14 Junho
2020
ANO A
11º DOMINGO DO TEMPO COMUM
Tema do 11º Domingo do Tempo Comum
Neste domingo, a Palavra que vamos reflectir
recorda-nos a presença constante de Deus no mundo e a vontade que Ele tem de
oferecer aos homens, a cada passo, a sua vida e a sua salvação. No entanto, a
intervenção de Deus na história humana concretiza-se através daqueles que Ele
chama e envia, para serem sinais vivos do seu amor e testemunhas da sua bondade.
A primeira leitura apresenta-nos o Deus da "aliança", que elege um
Povo para com ele estabelecer laços de comunhão e de familiaridade; a esse
Povo, Jahwéh confia uma missão sacerdotal: Israel deve ser o Povo reservado
para o serviço de Jahwéh, isto é, para ser um sinal de Deus no meio das outras
nações.
O Evangelho traz-nos o "discurso da missão". Nele, Mateus apresenta
uma catequese sobre a escolha, o chamamento e o envio de "doze"
discípulos (que representam a totalidade do Povo de Deus) a anunciar o
"Reino". Esses "doze" serão os continuadores da missão de
Jesus e deverão levar a proposta de salvação e de libertação que Deus fez aos
homens em Jesus, a toda a terra.
A segunda leitura sugere que a comunidade dos discípulos é fundamentalmente uma
comunidade de pessoas a quem Deus ama. A sua missão no mundo é dar testemunho
do amor de Deus pelos homens - um amor eterno, inquebrável, gratuito e
absolutamente único.
LEITURA I - Ex 19,2-6a
Leitura do Livro do Êxodo
Naqueles dias,
os filhos de Israel partiram de Refidim
e chegaram ao deserto do Sinai,
onde acamparam, em frente da montanha.
Moisés subiu à presença de Deus.
O Senhor chamou-o da montanha e disse-lhe:
«Assim falarás à casa de Jacob,
isto dirás aos filhos de Israel:
'Vistes o que Eu fiz ao Egipto,
como vos transportei sobre asas de águia
e vos trouxe até Mim.
Agora, se ouvirdes a minha voz,
se guardardes a minha aliança,
sereis minha propriedade especial entre todos os povos.
Porque toda a terra Me pertence;
mas vós sereis para Mim um reino de sacerdotes,
uma nação santa'».
AMBIENTE
O texto que nos é proposto faz parte das "tradições
sobre a aliança do Sinai" - um conjunto de tradições de origem diversa,
cujo denominador comum é a reflexão sobre um compromisso ("berit" -
"aliança") que Israel teria assumido com Jahwéh.
O texto situa-nos no deserto do Sinai, "em frente do monte". No texto
bíblico, não temos indicações geográficas suficientes para identificar o
"monte da aliança". Em si, o nome Sinai não designa um monte, mas uma
enorme península de forma triangular, com mais ou menos 420 quilómetros de
extensão norte/sul, estendendo-se entre o mar Mediterrâneo e o mar Vermelho (no
sentido norte/sul) e o golfo do Suez e o golfo da Áqaba (no sentido
oeste/este). A península é um deserto árido, escassamente povoado, de terreno
acidentado e com várias montanhas que chegam a atingir 2400 metros de altura.
Uma tradição cristã do séc. IV d.C., no entanto, identifica o "monte da
aliança" com o "Gebel Musah" (o "monte de Moisés"), um
monte com 2244 metros de altitude, situado a sul da península sinaítica. Embora
a identificação do "monte da aliança" com este lugar levante
problemas, o "Gebel Musah" é, ainda hoje, um lugar de peregrinação
para judeus e cristãos.
Vai ser pois aqui, no Sinai, diante de "um monte" que Jahwéh e Israel
se vão comprometer numa "aliança". A palavra hebraica "berit",
usada neste contexto, define um pacto entre duas partes, que implica direitos e
obrigações, muitas vezes recíprocos. A "berit" raramente era escrita,
mas tinha sempre valor jurídico. Habitualmente, o compromisso era selado por um
ritual consagrado pelo uso, que incluía um juramento e a imolação de animais em
sacrifício.
Será à luz deste esquema jurídico que Israel vai representar o seu compromisso
com Jahwéh.
MENSAGEM
Repare-se, em primeiro lugar, que a iniciativa
da "aliança" é de Deus: é Jahwéh que convoca Moisés - o intermediário
entre Deus e o Povo - para a montanha e propõe, através dele, uma
"aliança" à "casa de Jacob". A iniciativa de estabelecer
laços de comunhão e de familiaridade com o seu Povo é sempre de Deus.
Essa "aliança" que Deus propõe é, em segundo lugar, uma realidade que
envolve toda a história do Povo. As palavras de proposição da
"aliança" aparecem em três estrofes, cada uma das quais abarca um
tempo: passado, presente e futuro. É uma relação que aponta à totalidade da caminhada
do Povo de Deus.
A primeira estrofe (vers. 4) refere-se ao passado. Faz referência à libertação
da escravidão do Egipto ("vistes o que Eu fiz no Egipto"), à presença
e assistência amorosa de Deus ao longo da marcha pelo deserto ("como vos
transportei sobre asas de águia") e ao chamamento à comunhão com o próprio
Deus ("e vos trouxe até Mim"). Tudo isso resulta do
"compromisso" que Deus assumiu com Israel, ainda antes da
"aliança" do Sinai.
A segunda estrofe (vers. 5a) refere-se ao presente. Jahwéh convida Israel a
aceitar estabelecer com Deus laços privilegiados de comunhão e de
familiaridade. Para que isso aconteça, Deus pede a Israel que escute a sua voz
e guarde a "aliança" (os mandamentos de Deus são as exigências com
que o Povo se deve comprometer).
A terceira estrofe (vers. 5b-6) refere-se ao futuro. Se Israel aceitar
comprometer-se com Deus numa "aliança", Deus oferecerá ao Povo uma
relação especial, que o tornará o Povo eleito de Deus, um reino de sacerdotes e
uma nação santa. Entre todos os povos da terra, Israel passará a ser o Povo
eleito, que Deus escolheu entre todos os povos da terra para com ele manter uma
relação única. Será também um reino de sacerdotes - quer dizer, um Povo cuja
missão é testemunhar Deus e torná-l'O presente no mundo. Será finalmente uma
nação santa - quer dizer, um Povo "à parte", separado do convívio dos
outros povos para se dedicar exclusivamente ao serviço de Jahwéh.
A "aliança" aparece aqui como fazendo parte integrante do projecto de
salvação que Deus tem para os homens. Israel é convidado por Deus a desempenhar
um papel primordial nesse processo: se aceitar fazer parte da comunidade de
Deus e percorrer um determinado caminho (o caminho dos mandamentos), ele será o
Povo escolhido por Deus para o seu serviço e para ser um sinal de Jahwéh dia
nte de todos os outros povos. Esta "eleição" não é um privilégio, mas
um serviço, que se concretiza numa missão profética: ser um sinal vivo de Deus
no mundo.
Descobre-se aqui o sentido fundamental do Êxodo: a libertação do Egipto não se
resume em fazer sair um povo da escravidão para a liberdade: a caminhada que
Jahwéh começou com este Povo no Egipto aponta para o compromisso com Deus e com
os homens; aponta para a construção de um Povo que não só conquista a sua
liberdade mas se torna testemunha de Deus, sinal de Deus, sacerdote de Deus no
meio do mundo.
ACTUALIZAÇÃO
Considerar as seguintes questões:
• Vivemos num tempo em que não é fácil - no
meio da azáfama em que a vida decorre - reconhecer a presença, o amor e o
cuidado de Deus com essa humanidade que Ele criou; alguns dos nossos
contemporâneos chegam mesmo a falar da "morte de Deus", para exprimir
a realidade de uma história de onde Deus parece estar totalmente ausente. O
nosso texto, no entanto, revela um Deus empenhado em caminhar ao lado dos
homens, em estabelecer com eles laços de familiaridade e de comunhão, em
apresentar-lhes propostas de salvação, de libertação, de vida definitiva. É
Deus que está ausente da história dos homens, ou são os homens que apostam
noutros deuses (isto é, noutros esquemas de felicidade) e não têm tempo nem
disponibilidade para encontrar o Deus da "aliança" e da comunhão?
Deus ter-Se-á tornado indiferente e insensível ao destino dos homens, ou são os
homens que preferem trilhar caminhos de orgulho e de auto-suficiência à margem
de Deus? Deus terá renunciado a estabelecer laços familiares connosco, ou somos
nós que, em nome de uma pretensa liberdade, preferimos construir a história do
mundo longe de Deus e das suas propostas?
• Os autores do nosso texto definem a resposta
do Povo aos desafios do Deus da "aliança" em termos de "ouvir a
voz" de Deus e "guardar a aliança". "Ouvir a voz" de
Deus significa escutar as suas propostas, acolhê-las no coração e
transformá-las em gestos na vida diária; "guardar a aliança"
significa comprometer-se com as propostas de Deus e viver de forma coerente com
os mandamentos... Objectivamente, o que é que as propostas feitas por Deus
significam na minha vida? O "caminho", que eu percorro dia a dia,
está de acordo com esse "caminho" de felicidade e de vida plena que
Deus definiu e que me apresentou? As propostas de Deus interpelam-me e
interferem com as minhas opções ou, na hora das decisões, eu escolho de acordo
com os meus interesses pessoais, prescindindo das indicações de Deus?
• O Povo que aceita o compromisso com Deus e
que "embarca" na aventura da "aliança" é um Povo que é
propriedade de Deus, que aceita ficar ao serviço de Deus. A sua missão é
testemunhar o projecto salvador de Deus diante de todos os povos da terra.
Tenho consciência de que, no dia do meu baptismo, eu entrei na comunidade do
Povo de Deus e assumi o compromisso de testemunhar Deus e o seu projecto de
salvação diante do mundo? A minha vida tem sido coerente com esta opção? Tenho
sido um sinal vivo do amor e da bondade de Deus diante dos homens e mulheres
com quem me cruzo todos os dias?
SALMO RESPONSORIAL - Salmo 99 (100)
Refrão: Nós somos o povo de Deus, as ovelhas
do seu rebanho.
Aclamai o Senhor, terra inteira,
servi o Senhor com alegria,
vinde a Ele com cânticos de júbilo.
Sabei que o Senhor é Deus,
Ele nos fez, a ele pertencemos,
somos o seu povo, as ovelhas do seu rebanho.
Porque o Senhor é bom,
eterna é a sua misericórdia,
a sua fidelidade estende-se de geração em geração.
LEITURA II - Rom 5,6-11
Leitura da Epístola do apóstolo São Paulo aos
Romanos
Irmãos:
Quando ainda éramos fracos,
Cristo morreu pelos ímpios no tempo determinado.
Dificilmente alguém morre por um justo;
por um homem bom,
talvez alguém tivesse a coragem de morrer.
Mas Deus prova assim o seu amor para connosco.
Cristo morreu por nós, quando éramos ainda pecadores.
E agora, que fomos justificados pelo seu sangue,
com muito mais razão seremos por Ele salvos da ira divina.
Se, na verdade, quando éramos inimigos,
fomos reconciliados com Deus pela morte de seu Filho,
com muito mais razão, depois de reconciliados,
seremos salvos pela sua vida.
Mais ainda: também nos gloriamos em Deus,
por Nosso Senhor Jesus Cristo,
por quem alcançámos agora a reconciliação.
AMBIENTE
A Carta aos Romanos - já o dissemos atrás - é
um texto sereno e amadurecido, escrito por Paulo por volta do ano 57/58 e no
qual o apóstolo apresenta uma síntese da sua mensagem e da sua pregação. O
pretexto para a carta é um projecto de passagem por Roma, a caminho de Espanha
(cf. Rom 16,23-24): Paulo sente que terminou a sua missão no oriente e quer
anunciar o Evangelho de Jesus no ocidente.
No entanto, a opinião da maioria dos estudiosos da Carta aos Romanos é que
Paulo se serve deste pretexto para lembrar, quer aos cristãos vindos do
judaísmo (e para quem a salvação dependia da prática da Lei de Moisés), quer
aos cristãos vindos do paganismo (e para quem a Lei de Moisés constituía um
empecilho) o essencial da mensagem cristã. Paulo insiste, sobretudo, no facto
de a salvação não ser uma conquista do homem, mas um dom do amor de Deus. Na
verdade, todos os homens vivem mergulhados no pecado, pois o pecado é uma
realidade universal (cf. Rom 1,18-3,20); mas Deus, na sua bondade, a todos
"justifica" e salva (cf. Rom 3,1-5,11); e essa salvação é oferecida
por Deus ao homem através de Jesus Cristo; ao homem, resta aderir a essa
proposta de salvação, na fé (cf. Rom 5,12-8,39).
O texto que nos é proposto é a parte final de uma perícopa que começa em Rom
5,1. Nessa perícopa, Paulo explica o que brota dessa "justificação"
que Deus nos ofereceu: em primeiro lugar, a paz, que é a plenitude dos bens
(cf. Rom 5,1); em segundo lugar, a esperança, que nos permite caminhar por este
mundo de cabeça levantada, de olhos postos no futuro glorioso da vida em
plenitude (cf. Rom 5,2-4).
MENSAGEM
Em terceiro lugar (e assim chegamos,
finalmente ao texto que nos é proposto hoje como segunda leitura), sermos
"justificados" (isto é, recebermos, de forma totalmente gratuita uma
salvação não merecida) implica descobrir o quanto Deus nos ama. O amor de Deus
pelos homens é, para Paulo, algo que nunca deixará de o "espantar"; e
é esse "espanto" que ele procura transmitir aos cristãos nas linhas
seguintes...
Para Paulo, a história da salvação é uma incrível história de amor.
Como o homem, contando apenas com as suas forças, não conseguiria superar a
situação de escravidão, de egoísmo e de pecado em que havia caído, Deus enviou
o seu Filho ao mundo; Ele ofereceu toda a sua vida - até à cruz - para que os
homens percebessem que o egoísmo gera morte e sofrimento e que só o amor gera
felicidade e vida sem fim. Dessa forma, Ele salvou os homens da escravidão do
egoísmo e do pecado e ofereceu-lhes, de forma totalmente gratuita, a salvação.
O mais incrível, no entanto, é que tudo isto aconteceu "quando éramos,
ainda, pecadores". Trata-se de algo incompreensível do ponto de vista
humano, que subverte totalmente a lógica dos homens... Nós talvez aceitássemos
morrer por alguém a quem amamos muito; mas em nenhum caso estaríamos dispostos
a dar a nossa vida por alguém egoísta, orgulhoso e auto-suficiente. No entanto,
Deus ama de tal forma os homens - todos os homens - que aceitou que o próprio
Filho morresse pelos ímpios.
O amor de Deus é verdadeiramente um amor "inqualificável", incrível,
ilógico, inexplicável. Soa a absoluto, a eternidade. Nada nem ninguém
conseguirá vencê-lo, derrotá-lo, eliminá-lo.
Paulo acrescenta ainda: e se Deus nos amou desta forma quando éramos pecadores,
com muito mais razão nos amará agora que nos reconciliamos com Ele. Esse amor
que nada nem ninguém conseguirá apagar é para nós garantia de vida em
plenitude.
ACTUALIZAÇÃO
A reflexão pode partir das seguintes questões:
• O cristão é fundamentalmente alguém que
descobriu que Deus o ama. Por isso, enfrenta cada dia com a serenidade, a
alegria, a esperança que brotam dessa certeza fundamental. A certeza do amor de
Deus condiciona a minha vida, a minha forma de enfrentar as dificuldades, o meu
jeito de responder aos desafios que a vida me coloca?
• O amor de Deus é totalmente gratuito,
incondicional e eterno. Não espera nada em troca; não põe condições para se
derramar sobre o homem; não é descartável... Numa época em que a cultura
dominante (não só a "cultura das telenovelas", mas também a cultura
de certas elites pretensamente iluminadas) vende a imagem do amor interesseiro,
condicionado e efémero, o amor de Deus constitui um tremendo desafio aos
crentes.
• O amor de Deus é universal. Não marginaliza
nem discrimina ninguém, não distingue entre amigos e inimigos, não condena
irremediavelmente os que falharam nem os afasta do convívio de Deus. Nós,
discípulos de Jesus, somos testemunhas deste amor? Como é que tratamos e
acolhemos aqueles que não concordam connosco, que assumem atitudes problemáticas,
que fracassaram no seu casamento, que têm comportamentos considerados social ou
religiosamente incorrectos?
EVANGELHO - Mt 9,36-10,8
Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo
São Mateus
Naquele tempo,
Jesus, ao ver as multidões, encheu-Se de compaixão,
porque andavam fatigadas e abatidas,
como ovelhas sem pastor.
Jesus disse então aos seus discípulos:
«A seara é grande, mas os trabalhadores são poucos.
Pedi ao Senhor da seara
que mande trabalhadores para a sua seara».
Depois chamou a Si os seus doze discípulos
e deu-lhes poder de expulsar os espíritos impuros
e de curar todas as doenças e enfermidades.
São estes os nomes dos doze apóstolos:
primeiro, Simão, chamado Pedro, e André, seu irmão;
Tiago, filho de Zebedeu, e João, seu irmão;
Filipe e Bartolomeu; Tomé e Mateus, o publicano;
Tiago, filho de Alfeu, e Tadeu;
Simão, o Cananeu, e Judas Iscariotes, que foi quem O entregou.
Jesus enviou estes Doze, dando-lhes as seguintes instruções:
«Não sigais o caminho dos gentios,
nem entreis em cidade de samaritanos.
Ide primeiramente às ovelhas perdidas da casa de Israel.
Pelo caminho, proclamai que está perto o reino dos Céus.
Curai os enfermos, ressuscitai os mortos,
sarai os leprosos, expulsai os demónios.
Recebestes de graça, dai de graça».
AMBIENTE
Depois de ter apresentado Jesus (cf. Mt
1,1-4,22) e de ter mostrado Jesus a anunciar o "Reino" em palavras e
em obras (cf. Mt 4,23-9,35), Mateus vai descrever o envio dos discípulos em
missão (cf. Mt 9,36-11,1). Os discípulos são aqueles que Jesus chamou, que responderam
positivamente a esse chamamento e seguiram Jesus; durante a caminhada que
fizeram com Jesus, escutaram os seus ensinamentos e testemunharam os seus
sinais. Formados por Jesus na "escola do Reino", eles podem agora ser
enviados ao mundo, a fim de anunciar a todos os homens a chegada do "Reino
dos Céus".
Os estudiosos do Evangelho segundo Mateus costumam chamar ao texto que vai de
9,36 a 11,1, o "discurso da missão": nele, Jesus envia os discípulos
e define a missão desses discípulos - anunciar a chegada do "Reino".
Este "discurso da missão" consta de várias partes: uma introdução
(cf. Mt 9,36-38); o chamamento e o envio dos discípulos (cf. Mt 10,1-15); uma
instrução sobre o "caminho" que os discípulos têm de percorrer (cf.
10,16-42); uma conclusão (cf. Mt 11,1).
Trata-se de um discurso composto por Mateus a partir de diversos materiais. O
autor combinou aqui relatos de envio, "ditos" de Jesus acerca dos
"doze" e várias outras "sentenças" de Jesus que
originalmente não foram proferidas neste contexto concreto.
Mateus escreve o seu Evangelho durante a década de 80. Dirige-o a uma
comunidade viva e entusiasta, profundamente empenhada na actividade missionária
(poderá ser a comunidade cristã de Antioquia da Síria). No entanto, as
dificuldades encontradas no anúncio do Evangelho e a perseguição traziam essa
comunidade algo desorientada e perturbada. Neste contexto, Mateus compôs uma
espécie de "manual do missionário cristão", que enraíza a missão em
Jesus Cristo, apresenta os conteúdos do anúncio que os discípulos são chamados
a proclamar e define as atitudes fundamentais que os missionários devem
assumir.
MENSAGEM
O texto que hoje nos é proposto inclui a
introdução e uma parte da descrição do chamamento e do envio dos discípulos.
Na introdução (cf. Mt 9,36-38), Mateus explica que essa missão à qual Deus
chama os discípulos é expressão da solicitude de Deus, que quer oferecer ao seu
Povo a salvação. Mateus - que escreve para uma comunidade onde existia um
número significativo de crentes de origem judaica - vai usar, para transmitir
esta mensagem, imagens retiradas do Antigo Testamento e muito familiares para
os judeus.
Nas palavras de Jesus, Israel é uma comunidade abatida e desnorteada, cujos
pastores (os líderes religiosos judeus) se demitiram das suas responsabilidades.
Eles são esses maus
pastores de que falavam os profetas (cf. Ez 34; Zac 10,2). O coração de Deus
está, no entanto, cheio de compaixão por este rebanho abatido e desanimado;
Deus vai, então, assumir as suas responsabilidades, no sentido de conduzir o
seu Povo para as pastagens onde há vida.
Duas notas ainda: a referência à "messe" indica que essa missão é
urgente e que já não há muito tempo para a levar a cabo (nos profetas, a
"messe" aparece ligada à imagem do juízo iminente de Deus - cf. Is
17,5; Jer 13,24; Jl 4,12-13); a referência ao "pedido" que deve ser
feito ao Senhor da "messe" é um apelo a que a comunidade contemple a
missão como uma obra de Deus, que deve ser levada a cabo com os critérios de
Deus (por isso, a comunidade deve rezar - a fim de se aperceber dos projectos,
das perspectivas e dos critérios de Deus - antes de empreender a tarefa de
anunciar o Evangelho).
Vem depois o chamamento dos discípulos (cf. Mt 10,1-4). Mateus começa por
deixar claro que a iniciativa é de Jesus: "chamou-os". Não há
qualquer explicação sobre os critérios que levaram a essa escolha: falar de
vocação e de eleição é falar de um mistério insondável, que depende de Deus e
que o homem nem sempre consegue compreender e explicar.
Depois, Mateus aponta o número dos discípulos ("doze"). Porquê
exactamente "doze"? Trata-se de um número simbólico, que lembra as
doze tribos que formavam o antigo Povo de Deus. Estes "doze"
discípulos representam simbolicamente a totalidade do Povo de Deus, do novo
Povo de Deus.
Em seguida, Mateus define a missão que Jesus lhes confiou ("deu-lhes poder
de expulsar os espíritos impuros e de curar todas as doenças e
enfermidades"). Os espíritos impuros, as doenças e as enfermidades
representam tudo aquilo que escraviza o homem e que o impede de chegar à vida
em plenitude. A missão dos discípulos é, pois, lutar contra tudo aquilo - seja
de carácter físico, seja de carácter espiritual - que destrói a vida e a
felicidade do homem (podemos dizer que a missão dos discípulos é lutar contra o
"pecado").
Finalmente, Mateus aponta os nomes dos "Doze" (Simão Pedro, André,
Tiago filho de Zebedeu, João, Filipe, Bartolomeu, Tomé, Mateus, Tiago filho de
Alfeu, Tadeu, Simão o cananeu e Judas Iscariotes). As listas apresentadas pelos
vários evangelistas apresentam diferenças, seja na ordem dos nomes, seja nos
próprios nomes (Tadeu é, na lista de Lucas, Judas). Em qualquer caso, Pedro
encabeça sempre a lista e Judas Iscariotes fecha-a. Estes dois são talvez as
duas personagens mais fortes e que, ao longo da caminhada com Jesus, devem ter
assumido algum protagonismo no grupo dos discípulos.
O último passo é o envio dos discípulos - evidentemente antecedido de um
conjunto de instruções para a missão (cf. Mt 10,5-8).
Em primeiro lugar (vers. 5-6), Jesus vai definir os destinatários da missão:
numa primeira fase, são "as ovelhas perdidas da casa de Israel". Esta
interpretação "restritiva" da missão explica-se a partir da forma
como o cristianismo se expandiu em termos geográficos: primeiro pela Palestina
e só depois fora das fronteiras da Palestina; provavelmente, também terá a ver
com as tensões existentes na comunidade de Mateus, onde alguns judeo-cristãos
tinham dificuldade em aceitar que o Evangelho fosse anunciado aos pagãos. Mais
tarde, Mateus vai deixar claro que, na segunda fase, o anúncio se destina,
também aos pagãos. Porquê? Porque a "casa de Israel" rejeitou Jesus e
a sua proposta do "Reino" (cf. Mt 21,43).
Em segundo lugar (vers. 7-8a.b.c.d), apontam-se os sinais que devem acompanhar
o anúncio da chegada do "Reino": a cura dos doentes, a ressurreição
dos mortos, a expulsão dos demónios. O anúncio não deve constar de palavras
apenas, mas de gestos concretos que sejam sinal vivo dessa libertação que o
"Reino" traz.
Em terceiro lugar (vers. 8e), aparece um apelo à gratuidade: os discípulos não
podem partir para a missão a pensar em colher dividendos pessoais, ou em
satisfazer interesses egoístas. A expressão "recebestes de graça, dai de
graça" convida a fazer da própria vida um dom gratuito ao "Reino",
sem esperar em troca qualquer paga.
Repare-se como em todo o discurso a missão dos discípulos aparece como um
prolongamento da missão de Jesus. O anúncio, que é confiado aos discípulos, é o
anúncio que Jesus fazia (o "Reino"); os gestos que os discípulos são
convidados a fazer para anunciar o "Reino" são os mesmos que Jesus
fez; os destinatários da mensagem que Jesus apresentou são os mesmos da
mensagem que os discípulos apresentam... Ao apresentar a missão dos discípulos
em paralelo e em absoluta continuidade com a missão de Jesus, Jesus convida a
Igreja (os discípulos) a continuar na história a obra libertadora que Ele
começou em favor do homem.
ACTUALIZAÇÃO
A reflexão pode partir das seguintes questões
e desenvolvimentos:
• Como cenário de fundo desta catequese sobre
o envio dos discípulos está o amor e a solicitude de Deus pelo seu Povo. Não
esqueçamos isto: Deus nunca Se ausentou da história dos homens; Ele continua a
construir a história da salvação e a insistir em levar o seu Povo ao encontro
da verdadeira liberdade, da verdadeira felicidade, da vida definitiva.
• Como é que Deus age hoje no mundo? A
resposta que o Evangelho deste domingo dá é: através desses discípulos que
aceitaram responder positivamente ao chamamento de Jesus e embarcaram na
aventura do "Reino". Eles continuam hoje no mundo a obra de Jesus e
anunciam - com palavras e com gestos - esse mundo novo de felicidade sem fim
que Deus quer oferecer aos homens.
• Atenção: Jesus não chama apenas um grupo de
"especialistas" para O seguir e para dar testemunho do
"Reino". Os "doze" representam a totalidade do Povo de
Deus. É a totalidade do Povo de Deus (os "doze") que é enviada, a fim
de continuar a obra de Jesus no meio dos homens e anunciar-lhes o
"Reino". Tenho consciência de que isto me diz respeito e que eu
pertenço à comunidade que Jesus envia em missão?
• Qual é a missão dos discípulos de Jesus? É
lutar objectivamente contra tudo aquilo que escraviza o homem e que o impede de
ser feliz. Hoje há estruturas que geram guerra, violência, terror, morte: a
missão dos discípulos de Jesus é contestá-las e desmontá-las; hoje há
"valores" (apresentados como o "último grito" da moda, do
avanço cultural ou científico) que geram escravidão, opressão, sofrimento: a
missão dos discípulos de Jesus é recusá-los e denunciá-los; hoje há esquemas de
exploração (disfarçados de sistemas económicos geradores de bem-estar) que
geram miséria, marginalização, debilidade, exclusão: a missão dos discípulos de
Jesus é combatê-los. A proposta libertadora de Jesus tem de estar presente
(através dos discípulos) em qualquer lado onde houver um irmão vítima da
escravidão e da injustiça. É isso que eu procuro fazer?
• As obras que eu realizo são verdadeiramente
um anúncio do mundo novo que está para chegar? Eu procuro transmitir alegria,
coragem e esperança àqueles que vivem imersos no abatimento, na frustração, no
desespero? Eu procuro ser um sinal do amor e da ternura de Deus para aqueles
que vivem sozinhos, abandonados, marginalizados?
• O nosso serviço ao "Reino" é um
serviço totalmente gratuito, ou é um serviço que serve para promover os nossos
interesses, a nossa pessoa, os nossos esquemas de realização pessoal?
ALGUMAS SUGESTÕES PRÁTICAS PARA O 11º DOMINGO
DO TEMPO COMUM
(adaptadas de "Signes d'aujourd'hui")
1. A PALAVRA MEDITADA AO LONGO DA SEMANA.
Ao longo dos dias da semana anterior ao 11º Domingo do Tempo Comum, procurar
meditar a Palavra de Deus deste domingo. Meditá-la pessoalmente, uma leitura em
cada dia, por exemplo... Escolher um dia da semana para a meditação comunitária
da Palavra: num grupo da paróquia, num grupo de padres, num grupo de movimentos
eclesiais, numa comunidade religiosa... Aproveitar, sobretudo, a semana para
viver em pleno a Palavra de Deus.
2. REENCONTRAR O TEMPO COMUM.
Reencontrar os domingos do tempo comum não significa entrar na rotina do
quotidiano. A repetição dos ritos não deve levar a isso. Aproveitemos o tempo
comum para avaliar e melhorar as nossas atitudes. Procuremos dar um cuidado
muito particular aos espaços na liturgia, ao seu equilíbrio, à sua beleza. Não
tenhamos medo de retomar cânticos bem conhecidos, que todos podem cantar sem a
folha na mão. O sentido das palavras tantas vezes repetidas continua vivo ao
longo dos tempos e dos acontecimentos. Não esqueçamos o silêncio, pois ele dá o
seu peso ao quotidiano e aos seus gestos repetidos. Não é no silêncio que o
Verbo de Deus visita a nossa carne e faz-nos habitar n'Ele, para nos alegrar e
nos colocar no mundo?
3. ANUNCIAR... A REENTRADA.
O Evangelho do apelo dos discípulos pode ser uma ocasião, no final da homilia,
para chamar aqueles que exercem um serviço na paróquia, assim como outros que
poderão vir a exercê-lo no próximo ano pastoral. Em atitude de acção de graças
e de renovação de compromisso...
4. ORAÇÃO NA LECTIO DIVINA.
Na meditação da Palavra de Deus (lectio divina), pode-se prolongar o
acolhimento das leituras com a oração.
No final da primeira leitura:
Nós Te bendizemos, ó Pai, pela ternura que manifestaste para com o teu povo:
fizeste-o sair do Egipto par o libertar, guiaste-o através do deserto, fizeste
dele o teu povo e um reino de sacerdotes.
Nós Te pedimos: abre os nossos corações e os nossos espíritos à tua palavra,
torna-nos atentos à tua voz, para que guardemos a tua Aliança.
No final da segunda leitura:
Nós Te damos graças, porque nos deste a maior prova do teu amor, enviando-nos o
teu Filho Jesus, e Ele mesmo viveu até aceitar a morte. Por Ele, reconciliaste-nos
contigo.
Nós Te pedimos por todas as vítimas das injustiças. Salva-nos pela vida de
Cristo ressuscitado. Justifica-nos pelo dom do teu Espírito.
No final do Evangelho:
Nós Te damos graças pela bondade de Jesus, porque Ele cuidou das multidões
humanas quando estavam fatigadas e abatidas, como ovelhas sem pastor. Nós Te
bendizemos pelos apóstolos que instituíste.
Mestre da seara, nós Te pedimos: envia operários para a tua seara. Torna-nos
acolhedores do Reino dos Céus que está bem próximo.
5. ORAÇÃO EUCARÍSTICA.
Pode-se escolher a Oração Eucarística III, que sublinha bem a obra do Espírito.
6. PALAVRA PARA O CAMINHO.
Uma abundante seara e tão poucos trabalhadores! O desemprego não existe no
campo missionário, são os trabalhadores que faltam! Porém, Jesus não se cansa
de chamar! Então? Estás à espera de quê? Não falta talvez consistência e
audácia à nossa fé para ousarmos arriscar este género de trabalho cujos
produtos não virão aumentar as nossas contas no banco? E se este convite te
disser pessoalmente respeito? Que respondes?
UNIDOS PELA PALAVRA DE DEUS
PROPOSTA PARA
ESCUTAR, PARTILHAR, VIVER E ANUNCIAR A PALAVRA NAS
COMUNIDADES DEHONIANAS
Grupo Dinamizador:
P. Joaquim Garrido, P. Manuel Barbosa, P. José Ornelas
Carvalho
Província Portuguesa dos Sacerdotes do Coração de Jesus
(Dehonianos)
Rua Cidade de Tete, 10 - 1800-129 LISBOA - Portugal
Tel. 218540900 - Fax: 218540909
portugal@dehonianos.org - www.dehonianos.org
Obrigado Senhor, obrigado Dehonianos!!!
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