DOMINGO DE RAMOS 29/03/2015
Evangelho da Bênção dos Ramos
Marcos 11, 1-10
Isaias 50, 4-7
Salmo 21/22,2 a “Meu Deus, meu
Deus, por que me abandonastes?”
1ª Leitura Filipenses 2, 6-11
Evangelho da Paixão Marcos 14,1
15,47
"ACOLHAMOS NOSSO REI!"
Lembro-me quando Pedro Augusto
Rangel elegeu-se primeiro prefeito da minha cidade de Votorantim, recém
emancipada, e o povo se aglomerava no jardim "Bolacha", onde ele
passou com um grupo numeroso, a gente ficava na calçada em meio à multidão e
acenávamos enquanto que ele nos retribuía com acenos e sorrisos. Eu me senti
orgulhoso por estar lá, apesar de ser um menino, pois o fato do prefeito ter
retribuído o aceno, dava-me a nítida impressão de que ele olhava para mim. Essa
troca de olhares, sorrisos, acenos, tudo é um sinal exterior daquilo que
interiormente estamos sentindo. Eu na verdade não sentia nada, mas percebi que
meu pai estava emocionado e dizia todo radiante “Esse é dos nossos, é do
povão”.
O povo simples, postado à beira do
caminho que levava a Jerusalém, se identificava com Jesus de Nazaré, havia em
todos aqueles corações, marcados pela esperança, um sentimento de alegria,
porque o esperado reino messiânico estava chegando naquele homem: Jesus de
Nazaré, montado em um jumentinho, para pôr um fim no reino da pomposidade. O
mesmo sentimento presente no coração do povo estava também no coração do
Messias, porém, a salvação e libertação, que ele trazia, era em seu sentido
mais amplo.
A procissão do Domingo de Ramos
exterioriza esse acolhimento, essa aceitação de Jesus, no coração e na vida de
quem crê mas precisamos tomar muito cuidado, para que o nosso canto de Hosana, não
fique no oba-oba do entusiasmo momentâneo, pois proclamá-lo nosso Rei e Senhor,
significa um rompimento com qualquer mentalidade ou cultura da modernidade, é a
experiência profunda da conversão sincera, é a prática de uma espiritualidade
que ultrapassa a religiosidade ou o simples devocional, e que nos coloca na
linha do discipulado. A ruptura se faz necessária justamente porque as vozes
contrárias ao Reino, dos Poderes do mundo, tentarão sempre abafar ou distorcer
a palavra de Deus.
Por isso, o servo sofredor, apresentado por
Isaias na primeira leitura, é alguém “duro na queda”, inflexível, convicto da
missão, e que nunca se deixa “engambelar” , porque tem a língua sempre afiada,
não para cortar a vida do próximo, mas para proclamar as Verdades de Deus,
reconfortando os tristes e abatidos, despertando esperança no coração de todos
os que o ouvem. Ainda é esse mesmo Deus que lhe abre ou ouvidos para que escute
como discípulo.
Escutar como discípulo requer a
disposição interior em doar-se totalmente por esta causa, por isso este Servo
sofredor, que a igreja aplicou a Jesus, coloca toda sua confiança no Deus que
vem ao seu auxílio, e que jamais o irá desapontar. Há ainda nessa liturgia, uma
atitude que não deve faltar na vida de quem se dispõe a acolher Jesus Cristo
como seu único Senhor e Salvador, é o esvaziamento, em grego “kênose”, que
encontramos na segunda leitura dessa liturgia, quem quiser encher-se como um
pavão, e alimentar a vaidade da santidade, nunca poderá ser discípulo
autêntico, pois o Cristo que hoje acolhemos é o Cristo da vergonha e
humilhação, é o Cristo rebaixado á condição de servo, é o Cristo que morre nu,
pendurado em uma cruz, em uma morte vergonhosa e extremamente humilhante.
Acolher e ovacionar Jesus neste
domingo de ramos é bastante comprometedor, por isso que a procissão expõe a fé
da nossa igreja publicamente, acenar com os ramos, cantar nossos hinos de
louvores e de Hosana, significa a disposição, a coragem e a fidelidade, para
percorrer esse mesmo caminho, na firmeza inabalável, ainda que o mundo nos
apresente tantos atalhos sedutores, onde podemos ser cristãos adocicados, ou se
preferirem, cristãos de “meia tigela”, sem sofrimento e sem nenhum compromisso
com o ensinamento do evangelho, como dizia um compadre na porta da igreja, em
tom de brincadeira “Ser cristão é coisa muito boa, o que atrapalha é a cruz”,
assim pensa a maioria dos cristãos da modernidade, e o próprio Pedro – Chefe da
Igreja – também pensava, pois negou o mestre por três vezes, hoje se nega muito
mais.
O evangelho da paixão nos mostra o
elemento fundamental na vida do cristão: a oração, mas não aquela em que
choramingamos diante de Deus, pedindo para que ele mude a nossa sorte, nos
favorecendo em tudo aquilo que queremos, mas oração igual a de Cristo em sua agonia.
E finalmente, em um momento
tenebroso, Lucas descreve a prisão de Jesus, como uma vitória momentânea das
trevas sobre a luz. Jesus hoje continua preso, querem abafar o seu ensinamento,
distorcer a essência do seu evangelho, amenizar as exigências do ser cristão,
transformando-o em um cristianismo mais “light”. É bom durante a procissão de
ramos, fazermos um questionamento: De que lado nós estamos? Senão, esta Semana
chamada de Santa, será apenas mais uma entre muitas, cheia de piedade e
devoção, e sensibilidade capaz de arrancar lágrima dos olhos, nada que uma boa
dramatização teatral, também não consiga fazê-lo...(Diácono José da Cruz –
Paróquia Nossa Senhora Consolata – Votorantim SP –E-mail cruzsm@uol.com.br)
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