DIA 19 QUARTA - Evangelho - Mc 8,22-26
Temos neste texto uma narrativa bem
característica do evangelista Marcos, rica em detalhes, destacando o toque,
particularmente no uso da saliva. Marcos a introduz como prefácio da caminhada
de Jesus com os discípulos de Cesareia de Filipe até Jerusalém.
Depois de curas que causaram grande
repercussão no território pagão da Palestina, Jesus e Seus discípulos
continuaram o itinerário até a região da Judeia, onde Ele realiza a segunda
multiplicação dos pães. Segue adiante o caminho exortando-os a não pensarem
como pensam os fariseus e repreendendo-os para que se guardassem do fermento de
Herodes. Atravessam a Judeia e retornam à Galileia “e chegaram a Betsaida”.
Esta cidade, vizinha de Cafarnaum, situava-se a noroeste do mar da Galileia e
foi berço de Pedro, André e Filipe. Aí nasceram, brincaram, cresceram,
aprenderam os primeiros rudimentos da pesca e depois…
Pedro e André eram irmãos. André – de
índole mais religiosa e mais contemplativa – era discípulo de João Batista. Um
dia, quando conversava com dois de seus discípulos, João viu Jesus que passava
ao longe e exclamou: “Eis o Cordeiro de Deus”. Eles o deixaram e seguiram
Cristo, passando com Ele aquele dia. Um deles era André. No dia seguinte ele
foi ao encontro de Simão para lhe transmitir a notícia maravilhosa:
“Encontramos o Messias (que quer dizer o Cristo); e ele o conduziu até a
presença do Senhor.
Marcos continua o seu relato dizendo que
“trouxeram-lhe então um cego, rogando que ele o tocasse”. No capítulo seis do
Evangelho narrado por Mateus (referindo-se ao tesouro), Jesus faz uma
associação nos versículos 22 e 23 com a visão, dizendo: “O olho é a luz do
corpo. Se teu olho é são, todo o teu corpo será iluminado. Se teu olho estiver
em mau estado, todo o teu corpo estará nas trevas. Se a luz que está em ti são
trevas, quão espessas serão as próprias trevas!”
A visão é um tesouro precioso que Deus
nos deu. Os nossos olhos sadios podem contemplar a beleza do nascer e do
pôr-do-sol; podem ver o desabrochar de um botão em flor; podem se extasiar
diante do milagre da vida que resplandece a cada instante; como podem refletir
a dor de uma perda, através de lágrimas que escorrem num rosto vazio de
esperança; ou refletir o que transborda do nosso coração, porque – como dizia o
poeta – “os olhos são o espelho da alma”.
Esse homem era cego. A ansiedade que
tomava conta de sua alma era indecifrável. Naquele instante ele sentia que
estava frente a frente com Jesus – aquele que dissera certa vez: “Eu sou a luz
do mundo” (Jo 8,12). Os seus olhos eram trevas, mas o seu coração começara a
irradiar um tênue raio de luz.
“Tomando o cego pela mão, Jesus levou-o para fora do povoado
e cuspindo-lhe nos olhos e impondo-lhe as mãos, perguntou-lhe: – Percebes
alguma coisa?” Eu fico aqui imaginando o que se passava na mente daquele homem!
A dúvida, a insegurança, o medo, a frustração, a decepção, os questionamentos
interiores da fé: E
se eu abrir os olhos e não enxergar nada? Se a escuridão continuar, o que será
de mim? O que dirão os que me trouxeram até ele?
O cego de Betsaida era um homem de carne e osso semelhante a
nós, sujeito a todas essas dúvidas, embora nutrisse o coração com minúsculas
gotas de fé e de esperança. “Percebes alguma coisa? E ele começando a ver,
disse: “Vejo as pessoas como se fossem árvores andando”. Que emoção! Que
contentamento! São pobres palavras para expressar o sentimento de felicidade
que perpassava pelo espírito radiante daquele homem. Ainda não estava vendo com
nitidez, mas já sentira a luz atravessar todo o seu globo ocular e deixar
aquela imagem, embora distorcida, gravada na sua retina. “Em seguida ele
colocou novamente as mãos sobre os olhos do cego que viu distintamente e ficou
restabelecido e podia ver tudo nitidamente e de longe”. São palavras e gestos que curam o corpo, a alma e o coração.
Tanto a cura da cegueira física quanto a
cura da cegueira que envolve o espírito se inserem dentro de um processo lento
e gradativo. A conversão não acontece num passe de mágica ou num estalar de
dedos. É um exercício constante, doloroso, é um exercício de poda. Jesus
poderia ter curado este cego de uma vez; mas o curou em duas etapas para nos
mostrar que devemos perseverar na fé e na esperança e acolher a Sua vontade em
nossa vida.
A cura de nossa cegueira virá quando
enxergarmos Jesus que vem até nós trazendo a Água Viva para lavar os nossos
olhos contaminados pela concupiscência da carne e se fazendo Eucaristia para
tocar em cada um de nós, fazendo brilhar a Sua luz.
Pai, abre meus olhos para que, pela fé,
eu reconheça Teu Filho, Jesus, e possa beneficiar-me da força libertadora que
d’Ele provém.
Padre Bantu Mendonça
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