19- Segunda - Evangelho - Lc 12,13-21
Evangelho
- Lc 12,13-21
O episódio narrado no evangelho de hoje só se encontra no
Evangelho de Lucas e não tem paralelo nos outros evangelhos. Ele faz parte da
longa descrição da viagem de Jesus, desde a Galileia até Jerusalém (Lc 9,51 a
19,28), na qual Lucas colocou a maior parte das informações que ele conseguiu
coletar a respeito de Jesus e que não se encontram nos outros três evangelhos
(cf. Lc 1,2-3). O evangelho de hoje traz a resposta de Jesus à pessoa que lhe
pediu para ser mediador na repartição de uma herança.
O que está por trás do
texto? Uma ideia do que está por trás do texto ajuda a entender a posição de
Jesus. No tempo de Jesus havia duas propostas de sociedade ou dois modelos
econômicos: o do campo e o da cidade. O do campo se fundamentava na partilha,
através da solidariedade, da troca de produtos, etc. Isso impedia que os
endividados caíssem na desgraça e que tivessem que emigrar para a cidade,
tornando-se mendigos ou bandidos. O modelo econômico da cidade, ao contrário, é
fundamentado na ganância, no acúmulo, na lei do mais forte. Isso naturalmente é
fonte de exclusão e marginalidade. Isso gera mendicância, violência, roubo,
etc. Sem dúvida o texto de hoje reflete uma situação do modelo econômico da
cidade e não do campo, reflete a ganância e a exploração, não a partilha. Jesus
toma posição em favor da partilha, não da cobiça, mas sem se colocar como
árbitro entre os que possuem riquezas.
Do meio da multidão, alguém
disse a Jesus: “Mestre, dize ao meu irmão que reparta a herança comigo.” Ontem como hoje, a distribuição da herança entre os
familiares sobreviventes é sempre uma questão delicada e, muitas vezes, ocasião
de brigas e tensões sem fim. Naquele tempo, a herança tinha a ver também com a
identidade das pessoas (1Rs 21,1-3) e com a sua sobrevivência (Nm 27,1-11;
36,1-12). O problema maior era a distribuição das terras entre os filhos do
falecido pai. Sendo a família grande, havia o perigo de a herança se esfacelar
em pequenos pedaços de terra que já não poderiam garantir a sobrevivência de
todos. Por isso, para evitar o esfacelamento ou desintegração da herança e
manter vivo o nome da família, o mais velho recebia o dobro dos outros filhos
(Dt 21,17. cf. 2Rs 2,11).
Jesus respondeu: “Homem, quem
foi que me encarregou de julgar ou dividir os bens entre vocês?” Na resposta de Jesus transparece a consciência que ele
tinha da sua missão. Jesus não se sente enviado por Deus para atender ao pedido
de arbitrar entre os parentes que brigam entre si por causa da repartição da
herança. Mas o pedido do homem despertou nele a missão de orientar as pessoas,
pois “ele falou a todos: Atenção!
Tenham cuidado com qualquer tipo de ganância. Porque, mesmo que alguém tenha
muitas coisas, a sua vida não depende de seus bens.” Fazia parte da
sua missão esclarecer as pessoas a respeito do sentido da vida. O valor de uma
vida não consiste em ter muitas coisas mas sim em ser rico para Deus (Lc
12,21). Pois, quando a ganância toma conta do coração, não há como repartir a
herança com equidade e paz.
Em
seguida, Jesus conta uma parábola para ajudar as pessoas a refletir sobre o
sentido da vida: “A terra de um homem rico deu
uma grande colheita. E o homem pensou: O que vou fazer? Não tenho onde guardar
minha colheita.” O homem rico está totalmente fechado dentro da
preocupação com os seus bens que aumentaram de repente por causa de uma
colheita abundante. Ele só pensa em acumular para garantir uma vida
despreocupada. Ele diz: “Já sei o que fazer! Vou derrubar meus celeiros e
construir outros maiores; e neles vou guardar todo o meu trigo, junto com os
meus bens. Então poderei dizer a mim mesmo: meu caro, você possui um bom
estoque, uma reserva para muitos anos; descanse, coma e beba, alegre-se!”
“Mas Deus lhe disse: Louco!
Nesta mesma noite você vai ter que devolver a sua vida. E as coisas que você
preparou, para quem vão ficar?” A
morte é uma chave importante para redescobrir o sentido verdadeiro da vida. Ela
relativiza tudo, pois mostra o que perece e o que permanece. Quem só busca o
ter e esquece o ser perde tudo na hora da morte. Aqui transparece um pensamento
muito frequente nos livros sapienciais: para que acumular bens nesta vida, se
você não sabe para quem vão ficar os bens que você acumulou, nem sabe o que vai
fazer o herdeiro com aquilo que você deixou para ele? (Ecl 2,12.18-19.21)
“Assim acontece com quem ajunta
tesouros para si mesmo, mas não é rico para Deus.” Como tornar-se rico para Deus? Jesus deu várias
sugestões e conselhos: quem quer ser o primeiro, seja o último; é melhor dar
que receber (At 20,35); o maior é o menor; preserva vida quem perde a vida.
A
posição de Jesus está clara na sua exortação e na parábola que contou. Jesus é
contra qualquer cobiça, pois a cobiça não garante a vida de ninguém. A parábola
é um monólogo de um homem rico, ganancioso e egoísta, cujo ideal de vida é
apenas comer, beber e desfrutar. Este homem não pensa nos seus empregados, não
pensa nos pobres; é profundamente ganancioso e egoísta. Jesus chama-o de
insensato, e afirma sua morte naquela mesma noite. Isso significa que acumular
bens não garante a vida. O importante é ser rico para Deus, através da justiça,
da partilha e solidariedade para com o próximo, pois “quem se compadece do pobre
empresta a Deus” (Pr 19,17; Eclo 29,8-13). Eclo 29,12 diz
expressamente: “Dê esmola daquilo que você tem
nos celeiros, e ela o livrará de qualquer desgraça.”
Pai, preserva-me do apego
exagerado às riquezas, as quais me tornam insensível às necessidades do meu
próximo. Que eu descubra na partilha um caminho de salvação.
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