10 de Setembro -
Quarta - Evangelho - Lc 6,20-26
Bem-aventurados vós, pobres. Mas, ai de vós, ricos.
Neste Evangelho, Jesus proclama as bem-aventuranças, na versão de Lucas.
Primeiro ele “levantando os olhos para os seus discípulos”. Sinal que as
bem-aventuranças acontecem especialmente com os discípulos.
As bem-aventuranças são Evangelho, alegre notícia dirigida aos pobres de
Deus. Elas vêm confirmar a transformação social anunciada no magnificat.
De fato, os pobres são os preferidos de Deus em toda a revelação
bíblica, e são os primeiros destinatários da Boa Nova trazida por Jesus (Cf Lc
4,18-19).
Mt 5,1-12 traz oito bem-aventuranças. Lucas traz apenas quatro, mas
acrescenta quatro ameaças: “Ai de vós...” Essas ameaças esclarecem o sentido
das bem-aventuranças, tanto de Mateus como de Lucas. Porque muitos, ao explicar
esta passagem bíblica, dizem que a palavra “pobre”, para Jesus, significa
“desapegado”; e “rico” significa “ganancioso”. Na prática, isso é torcer a
Bíblia para que ela não me questione. Pobre aqui é pobre mesmo, e rico e rico
mesmo.
A felicidade messiânica dos pobres, dos famintos, dos que choram e dos
perseguidos por causa da fé cristã comprometida, contrapõe-se à situação
perigosa dos ricos, dos que têm fartura, dos que riem e dos que são aplaudidos
por todos.
As Bem-aventuranças são um caminho de felicidade diametralmente oposto
ao apresentado pelo mundo pecador. Os cristãos são felizes exatamente naquelas
situações que, segundo o mundo, trazem a infelicidade. Veja o contraste: para o
cristão, felizes os pobres; para o mundo, felizes os ricos. Para o cristão,
felizes os que agora choram; para o mundo, felizes os que agora riem... Por aí
vemos que dois milênios se passaram e a humanidade ainda não entendeu nem vive
o Evangelho de Jesus.
As Bem-aventuranças estão baseadas em duas grandes verdades: 1) A vida
cristã autêntica, devido à oposição do mundo pecador, leva à pobreza, à aflição
etc. 2) Deus assiste os seus filhos e filhas queridos, a ponto de inverter a
situação, transformando em felicidade o que seria infelicidade, em alegria o
que seria tristeza. Portanto, a felicidade dos cristãos não está nesses
tropeços (pobreza, perseguição...), mas na intervenção de Deus em favor dos
seus filhos queridos.
“Vede que grande presente de amor o Pai nos deu: sermos chamados filhos
de Deus! E nós o somos. Se o mundo não nos conhece, é porque não conheceu o
Pai” (1Jo 3,1-3).
(Irmãos), os que tiram proveito deste mundo, (vivam) como se não
aproveitassem. Pois a figura deste mundo passa” (1Cor 7,31).
Ao contrário dos dez mandamentos, as bem-aventuranças não são leis, nem
mandamentos, nem sequer conselhos. São simplesmente a constatação e a descrição
de um fato que acontece todos os dias em nossas Comunidades e em nossas
famílias. A vida cristã no meio do mundo pecador gera tristezas, que Deus, em
seu poder, transforma em alegrias.
Jesus não está também dizendo que ser pobre e ser odiado é bom. Nem que
esses tropeços da nossa vida são valores. Também não quis dizer que a
felicidade está em ser pobre, ser insultado etc. A felicidade está em ser filho
de Deus.
Portanto, não devemos procurar esses infortúnios (pobreza, ser odiado,
insultado...). O que devemos é ter paz em meio a todos esses contra tempos,
vendo neles um sinal de predileção de Deus e um sinal de que estamos no caminho
certo, no seguimento do Evangelho.
As Bem-aventuranças são uma realidade que vemos todos os dias estampada
no rosto das Comunidades cristãs. Os cristãos enfrentam as maiores
dificuldades, até o martírio e, em meio a tudo isso, trazem no rosto um sorriso
que ninguém consegue imitar, e que é identificado até numa fotografia.
S. Francisco de Assis, no final de sua vida, vivia angustiado com a
seguinte pergunta: “Será que Deus está contente comigo, com o que eu fiz?” Em
suas orações ele pedia todos os dias a Deus: “Senhor, dê-me um sinal, mostrando
se tudo o que eu fiz foi ou não do seu agrado!” De fato, o único desejo de
Francisco era agradar a Deus.
Numa noite, quando ele acordou, percebeu que estava com as chagas. Parou
a angústia, porque ele viu nas chagas um sinal de amor de Deus por ele,
unindo-o com o seu Filho amado, Jesus Cristo. E daí para frente Francisco ria
até às orelhas.
E foram cinco feridas dolorosas: uma em cada mão, uma em cada pé, e uma
no peito. Elas deram trabalho para Francisco. Ele tinha de fazer curativos e um
longo tratamento. Inclusive, elas limitaram um pouco as suas atividades.
Que paradoxo, não? Ver como presente de Deus e como sinal do seu amor,
cinco dolorosas feridas! Encontrar a felicidade em chagas! E isso que Deus fez
com Francisco, faz também conosco. Nós não procuramos a cruz, mas, quando ela
vem, justamente pelo fato de estarmos seguindo a Jesus, nós a vemos como um
presente de Deus. A festa de S. Francisco das Chagas é dia dezessete de
setembro. “Bem-aventurados vós que agora chorais, porque havereis de rir!”
Existe uma Bem-aventurança que não está, nem neste texto de Lucas nem no
capítulo quinto de Mateus. Ela está em Lc 1,45, foi dita por Isabel e se refere
à Mãe de Jesus: “Bem-aventurada aquela que acreditou, pois o que lhe foi dito
da parte do Senhor será cumprido”. Que Maria nos ensine a amar e viver as
Bem-aventuranças.
Bem-aventurados vós, pobres. Mas, ai de vós, ricos.
Padre Queiroz
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