29 de Novembro - Sábado - Evangelho - Lc 21,34-3
Lucas nos mergulha num dos discursos
escatológicos do Evangelho. Sendo assim, usa imagens e símbolos que não são da
nossa cultura e época, e por isso nem sempre são fáceis de serem compreendidos,
mesmo que fossem claros para os leitores daquele época. Mas na literatura
apocalíptica não é necessário interpretar cada imagem detalhadamente – o mais
importante não é cada pedra do mosaico, mas o padrão inteiro – não cada imagem
e símbolo, mas a sua mensagem. O texto
nos apresenta a figura do “Filho do Homem” – o título que nos Evangelhos Jesus
mais usava para si mesmo, e que nós quase nunca usamos. Este título vem dum
trecho do livro apocalíptico de Daniel: Em imagens noturnas, tive esta visão:
entre as nuvens do céu vinha alguém como um filho de homem… Foi-lhe dado poder,
glória e reino, e todos os povos, nações e línguas o serviram. O seu poder é um
poder eterno, que nunca lhe será tirado. E o seu reino é tal que jamais será
destruído.”(Dn 7,13s)
Então
Jesus recorda aos seus discípulos a mensagem de ânimo que o Livro de Daniel
trazia aos perseguidos do tempo dos Macabeus, pelo ano 175 a.C. – que embora
possa parecer que os poderes deste mundo, os impérios opressores, sejam mais
fortes do que o poder de Deus, isso não passa duma ilusão. Pois, na plenitude
dos tempos, Deus, através do seu messias – o Filho do Homem – revelará o seu
poder, e estabelecerá um Reino que jamais será destruído. E isso acontece agora
em Jesus!
Qualquer
interpretação de um texto apocalíptico que causa medo nos ouvintes, é
necessariamente errada, pois a função da apocalíptica é de animar e dar coragem
aos oprimidos e sofredores. Por isso, o ponto central do nosso texto de hoje é
uma mensagem de ânimo, coragem e fé: “Quando essas coisas começarem a
acontecer, levantem-se e ergam a cabeça, porque a libertação de vocês está
próxima.”
Este
trecho tem uma dimensão fortemente cristológica – nos afirma que Jesus, o Filho
do Homem vitorioso, está no controle de todas as forças, sejam elas do céu ou
do mar – símbolo de forças indomináveis para os judeus. E o versículo acima
citado traz uma mensagem cheia de confiança: em contraste com a atitude de
covardia dos malvados, os discípulos ficarão com a cabeça erguida, para acolher
o juiz justo, o Filho do Homem.
Mesmo
assim, os eleitos devem ficar atentos para não caírem. Devem cuidar muito para
que: “Os corações … não fiquem insensíveis por causa da gula, da embriaguez e
das preocupações da vida.” Pois é fácil assumir as atitudes do mundo, sem que
notemos, a não ser que sejamos vigilantes. Por isso, o texto de hoje termina
com um conselho válido também para os discípulos dos tempos modernos: “Fiquem
atentos e rezem todo o tempo, a fim de terem força”.
Quase
dois mil anos atrás, o precursor do Império de hoje, o Romano, tentou, aliado
com seus auxiliares locais, acabar com um projeto de vida, matando o seu
arauto, Jesus de Nazaré. A força parecia ter a última palavra. Mas a verdade
era outra – a força do Império era ilusão, pois Deus ressuscitou Jesus dentre
os mortos, mostrando que o mal nunca é mais forte do que o bem, a morte do que
a vida, a opressão do que a libertação.
Os dias
do Império estão contados, não somente o império político e econômico, mas o
dos barões do narcotráfico, da máfia e outros (todo Império tem pés de barro,
como ensina o Livro de Daniel e toda a literatura apocalíptica). O projeto de
Deus, concretizado em Jesus e continuado hoje por nós, vencerá o projeto dos
abutres do complexo industrial-militar e petrolífero, que só sugam o sangue dos
inocentes para que aumentem os seus lucros. A união das pessoas comuns vencerá
a dominação dos propagadores do terror – quando, animados pela sua fé, seja com
a expressão teológica que for, descobrirem a força da união, da solidariedade,
da não-violência que inspira uma luta decidida pela verdadeira paz.
Advento é
tempo oportuno para que examinemos a nossa vida para descobrir se realmente
estamos atentos o tempo todo, para não perdermos as manifestações da presença
de Jesus no meio de nós. É tempo de nos dedicarmos mais à oração, para
renovarmos as nossas forças, para não cairmos na armadilha da desatenção no
meio das preocupações e barulho do mundo moderno, para que os nossos corações
continuem “sensíveis” aos apelos do Senhor, através dos irmãos, no nosso
dia-a-dia.
A vinda
do Senhor, a sua última vinda, ou melhor, o último momento da vinda que Ele
inaugurou quando se fez homem e veio habitar no meio de nós, é, de novo,
proclamada nesta leitura. E com que solenidade! E com que exigência! Mas, no
fundo, será esse o momento supremo da nossa libertação, porque o Senhor, que
vem, vem como Salvador. O Advento é o tempo particularmente consagrado a viver
nesta expectativa.
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