacção de Deus, que apoia a posição de Sara, não seria de esperar (cf. v. 12). Mas, mais uma vez, vemos como os caminhos de Deus são diferentes dos nossos. O Senhor convida Abraão a não afastar o filho Ismael, porque também ele será pai de numerosa descendência. É um momento carregado de emoções, bem apresentado pelo autor sagrado. Deus é sempre aquele que escuta o grito do pobre e do oprimido que, neste caso, são Agar e o filho destinado a morrer. O «mensageiro de Deus» abriu os olhos a Agar que viu um poço perto dela e deu de beber ao filho. A intervenção divina deu coragem a Agar e perspectivou um futuro feliz para Ismael. Assim se vão delineando os destinos de dois povos irmãos, os ismaelitas e os israelitas, ainda hoje unidos por um destino de hostilidades e de partilhas.
Evangelho: Mateus 8, 28-34
Naquele tempo, 28quando Jesus
chegou à outra margem, à região dos gadarenos, vieram ao seu encontro dois
possessos, que habitavam nos sepulcros. Eram tão ferozes que ninguém podia
passar por aquele caminho. 29Vendo-o, disseram em alta voz: «Que tens a ver
connosco, Filho de Deus? Vieste aqui atormentar-nos antes do tempo?» 30Ora,
andava a pouca distância dali, a pastar, uma grande vara de porcos. 31E os
demónios pediram-lhe: «Se nos expulsas, manda-nos para a vara de porcos.»
32Disse-lhes Jesus: «Ide!» Então, eles, saindo, entraram nos porcos, que se
despenharam por um precipício, no mar, e morreram nas águas. 33Os guardas
fugiram e, indo à cidade, contaram tudo o que se tinha passado com os
possessos. 34Toda a cidade saiu ao encontro de Jesus e, vendo-o, rogaram-lhe
que se retirasse daquela região.
Mais uma vez, Mateus retoma uma
história do Evangelho de Marcos (Mc 5, 1-20), contando-a de modo mais
sintético. Por exemplo, ao falar dos porcos, refere uma grande vara, e não de
cerca de dois mil porcos, como diz Marcos (5, 2ss.). Mas também amplia
pormenores. Por exemplo, em vez de um possesso, como faz Marcos, fala de dois.
Fundamentalmente, a cena pretende descrever um encontro de Jesus com os pagãos, dominados pelas forças do mal, como já aconteceu no episódio do centurião (Mt 8, 1-17). Mas, enquanto o centurião acreditou e aceitou Jesus, os habitantes de Gádara não crêem e rejeitam-no.
A imagem dos «sepulcros», a força de Jesus diante dos demónios e a sua «fraqueza» diante dos homens faz desta cena o claro reflexo de uma meditação sobre a paixão, incluindo a rejeição pelos homens, bem expressa no pedido dos gadarenos para que Jesus se retire da sua cidade. A expressão «antes do tempo» (v. 29) também indica a relação desta cena com a paixão, quando Jesus, ainda que expulso da cidade santa, irá vencer sobre a força negativa da morte, da dispersão da Igreja, abrindo passagem para que fosse possível «passar por aquele caminho» (v. 28). O poder de Jesus só se revela no mistério insondável da cruz.
Fundamentalmente, a cena pretende descrever um encontro de Jesus com os pagãos, dominados pelas forças do mal, como já aconteceu no episódio do centurião (Mt 8, 1-17). Mas, enquanto o centurião acreditou e aceitou Jesus, os habitantes de Gádara não crêem e rejeitam-no.
A imagem dos «sepulcros», a força de Jesus diante dos demónios e a sua «fraqueza» diante dos homens faz desta cena o claro reflexo de uma meditação sobre a paixão, incluindo a rejeição pelos homens, bem expressa no pedido dos gadarenos para que Jesus se retire da sua cidade. A expressão «antes do tempo» (v. 29) também indica a relação desta cena com a paixão, quando Jesus, ainda que expulso da cidade santa, irá vencer sobre a força negativa da morte, da dispersão da Igreja, abrindo passagem para que fosse possível «passar por aquele caminho» (v. 28). O poder de Jesus só se revela no mistério insondável da cruz.
Meditatio
Comove-nos ler a história de Agar,
perdida no deserto com o seu menino, e profundamente desesperada porque o vê
condenado a morrer de sede. «Não quero ver o meu filho morrer!», exclamou (v.
16). Agar nem se lembra de rezar. Mas Deus escuta o choro da criança, «e o
mensageiro de Deus chamou do céu Agar e disse-lhe: «Que tens tu, Agar? Nada
temas, porque Deus ouviu a voz do menino… Ergue-te, vai buscar outra vez o teu
filho, toma-o pela mão» (vv. 17-18). A escrava encontrava-se, com o seu filho,
numa situação desesperada. Mas Deus é fiel e intervém. E escutamos as palavras
que havemos de acolher com muita atenção: «Deus abriu-lhe os olhos e ela viu um
poço onde foi encher o odre e deu de beber ao filho» (v. 19). O poço já lá
estava. Mas Agar estava como que cega, por causa do seu desespero, e não o via.
A intervenção de Deus faz-lhe ver a salvação. Quando Deus nos ilumina,
conseguimos ver a realidade das coisas e encontrar soluções para a nossa
perplexidade e incerteza. Há que pedir a Deus a sua luz, a luz do seu Espírito,
na oração. Há que pedi-la também para os que governam este mundo. Ser-lhes-á
mais fácil encontrar soluções justas para tantos conflitos, que cobrem de
sangue a terra, para tantas injustiças, que causam imensos sofrimentos a tantos
dos nossos contemporâneos. Iluminados pelo Senhor, saberão encontrar leis
justas e respeitosas da dignidade das pessoas. Tantas vezes estamos próximos do
Salvador, e não O vemos. Tantas vezes fazemos como os habitantes de Gádara que,
depois do milagre, pediram a Jesus que se afastasse: «Toda a cidade saiu ao
encontro de Jesus e, vendo-o, rogaram-lhe que se retirasse daquela região» (v.
34). Estava a prejudicar os seus negócios mesquinhos? O seu egoísmo cegava-os.
Por isso, não conseguiram ver n´Ele o libertador poderoso contra o demónio!
Não é fácil entrarmos no cumprimento de onda do Senhor, sintonizar com o seu pensamento. Há momentos em que isso se torna particularmente difícil, porque Deus vai mais longe que o nosso humano bom senso. É o que nos ensinam as leituras de hoje. Deus pede a Abraão que apoie a repúdio de Sara. Abraão consente, obedece à palavra, e o Senhor abençoará o bebé, aparentemente condenado a morrer. Para libertar os endemoninhados de Gádara, prejudica a economia dos criadores de porcos… Deus, por vezes, propõe-nos caminhos que não são os nossos, que são exigentes. Mas não exerce violência sobre a nossa liberdade. Deixa-nos sempre livres para optar num sentido ou noutro. Uma coisa é certa: quando a sua palavra nos incomoda, nunca é em vista da morte, mas da vida.
Não é fácil entrarmos no cumprimento de onda do Senhor, sintonizar com o seu pensamento. Há momentos em que isso se torna particularmente difícil, porque Deus vai mais longe que o nosso humano bom senso. É o que nos ensinam as leituras de hoje. Deus pede a Abraão que apoie a repúdio de Sara. Abraão consente, obedece à palavra, e o Senhor abençoará o bebé, aparentemente condenado a morrer. Para libertar os endemoninhados de Gádara, prejudica a economia dos criadores de porcos… Deus, por vezes, propõe-nos caminhos que não são os nossos, que são exigentes. Mas não exerce violência sobre a nossa liberdade. Deixa-nos sempre livres para optar num sentido ou noutro. Uma coisa é certa: quando a sua palavra nos incomoda, nunca é em vista da morte, mas da vida.
Oratio
Senhor, só Tu tens palavras de
vida eterna! A quem iremos pedir ajuda e salvação? Quero agradecer-Te porque,
cada dia, a tua palavra ecoa no meu coração, sempre viva, sempre nova, sempre
exigente, sempre provocante. Que jamais me esconda atrás dos meus cálculos
mesquinhos. Que eu Te siga pelos caminhos da liberdade e do amor, porque sempre
lanças os meus pecados para o fundo do mar, e me dás possibilidade de
ressuscitar como nova criatura, amada por Deus Pai. Amen.
Contemplatio
Jesus viera para operar a grande
obra da reconciliação. Tudo estava preparado e, no entanto, leva uma longa vida
de trinta anos, desconhecida, escondida, em aparência inactiva e inútil. O
Redentor tinha sido prometido ao género humano e anunciado pelos profetas. Os
sinais da sua vinda estavam marcados. Era esperado pelos justos com um ardente
desejo. Prodígios foram realizados na altura do seu nascimento. A própria
natureza manifestou a sua alegria pela vinda do Criador. Uma estrela
maravilhosa surpreendeu os sábios do Oriente e conduziu-os ao presépio. Mas
logo a seguir, que silêncio! Tudo retorna à obscuridade e à calma. Os que
acreditavam verdadeiramente, os que seguiam a atracção da graça, a voz dos
anjos e as inspirações do Espírito Santo, conservavam no seu coração a
recordação dos mistérios que tinham tido um brilho tão curto. Adoravam no
silêncio, na esperança e no abandono, os decretos da sabedoria, do amor e da
misericórdia de Deus. E esta vida obscura, vida de submissão, de trabalho e da
misericórdia de Deus vai durar trinta anos! Quem é que está em condição de
aprofundar as vias da sabedoria, do amor e da bondade de Deus? Quem pode
conceber e contar os actos de virtude destes anos de obscuridade? E então
porquê tudo isto? Porquê esta viagem penosa e longa ao país pagão e idólatra?
Porque Jesus era vítima, porque era libertador e redentor; porque isto
correspondia aos desígnios de misericórdia que os homens não podiam compreender
perfeitamente. (Leão Dehon, OSP 3, p. 41s.).
Actio
Repete frequentemente e vive hoje
a palavra:
«Pai, nas tuas mãos entrego o meu espírito» (Lc 23, 46).
«Pai, nas tuas mãos entrego o meu espírito» (Lc 23, 46).
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