11/09/2016
O Deus da misericórdia
O texto que hoje nos é oferecido, o capítulo 15 de Lucas, é
considerado geralmente o coração deste Evangelho. Nele o evangelista através de
três parábolas apresenta o Deus de Jesus, o Deus da misericórdia e da ternura.
É interessante o contexto em que é situada esta longa e colorida
perícope. Os cobradores de impostos e os pecadores rodeiam Jesus para escutá-lo
enquanto os fariseus e doutores da lei o criticam.
Isso nos faz lembrar as palavras de Jesus: "As pessoas que tem
saúde não precisam de médico, mas só as que estão doentes. Em não vim para
chamar justos, e sim pecadores para o arrependimento" (Lc5, 31-32). Jesus
traz uma novidade radical. Sua predileção pelos pequenos e marginalizados
escandaliza a elite religiosa de época.
Mas Ele não desiste da sua missão de fazer presente o Amor de seu
Pai com sua vida e palavras. Sentemo-nos, então, aos pés de Jesus para acolher
seus ensinamentos que no dia de hoje vão nos revelar o verdadeiro rosto de
Deus.
Chama a atenção que as duas primeiras parábolas têm a mesma
estrutura. Trata-se de um homem ou uma mulher que perderam algo ou alguém
querido. Saem em sua busca, sem importar-lhes os riscos, e, quando encontram a
ovelha perdida ou a moeda, fazem festa!!! A alegria toma conta de todos/as.
Talvez, desta maneira, Lucas nos queira apresentar o rosto paterno
e materno de Deus que, movido pela compaixão, princípio ativo de sua
misericórdia, vai ao encontro do que estava perdido. Não para condenar, culpar,
senão para salvar, amar. E ali está sua alegria.
Como já dizia Santo Irineu, a alegria de Deus é o homem e a mulher
vivente, que tenham vida, e vida em abundância.
Esse permanente amor de Deus que vai ao encontro de seus filhos/as,
não importando onde se encontrem, é o que moveu Jesus durante sua vida pública
e há de ser também o que move seus discípulos/as de todos os tempos.
Do mesmo que seu Mestre, a comunidade cristã é convidada a viver em
um permanente despojamento de si mesma, indo ao encontro das pessoas nas
diferentes situações em que elas se encontram.
Percorrer o caminho da compaixão e da solidariedade especialmente
com os "excluídos" deste mundo, aqueles que, para mentalidade de
hoje, já não são mais considerados só como "explorados", mas
"supérfluos" e "descartáveis", com sinaliza o documento de
Aparecida no número 65.
A Igreja é portadora e instrumento de paz e reconciliação, de
libertação e comunhão num mundo desgarrado pela violência, desigualdade e
injustiça.
No Angelus de Domingo 1º de setembro de 2013 o Papa Francisco
dirigiu ao mundo o forte apelo: "Nunca mais a guerra! Nunca mais a
guerra". "Vivo com particular sofrimento e com preocupação as várias
situações de conflito que existem na nossa terra; mas, nestes dias, o meu
coração ficou profundamente ferido por aquilo que está acontecendo na Síria, e
fico angustiado pelos desenvolvimentos dramáticos que se preanunciam",
continuou.
Já à terceira parábola daremos o nome de "Família
abandonada", porque o filho deixa sua casa, com todas as pessoas que nela
habitam!
Não podemos esquecer a mentalidade patriarcal que permeia os
evangelhos, própria da cultura de época na qual a figura paterna ocupa um
lugar central.
Com certeza, a mãe junto com o pai sofreu a partida do filho, mas o
amor de ambos era tal que respeitaram sua decisão. Seu amor se viu
"limitado" pela opção do filho menor.
O ser humano, por meio de suas atitudes e opções, coloca limites ao
Amor de Deus! Não deixa que ele aja livremente na sua vida, fecha sua
"porta" e busca construir sua vida além da presença misericordiosa de
Deus.
Mas Deus não desiste do ser humano! O filho menor nos mostra isso
claramente, quando, depois de gastar tudo e se encontrar entre os porcos, cai
em si e diz: "Quantos empregados do meu pai têm pão com fartura, e eu
aqui, morrendo de fome... Vou me levantar, e vou encontrar meu pai...".
A saudade da casa do pai, da origem, é a presença do Espírito no
coração da pessoa, acordando-a para iniciar o caminho de busca de uma vida
digna, plena.
Claro que uma vez mais Deus se submete à decisão do ser humano, ele
motiva, impulsiona, acorda, até incomoda, mas o colocar-se de pé e iniciar o
caminho de salvação é uma livre opção de cada um/a.
É muito bonita a imagem do Pai, da Mãe que sai todos os dias para
ver se o filho se aproxima. Como afirma Francisco: Deus ama as pessoas como uma
mãe. Quanta paciência a de nosso Deus! Não se cansa de nos aguardar com o os
braços abertos e coração pronto para nos oferecer sua misericórdia.
A sua confiança no ser humano é um desafio à nossa! Somos capazes
de esperar o tempo, o processo das pessoas com as quais caminhamos em nosso
serviço pastoral, com alegria e ternura?
A parábola nos narra a festa que se organiza pela volta do filho.
Toda a casa se organiza para que ele se sinta bem acolhido, revestido novamente
com a dignidade de filho. O amor de Deus Pai e Mãe apaga os erros do passado e
coloca em seus pés sandálias novas, símbolo do novo caminho que se abre para
ele.
Entretanto, para que a festa seja completa, falta a participação de
um dos membros da família, o filho mais velho, do qual geralmente se fala
severamente nos comentários.
Talvez precisemos ter mais em conta que ele também sofreu pela
partida do irmão e viu seu trabalho reforçado. Ele ainda não tem o coração de
seus pais para acolher o irmão menor com tanta generosidade e desprendimento.
E uma vez mais o pai, a mãe entendem. Esperam-no na festa, sabem
suportar seu não, mas não deixam de mostrar-lhe por que é preciso celebrar:
“esse seu irmão estava morto, e tornou a viver; estava perdido, e foi
encontrado”.
Deixam as portas abertas, respeitando o tempo que o filho maior
precise a fim de que seu amor cresça o suficiente para perdoar e aceitar os
limites próprios e dos outros.
E as portas continuam abertas para também participarmos da festa da
misericórdia, à qual todos/as somos continuamente convidados e amorosamente
esperados!
Fonte: Instituto Humanitas Unisinos
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