Domingo, 08 de Fevereiro de 2015
Quinto Domingo do
Tempo Comum
Jerônimo, Emiliano
Jó 7,1-4.6-7:
Consumo-me de dor até a noite
Salmo 46: Louvai o
Senhor que cura os corações feridos
1Coríntios
9,16-19.22-23: Ai de mim se não anuncio o evangelho!
Marcos 1,29-39:
Jesus cura a sogra de Pedro e outros enfermos.
31 Aproximando-se ele, tomou-a pela mão e levantou-a; imediatamente a
febre a deixou e ela pôs-se a servi-los. 32 À tarde, depois do pôr-do-sol,
levaram-lhe todos os enfermos e possessos do demônio. 33 Toda a cidade estava
reunida diante da porta. 34 Ele curou muitos que estavam oprimidos de diversas
doenças, e expulsou muitos demônios. Não lhes permitia falar, porque o
conheciam. 35 De manhã, tendo-se levantado muito antes do amanhecer, ele saiu e
foi para um lugar deserto, e ali se pôs em oração. 36 Simão e os seus
companheiros saíram a procurá-lo. 37 Encontraram-no e disseram-lhe: "Todos
te procuram." 38 E ele respondeu-lhes: "Vamos às aldeias vizinhas,
para que eu pregue também lá, pois, para isso é que vim." 39 Ele
retirou-se dali, pregando em todas as sinagogas e por toda a Galileia, e
expulsando os demônios. 40 Aproximou-se dele um leproso, suplicando-lhe de
joelhos: "Se queres, podes limpar-me." 41 Jesus compadeceu-se dele,
estendeu a mão, tocou-o e lhe disse: "Eu quero, sê curado."
COMENTÁRIO
Jó mergulhado no sofrimento. Diante de seus amigos abre seu coração, sua
desilusão. Eles, que defendem uma teologia distante da vida, não podem
compreender a queixa de seu amigo nem acompanha-lo plenamente em sua dor. O
grito de Jó está presente na vida diária de muitos homens e mulheres em todos
os cantos do planeta e enfrentam uma vida de luta e dificuldade. Jó compara sua
existência com a vida de um “mercenário”, isto é, aquele que vende sua luta que
livra por dinheiro causas que não são suas e se afadiga por empreendimentos que
não ama.
O livro de Jó, como sabemos, é uma joia literária dentro da bíblia
hebraica (da qual é tomado do Primeiro Testamento). É uma reflexão sapiencial
sobre esse problema insolúvel, ou melhor, sobre esse mistério eterno que é “o
mal”. O mistério do mal, sua presença injustificada no mundo, ante o qual
necessitamos justificar os que poderiam estar implicados pela existência do
mal. A Deus, em primeiro lugar. Efetivamente, a “teodiceia” ou disciplina
filosófica que mostra a existência de Deus, trata, na realidade de “justificar”
a Deus – como expressa a própria etimologia da palavra.
O importante no livro de Jó não são seus “dados históricos” (que não
existem, pois não é um livro histórico), nem as respostas de tipo explicativo
que são dadas sobre a dor humana (que seriam hoje absolutamente ultrapassadas),
mas a sabedoria de suas reflexões.
Decididamente a ciência avança a cada dia e não faz sentido hoje estudar
a ótica na perspectiva de Newton, por exemplo, que foi um de seus fundadores,
pois como ciência sua obra está hoje abertamente ultrapassada. Contudo, não
avançamos a cada dia em sabedoria, que não está no mesmo plano da ciência, e e
hoje a humanidade segue vivendo da sabedoria de personagens como Confúcio,
Buda, Sócrates, Jesus... Na realidade, não temos avançado no que diz respeito
àquela sabedoria fundamental, adquirida há mais de três mil anos... Esta
constatação nos permite escutar e ler o livro de Jó.
Paulo menciona de maneira a reflexão de Jó. Situa-se em uma discussão
acalorada com seus interlocutores na comunidade de Corinto, na qual grupos ou
facções criticam e questionam sua autoridade (v. 3). Paulo responde fazendo uma
defesa radical de usa missão e declara sua absoluta liberdade frente a toda
manipulação ou poder humano. Não se declara membro de um movimento ou
representante de alguma instituição, mas como homem “obrigado a cumprir uma
tarefa”. No Império Romano era comum a prática do clientelismo, na qual o
benfeitor se convertia em patrão de quem recebia seus benefícios. O Apóstolo
deseja deixar claro a pureza de sua mensagem, que não está vendida a ninguém
“cliente”, nem moldado por nenhum interesse pessoal (v. 17-18). Esta liberdade
em Cristo lhe permite ser um servidor dos demais. Não teme amoldar-se às
condições de via dos destinatários de sua mensagem: Judeus, seguidores da lei
ou rebeldes dela, débeis. Paulo anuncia assim o evangelho da liberdade que não
se matricula com a rigidez nem faz o jogo com a diferença e quer chegar a todas
as realidades humanas, como uma Boa Notícia do amor de Deus.
No evangelho de Marcos, Jesus entra na vida das pessoas, torna-se um
deles em sua cotidianidade. O domingo passado nós o vimos curando um
endemoninhado. Hoje o acompanhamos com Simão e André na casa de Pedro. A casa é
o lugar íntimo onde se partilha o teto e a mesa. Aí se encontra com uma anciã
enferma, a sogra de Pedro. Jesus se aproxima, toma-a pela mão e a faz levantar.
Um gesto tão simples como é o aproximar-se e dar a mão a alguém, faz com que
recupere sua saúde e também a capacidade de servir. Ao entardecer, muitos
vieram busca-los e relata o evangelista que Jesus continuou curando. Era comum
na época de Jesus que os enfermos fossem considerados malditos ou possuídos por
espíritos maus, e assim se justificava sua exclusão da comunidade sem que
ninguém se atrevesse a aproximar-se deles. Jesus, ao contrário, se entrega com
amor e dedicação ao seu cuidado, tornando-se um servidor.
A prática da cura, a luta contra o mal, isto é, a práxis libertadora do
ser humano... é a prática habitual de Jesus. Tão importante como fazer o bem é
evitar o mal e lutar contra ele: dar a vida na tarefa de procurar a paz, a
saúde, o bem-estar, a felicidade... a todos aqueles que a perderam. Ser cristão
é, entre muitas outras coisas, lutar contra o mal, não ficar de braços
cruzados, ou ensimesmado pelos próprios assuntos, quando vivemos em um mundo
com as cifras arrepiantes de pobreza e miséria que hoje padecemos.
Anunciar hoje o reino não é questão somente de palavras. Exige
simultaneamente que se construa o reinado de Deus. A nossa evangelização, deve
ser como a de Jesus. Seu “anunciar´” a boa notícia não é questão simplesmente
de transmitir informação...mas de fazer, de construir, de lutar contra o mal,
de curar, reabilitar os irmãos. Colocar-se a serviço, acompanhar e dignificar a
vida, em todas as suas modalidades é manifestação da mão criadora de Deus.
Oração: Pai criador, que escutas e atendes os clamores da humanidade e
que em Jesus nos mostraste o projeto de bondade e liberdade para teus filhos e
filhas. Faze de nós crentes audazes que livres de todo afã de domínio e
ganância, saibamos ser servidores de todos, especialmente de teus filhos
sozinhos e abandonados. Que sejamos construtores de um mundo sem exclusões no
qual todos tenhamos igual dignidade e iguais oportunidades para que a
humanidade e a criação que sofre possa também um dia levantar-se e realizar-se
plenamente em paz e bem estar. Tu que vives e amas pelos séculos dos séculos.
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