Segunda-feira
31 Maio 2021
Lectio
Primeira leitura: Tobite 1, 3; 2, 1b-9
Eu, Tobite, andei sempre pelos caminhos
da verdade e da justiça, durante todos os dias da minha vida, dando muitas
esmolas aos meus irmãos, os da minha nação que comigo tinham sido levados
cativos para a terra dos assírios, em Nínive. Pela festa do Pentecostes, que é
a nossa festa das Semanas, mandei preparar um bom almoço e reclinei-me para
comer. 2Mas, ao ver a mesa coberta com tantas comidas finas, disse a Tobias:
«Filho, vai procurar, entre os nossos irmãos cativos em Nínive, um pobre que
seja de coração fiel, e trá-lo para que participe da nossa refeição. Eu espero
por ti, meu filho.» 3Tobias saiu à procura de um pobre entre os nossos irmãos.
Ao regressar disse: «Pai.» Eu respondi: «Eis-me aqui, meu filho.» Tobias
continuou: «Pai, alguém da nossa linhagem está morto na praça pública, onde o
estrangularam.» 4Levantei-me, então, sem nada ter comido e levei o cadáver da
praça para um casebre, esperando o pôr do sol para o poder sepultar. 5A seguir,
voltei, lavei-me e almocei com tristeza, 6recordando-me das palavras do profeta
Amós, ditas sobre Betel: «As vossas festas converter-se-ão em luto e os vossos
cantos, em lamentações.» E eu chorei. 7Quando mais tarde o sol se pôs, saí,
cavei uma cova e sepultei-o. 8Os meus vizinhos, porém, zombavam de mim, dizendo:
«Ainda agora não tem medo. Já o procuraram para o matar por causa disso e teve
de fugir; contudo, ei-lo de novo a sepultar os mortos.»
O livro de Tobite não é histórico, mas
de carácter didáctico e para edificação dos fiéis. Trata-se de uma história
fictícia e parabólica, onde abundam passagens maravilhosas e exortações morais.
Tobite é apresentado como modelo do israelita piedoso que, apesar do cisma,
ocorre pontualmente ao templo de Jerusalém, paga os dízimos, vive uma vida
matrimonial exemplar, pratica a caridade e observa a pureza legal. O livro de
Tobite é uma pregação viva dos chamados três pilares do judaísmo: oração,
esmola e jejum.
O nome de Tobite significa literalmente "a minha bondade". Mas pode
tratar-se da abreviatura de uma frase em que o sujeito é Deus. Nesse caso,
poderá significar: "o Senhor é bom", ou "o Senhor é o meu
bem". De qualquer modo, mais do que de Tobite, o livro fala de Deus, que
não abandona os seus fiéis e que, se os põe à prova, é para lhes dar o prémio.
Tobite é um desses fiéis que, durante o exílio em Nínive, no tempo de
Salmanansar, não abandona "os caminhos da verdade e da justiça" (v.
1), mantém firme a sua identidade moral e religiosa, e continua a respeitar as
tradições dos pais.
O texto que hoje escutamos, refere um belo episódio, que ilustra a piedade de
Tobite. Quando, durante uma das solenidades de Israel, já se encontrava à mesa,
onde sempre havia lugar para alguns pobres, vêm dizer-lhe que um hebreu fora
estrangulado e que o seu cadáver jazia na praça da cidade. Tobite ergue-se
imediatamente, vai recolher o cadáver e dar-lhe condigna sepultura. Trata-se de
um gesto corajoso, pois já fora ameaçado de morte por causa de gestos
semelhantes. Os familiares criticam-no. Mas Tobite prefere obedecer a Deus que
ao rei. Cumprir a Lei de Deus é mais importante do que a própria vida.
Segunda leitura: Marcos 12, 1-12
Naquele tempo, 1Jesus começou a
falar-lhes em parábolas: «Um homem plantou uma vinha, cercou-a com uma sebe,
cavou nela um lagar e construiu uma torre. Depois, arrendou-a a uns vinhateiros
e partiu para longe. 2A seu tempo enviou aos vinhateiros um servo, para receber
deles parte do fruto da vinha. 3Eles, porém, prenderam-no, bateram-lhe e
mandaram-no embora de mãos vazias. 4Enviou-lhes, novamente, outro servo. Também
a este partiram a cabeça e cobriram de vexames. 5Enviou outro, e a este
mataram-no; mandou ainda muitos outros, e bateram nuns e mataram outros. 6Já só
lhe restava um filho muito amado. Enviou-o por último, pensando: 'Hão-de
respeitar o meu filho'. 7Mas aqueles vinhateiros disseram uns aos outros: 'Este
é o herdeiro. Vamos matá-lo e a herança será nossa'. 8Apoderaram-se dele,
mataram-no e lançaram-no fora da vinha. 9Que fará o dono da vinha? Regressará e
exterminará os vinhateiros e entregará a vinha a outros. 10Não lestes esta
passagem da Escritura:A pedra que os construtores rejeitaram tornou-se pedra
angular. 1Tudo isto é obra do Senhor e é admirável aos nossos olhos?» 12Eles
procuravam prendê-lo, mas temiam a multidão; tinham percebido bem que a parábola
era para eles. E deixando-o, retiraram-se.
A alegoria usada por Jesus só se percebe
se tivermos em conta o «cântico da vinha», que lemos em Is. 5, e o seu contexto
histórico, isto é, a recusa da salvação pelos chefes de Israel, os
«agricultores», que matam os profetas. Deus é o dono da vinha e o construtor do
edifício, que é Israel. Surpreendentemente, aparece como «estrangeiro» no meio
do povo de Israel. Deus não está vinculado às vicissitudes de um povo. Confiou
uma tarefa aos responsáveis pela vinha israelita e foi-se embora, porque está
noutro lado... Os servos são os numerosos profetas e homens de Deus enviados ao
longo da história do povo escolhido. O filho recusado e morto, mas depois
tornado pedra angular, é Jesus. A alegoria faz tocar os extremos: o amor de
Deus Pai, que envia o seu Filho, e a recusa do chefes de Israel, que O matam.
À volta de Jesus, e do mistério da sua morte e ressurreição, hoje, como no
passado, decide-se, para cada um de nós, o acolhimento ou a recusa da salvação.
Não há direitos de progenitura, ou de eleição preferencial, que nos valham. O
pretenso monopólio dos israelitas sobre a salvação está votado ao fracasso: «O
dono regressará e exterminará os vinhateiros e entregará a vinha a outros» (v.
9). O importante é que, no confronto com Jesus e com o seu mistério pascal, nos
abramos a Ele, livre e responsavelmente, para sermos salvos. E Deus premiará a
nossa coragem.
Meditatio
As leituras, que hoje escutamos,
apresentam-nos dois ícones de atitudes e comportamentos com que, também nós,
naturalmente nos confrontamos sempre que temos de tomar certas decisões:
Tobias, homem generoso e serviçal, que não teme expor-se aos maiores perigos
para ser fiel à Lei de Deus e às tradições do seu povo; os vinhateiros, homens
egoístas, que tudo querem para si, não olhando a meios para alcançar o que
pretendem, incluindo o homicídio.
Também nós, muitas vezes, somos chamados a fazer opções. Podemos deixar-nos
guiar por critérios idênticos aos dos vinhateiros, querendo apoderar-nos de
tudo para satisfazermos o nosso egoísmo. Mas convém deixar-nos orientar pelos
critérios de Tobite, homem de coração grande, sempre orientado para o bem. Ele
não faz caso do juízo dos hom
ens, e age com liberdade e rectidão. Não se sente feliz sozinho, e faz seu o
drama do povo. Não hesita perante os riscos que corre, e está disposto a pagar
pessoalmente pela sua fidelidade. Pratica com assiduidade o acolhimento, a
misericórdia e a benevolência pela dignidade dos seus irmãos. Escolhendo a
generosidade de Tobite, estamos na linha de Cristo, que veio para servir. A
parábola evangélica que escutamos evoca efectivamente a paixão de Jesus e a sua
ressurreição. Reflectindo sobre ela, descobrimos a atitude do Pai, que nos
ajuda a amar e a honrar o Filho: «O Pai ama o Filho», diz Jesus (Jo 3, 35; 5,
20). Na parábola, o amor do Pai é revelado por um adjectivo: «Já só lhe restava
um filho muito amado» (v. 6). Se amamos a Jesus, estamos na linha do Pai, e
correspondemos ao seu desejo manifestado nesta parábola: «Hão-de respeitar o
meu filho» (v. 6). Estas palavras revelam o amor do Pai e a intenção que tinha
ao enviar ao mundo o Filho muito amado: «Hão-de respeitar o meu filho».
Meditemos estas palavras. Rezemo-las. O Pai, nesta parábola, manifesta-se como
o primeiro reparador, se entendermos a reparação como amor a Jesus, como
correspondência ao seu amor. A Palavra de Deus faz-nos entrever o mistério de
Cristo como manifestação de uma reparação iniciada pelo próprio Pai. À extrema
humilhação de Jesus infligida pelos homens, o Pai responde com a glorificação
da Pedra que os construtores regeitaram: «A pedra que os construtores
rejeitaram transformou-se em pedra angular? Isto é obra do Senhor» (Mt 21, 42).
A primeira reparação é «obra do Senhor», de Deus Pai.
Depois da morte e da ressurreição de Jesus, o desejo do Pai - «Hão-de respeitar
o meu filho» - há-de ser levado muito a sério por cada um de nós, cristãos,
porque Jesus deu a vida por nós, tornando-se fundamento da nossa fé e do nosso
amor. Deixemo-nos, pois, guiar até Jesus pelo amor do Pai.
Uma das dimensões da reparação indicadas pelas nossas Constituições, na linha
da tradição espiritual que vem de S. Margarida Maria, é a correspondência ao
amor de Cristo: «Entendemos a reparação como resposta ao amor de Cristo por
nós» (Cst 23).
Oratio
Senhor Jesus Cristo, ao morreres na Cruz
por nosso amor, e ao seres ressuscitado pelo Pai, derramaste sobre a Humanidade
o Espírito Santo que renova todas as coisas e regenera o coração dos homens,
reparando neles os efeitos do pecado, e reunindo-os na comunidade de amor que é
a Igreja.
Dispõe-nos a acolher o mesmo Espírito, e a deixar-nos conduzir por Ele, para
correspondermos ao teu amor, e darmos Glória e Alegria ao Pai que Te enviou ao
mundo para nos salvar. Amen.
Contemplatio
O amor não pode desenvolver-se nos
corações egoístas e frios. A generosidade é a condição do amor verdadeiro.
Recordemo-nos das palavras de Nosso Senhor a Margarida Maria. Dizia-lhe:
«Participa nas amarguras do meu Coração, derrama lágrimas sobre a
insensibilidade destes corações que tinha escolhido para os consagrar ao meu
amor. Venho ao coração que te dei, para que pelo seu ardor tu repares as
injúrias que recebi destes corações tíbios e lassos que me desonram. Esta alma
que te dei, oferecê-la-ás a Deus meu Pai, para desviar as penas que estas almas
infiéis mereceram... Farás isso pelo meu povo escolhido». Consideremos como
dito a nós mesmos o que Nosso Senhor dizia ainda a Margarida Maria acerca do
apostolado do seu amor: «Quero que me sirvas de instrumento para atrair todos os
corações ao meu amor». Eis o ideal da nossa vida: reparar muito, muito, para
que isso baste pela nossa alma e por outras almas que Nosso Senhor quer salvar
por nosso meio; amar muito também para que o nosso amor nos dê influência sobre
o Coração de Jesus e para que inspire o nosso zelo no apostolado que temos para
fazer. (Pe. Dehon, OSP 3, p. 245s.).
Actio
Repete muitas vezes e vive hoje a
palavra:
«Hão-de respeitar o meu filho» (Mc 12, 6)
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