DIA 18 SÁBADO -Mc 2,13-17
Para os fariseus, era absolutamente
escandaloso manter contatos com um pecador notório como Levi. Na época, um
cobrador de impostos não podia fazer parte da comunidade farisaica; não podia
ser juiz, nem prestar testemunho em tribunal, sendo, para efeitos judiciais,
equiparado a um escravo; estava também privado de certos direitos cívicos,
políticos e religiosos. Jesus vai demonstrar, àqueles que o criticam, que a
lógica dos fariseus (criadora de exclusão e de marginalidade) está em oposição
à lógica de Deus.
Os relatos evangélicos põem, com
freqüência, Jesus em contacto com gente reprovável, com aqueles apontados pela
sociedade como os cobradores de impostos e também com as mulheres de má vida. É
impossível que os discípulos tenham inventado isto, porque ninguém da
comunidade cristã primitiva estaria interessado em atribuir a Jesus um
comportamento “politicamente incorreto”, se isso não correspondesse à realidade
histórica. Não há dúvida de que Jesus “deu-se” com gente duvidosa, com pessoas
a quem os “justos” preferiam evitar, com pessoas que eram anatematizadas e
marginalizadas por causa dos seus comportamentos escandalosos, atentatórios da
moral pública.
Certamente não foram os discípulos a
inventar para Jesus o injurioso apelativo de “comilão e bêbedo, amigo de
publicanos e de pecadores” (Mt 11,19; 15,1-2).
Tendo já chamado os quatro primeiros
discípulos, Jesus agora encontra o coletor de impostos Levi. Por sua função,
ele era um marginalizado pela sociedade religiosa judaica. Jesus não se volta
para os marginalizados apenas para aliviá-los de seus sofrimentos e lhes
restituir a dignidade, Ele os inclui também na colaboração de seu ministério,
chamando alguns dentre eles como seus discípulos mais próximos. Sentando-se à
mesa com os amigos de Levi, também marginalizados, Jesus afirma seu propósito
de solidarizar-se com os excluídos e os pobres, causando escândalo entre os
chefes religiosos do judaísmo.
Na perspectiva deste texto, Jesus é o
amor de Deus que se faz pessoa e que vem ao encontro dos homens – de todos os
homens – para os libertar da sua miséria e para lhes apresentar essa realidade
de vida nova que é o projeto do “Reino”. A solicitude de Jesus para com os
pecadores mostra-lhes que Deus não os rejeita, mas os ama e convida-os a fazer
parte da sua família e a integrar a comunidade do “Reino”. É que o projeto de
salvação de Deus não é um condomínio fechado, com seguranças fardados para
evitar a entrada de indesejáveis; mas é uma proposta universal, onde todos os
homens e mulheres têm lugar, porque todos – maus e bons – são filhos queridos e
amados do Deus Pai. A lógica de Deus é sempre dominada pelo amor.
A “parábola da ovelha perdida” pretende,
precisamente, dar conta desta realidade. A atitude desproporcionada de “deixar
as noventa e nove ovelhas no deserto para ir ao encontro da que estava perdida”
sublinha a imensa preocupação de Deus por cada homem que se afasta da
comunidade da salvação e o “inqualificável” amor de Deus por todos os homens
que necessitam de libertação. O “pôr a ovelha aos ombros” significa o cuidado e
a solicitude de Deus, que trata com amor e com cuidados de Pai os filhos
feridos e magoados; a alegria desmesurada do “pastor” significa a felicidade
imensa de Deus sempre que o homem reentra no caminho da felicidade e da vida
plena.
Jesus anuncia, aqui, a salvação de Deus
oferecida aos pecadores, não porque estes se tornaram dignos dela mediante as
suas boas obras, mas porque o próprio Deus se solidariza com os excluídos e
marginalizados e lhes oferece a salvação. Encontramos aqui o cumprimento da
profecia de Ezequiel que nos foi apresentada na primeira leitura. Deus vai
assumir-se, através de Jesus, como o Bom Pastor que cuidará com amor de todas
as ovelhas e de forma especial das desencaminhadas e perdidas.
O que está em causa na leitura que nos é
proposta é a apresentação do imenso amor de Deus. Ele ama de forma desmesurada
cada mulher e cada homem. É esta a primeira coisa que nos deve “tocar” nesta
celebração. Deus é misericórdia. Interiorizamos suficientemente esta certeza,
deixamos que ela marque a nossa vida e condicione as nossas opções?
O amor de Deus dirige-se, de forma
especial, aos pequenos, aos marginalizados e necessitados de salvação. Os
pobres e débeis que encontramos nas ruas das nossas cidades ou à porta das
igrejas das nossas paróquias, encontram nos “profetas do amor” a solicitude
maternal e paternal de Deus? Apesar do imenso trabalho, do cansaço, do
“stress”, dos problemas que nos incomodam, somos capazes de “perder” tempo com
os pequenos, de ter disponibilidade para acolher e escutar, de “gastar” um
sorriso com esses excluídos, oprimidos, sofredores, que encontramos todos os
dias e para os quais temos a responsabilidade de tornar real o amor de Deus?
Tornar o amor de Deus uma realidade viva
no mundo significa lutar objetivamente contra tudo o que gera ódio, injustiça,
opressão, mentira, sofrimento. Inquieto-me, realmente, frente a tudo aquilo que
torna feio o mundo? Pactuo, com o meu silêncio, indiferença, cumplicidade com
os sistemas que geram injustiça, ou esforço-me ativamente por destruir tudo o
que é uma negação do amor de Deus?
As nossas comunidades são espaços de
acolhimento e de hospitalidade, são um oásis do amor de Deus, não só para
parentes e amigos, mas também para os pobres, os marginalizados, os sofredores
que buscam em nós um sinal de amor, de ternura e de esperança?
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