04- Quarta
- Evangelho - Lc 14,25-33
Padre
Queiroz
Qualquer
um de vós, se não renunciar a tudo o que tem, não pode ser meu discípulo!
Neste
Evangelho, Jesus nos previne: “Qualquer um de vós, se não renunciar a tudo o
que tem, não pode ser meu discípulo!” E ele cita algumas coisas: se não
renunciar pai, mãe, esposa, marido, filhos, irmãos ou irmãs... e até a própria
vida, não pode ser discípulo dele.
É
um alerta que ele faz. “Rapadura é doce mas não é mole.” Ser discípulo ou
discípula de Jesus é bom, tem vantagens, mas não é fácil.
Jesus
começa citando os parentes, porque entre eles podemos encontrar alguém da turma
do “deixa disso”, e nós não podemos dar ouvidos, mesmo que seja pai, mãe,
esposa, marido...
E
há muitos outros obstáculos; por isso que Jesus resume com a expressão
“renunciar a tudo”.
E
há situações em que o cristão, movido pela fé e pela confiança em Deus, arrisca
a própria vida. Foi o caso dos mártires.
“Quem
não carrega a sua cruz e não caminha atrás de mim, não pode ser meu discípulo.”
Não caminhar na frente ou ao lado dele, mas atrás, isto é, seguir a Jesus sem
tentar mudar o seu Evangelho. As seitas são exatamente a busca de um caminho
mais fácil para seguir a Jesus.
As
duas parábolas são uma chamada de atenção a nós para a responsabilidade. Assim
como não é bom nem bonito começar uma coisa sem ter condições de terminar, o
mesmo acontece com a vida cristã, o seguimento de Jesus. Jesus nos deixou todos
os meios e recursos para levar até o fim esse caminho, mas se alguém não está
disposto nem a usar esses recursos, é preferível não começar a segui-lo. Fazer
como o jovem rico: virar as costas e ir embora.
O
exemplo da torre, que hoje seria um prédio muito alto e caro, seria uma enorme
imprudência começar a obra e pará-la no meio. O sol e a chuva vão estragar tudo
e o prejuízo será enorme. O certo, diz Jesus, é planejar bem os gastos antes,
para ter condições de terminar a obra. Do contrário, nem começar, porque assim
evita as caçoadas dos outros.
Outro
exemplo pior ainda é o da guerra. Se prevê que não vai vencer o inimigo, é mil
vezes melhor fazer um acordo com ele, estabelecendo as condições de paz. Porque
depois de uma guerra, a parte derrotada perde tudo mesmo, até o povo.
A
torre e a guerra são dois exemplos de empreendimento difíceis, que só devemos
começar se temos condições de terminar. Seguir a Jesus é outro empreendimento
difícil, e súper difícil.
Jesus
é uma pessoa franca e sincera. Ele abre o jogo para que não comecemos a
segui-lo e depois termos de parar, ou escolher um meio termo, o que ele
detesta. Ser cristão pela metade, além de imprudência, é uma coisa ridícula.
Nós
precisamos ser realistas. Para quem segue a Jesus, a cruz é inevitável. É bom
saber disso antes e contar com isso, porque a desistência no meio do caminho
vira um contra testemunho pior do que não começar.
Quanta
gente começa as coisas e não termina! Um curso, uma faculdade, o trabalho em
uma pastoral, o próprio casamento... Por outro lado, quantas pessoas começam e
perseveram!
"Meu
filho, come este rolo" (Ez 3,3) disse Deus ao Profeta Ezequiel. Era o
livro da Palavra de Deus. O profeta comeu e depois comentou: Na boca, era doce
como o mel, mas, quando chegou ao meu estômago, tornou-se amargo como o fel.
Boa figura da vida cristã.
Havia,
certa vez, um menino que tinha uma cicatriz no rosto e, na escola, as pessoas
não falavam com ele nem se sentavam ao seu lado. Na realidade, quando os
colegas o viam franziam a testa devido a cicatriz ser muito feia. Então seus
colegas de classe começaram a reclamar com a professora, pedindo que aquele
menino da cicatriz não freqüentasse mais o colégio. A professora levou o caso à
diretora. Esta ouviu e chegou à seguinte conclusão: Que não poderia tirar o
garoto do colégio, e que conversasse com o menino e ele fosse seria o último a
entrar em sala de aula, o primeiro a sair, e fosse sentar-se na última carteira
da classe. Desta forma, nenhum aluno via o seu rosto, a não ser que olhassem
para trás.
A
professora levou ao conhecimento do menino a decisão e ele aceitou prontamente.
Mas pediu se podia explicar para os colegas a origem da cicatriz. A professora
permitiu e ele disse o seguinte:
“Quando
eu tinha por volta de sete a oito anos de idade, um dia pegou fogo na minha
casa. Estávamos eu, meu irmão mais novo, minha irmãzinha de berço e minha mãe.
Eu, minha mãe e meu irmão conseguimos sair. Minha mãe queria entrar para pegar
o nenê, mas os vizinhos a seguraram e não deixaram, porque o fogo já havia
tomado conta de toda a casa. Foi nessa hora que eu saí entre as pessoas e,
quando perceberam, eu já tinha entrado na casa. Havia muita fumaça e estava
muito quente. Eu fui ao quarto, peguei minha irmãzinha que estava chorando e
saí com ela nos braços. Na saída, caiu no meu rosto uma madeira em brasas que
me queimou, de onde surgiu esta cicatriz. Hoje, quando chego em casa, a
primeira pessoa que vem me receber é minha irmã. E ela dá um beijo nesta
cicatriz, que a salvou.”
A
turma ouviu quieta, atenta e envergonhada. Quando o garoto terminou de falar,
toda a classe estava chorando.
O
mundo está cheio de pessoas com cicatrizes, físicas ou não, visíveis ou não.
Mas o amor fraterno é central no seguimento de Jesus. Se alguém não topa, como
queriam aqueles alunos, é melhor nem ser batizado. Ou, se foi, é melhor não
renovar, na primeira comunhão e na crisma. Ou, se já fez tudo isso, é melhor
largar a Comunidade duma vez.
Maria
Santíssima foi atrás de Jesus, como sua discípula fiel. Ela não foi frente nem
ao lado, isto é, não quis facilitar um pouquinho o Evangelho do Filho. Pelo
contrário, colaborou com ele, por exemplo, na cruz e, após a subida dele ao
céu, ela permaneceu junto com a Igreja nascente. “Ó Mãe da perseverança, teus
volve a nós!”
Qualquer
um de vós, se não renunciar a tudo o que tem, não pode ser meu discípulo!
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