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de Dezembro- Segunda - Evangelho - Lc 1,46-56
“Magnificat” é o título latino muito cedo dado
ao “Cântico de Maria”, o belo poema de Lc 1, 46-56. Mas engana-se quem pensa
que Maria pronunciou tudo aquilo de improviso, dando uma de “repentista”. O
poema é uma coletânea de versos extraídos do Primeiro Testamento, tendo como
pano de fundo o chamado Cântico de Ana (1 Sm 2,1-10).
E, nesse sentido, é poema de mulheres pobres,
não só por marcar o encontro de Maria e Isabel, mas por se constituir em
memória de um grupo que por nós precisa ser melhor conhecido.
Ao atribuir o poema a Maria, a comunidade de
Lucas quer, entre outras coisas, afirmar que a jovem mãe fazia parte dos pobres
de Deus.
Desde a época da destruição do país pela
Babilônia, que aconteceu por volta de 587 a.C., o povo israelita começa a
esperar o restaurador do reino davídico, o Messias. Com o passar do tempo, vão
se constituindo grupos e partidos, cada um com sua teologia própria, cada um
esperando um messias que viesse satisfazer seus interesses. Começam a se
formular compreensões diferentes dessa figura.
Os fariseus, por exemplo, aguardavam a chegada
de um messias que viesse restaurar o reino davídico a partir da exigência do
cumprimento total da Lei de Moisés. Os zelotas, por sua vez, aguardavam um
messias guerrilheiro que expulsasse a dominação romana por meio de uma
revolução armada.
Apesar dos poucos registros históricos, sabemos
da existência de um outro grupo que se reunia para louvar ao Deus dos pobres,
na espera de um messias que viesse do meio dos pobres, tal como havia
profetizado Zacarias: “Eis que o teu rei vem a ti; ele é justo e vitorioso,
humilde, montado sobre um jumento, sobre um jumentinho, filho da jumenta” (Zc
9,9). Trata-se dos ‘anawîm’, os pobres de Deus. Desse grupo faziam parte,
provavelmente, Isabel e Zacarias, os pais de João Batista, justos diante de
Deus (Lc 1,5-6); o justo e piedoso Simeão, que aguardava a consolação de Israel
(Lc 2, 25); a profetiza Ana, com seus oitenta e quatro anos de sonho e
esperança (Lc 2, 36-38). E Maria, com seu noivo José, que também era justo,
conforme Mt 1,19.
O termo “justo” é um adjetivo frequentemente
atribuído às pessoas participantes do grupo dos ‘anawîm’. É notável a liderança
das mulheres entre os ‘anawîm’. Muito provavelmente em seus momentos de
encontro, de oração, elas iam coletando frases do Primeiro Testamento e
compondo canções como o Magnificat.
Os
capítulos iniciais do Evangelho de Lucas recolhem ainda o chamado Cântico de
Zacarias (Lc 1, 68-75), outro exemplo desses poemas. Maria sabia de cor essas
canções, elas eram a história do seu povo. Composição de mulheres que conhecem
bem as Escrituras. Numa cultura onde as mulheres não tinham
acesso às letras, chama a atenção como no Magnificat se fazem presentes os
textos bíblicos.
É evidente a força feminina na manutenção da
história através da memória oral, visto que a escrita estava ligada a pequenos
grupos, normalmente de homens detentores do poder. Assim perceberemos como
Maria e as suas companheiras conheciam bem a história de seu povo e dela
tiravam forças para lutar. A principal fonte inspiradora do Magnificat é o
Cântico de Ana, mulher estéril, por isso discriminada e humilhada. Na amargura,
chora e derrama a sua alma diante de Deus (1 Sm 1,10.15). Mas sabe expressar a
sua gratidão ao se tornar mãe de Samuel: “eu o pedi a Javé” (1 Sm 1, 20).
Muito sabiamente, o redator de 1 Samuel a ela
atribui o poema presente em 1Sm 2,1-10. “O meu coração exulta em Deus, a minha
força se exalta, o arco dos poderosos é quebrado, os fracos são cingidos de
força” (vv 1.4-5). Entretanto, o Magnificat percorre vários livros do Primeiro
Testamento. Isaías havia dito: “Transbordo de alegria em Javé, a minha alma se
alegra, porque ele me vestiu com vestes de salvação, cobriu-me com um manto de
justiça…” (Is 61,10). Hab 3,18 diz algo semelhante: “Eu me alegrarei em Javé,
exultarei no Deus de minha salvação”. A figura do “Servo Sofredor” também é
retomada, quando o poema diz que o Senhor “socorreu a Israel seu servo”(Lc
1,54).
Em Maria acontece algo extraordinário: toda a
sua alma concebe o Verbo de Deus, porque ela foi imaculada e isenta de vícios,
guardou a sua castidade com pudor inviolável. Assim, com Maria, engrandece ao
Senhor, aquele que segue dignamente a Jesus Cristo. A Virgem humilde de Nazaré
vai ser a Mãe de Deus; jamais a onipotência do Criador se manifestou de um modo
tão pleno. E o Coração de Nossa Senhora manifesta de modo transbordante a sua
gratidão e a sua alegria. E então, canta: “a minha alma engrandece o Senhor e o
meu espírito exulta em Deus meu Salvador”.
Pai, faz-me sensível à espiritualidade daquela
que escolheste para ser mãe de teu Filho, porque ela penetrou, de modo
admirável, em teu mistério de amor.
Hoje recebo uma catequese sobre o Magnifica.Obrigado.
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