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quinta-feira, 19 de novembro de 2015

Comentários Prof.Fernando

Comentários Prof.Fernando*   
último domingo do ano (litúrgico 2014/15) : J.Cristo, Rei
(Último antes do Advento de 15/2016) : 22 de novembro de 2015

- ao povo de Mariana e das cidades banhadas pelo rio que era Doce , versos do Salmo 92/93:
elevam os rios a sua voz
- porém mais poderoso que a voz das águas
 é o Senhor nas alturas do céu

Reis, rainhas e impérios
·                    Ao menos em nosso mundo Ocidental em que vivemos, o governo das nações não se exerce mais pela monarquia (permanecendo num ou noutro país como figura da tradição, sem poder efetivo). O imaginário social, no entanto, conserva o simbolismo de reis e rainhas dando a nome famosos o título “real”: rei do rock, rainha do baile, rei Pelé, rei Roberto Carlos, ou dando nome comercial a produto ou loja: rei do bachalhau, da picanha, da empada, rei dos pneus, etc.
·                    O domingo de Cristo Rei é celebrado habitualmente no último domingo antes de começar o Advento (ciclo de 4 domingos preparatórios para o Natal, iniciando novo calendário litúrgico anual). Assim o fazem as Igrejas: Luterana, Metodista , Presbiteriana e Católica romana. Nesta, a inserção no calendário foi determinada pelo Papa Pio XI em 1925.

Cristo Rei
·                    Para ler aquele documento escrito há 110 anos atrás (11/12/1925), a carta encíclica  “Quas primas” – sobre Cristo Rei” é preciso entender a linguagem da época, própria de uma Igreja Católica em tom triunfalista. Ressoava num contexto histórico 40 anos antes do Concílio “Vaticano2” que sacudiu a Igreja católica nos anos 60 do século passado. Seu idealizador: o homem simples que entrou para a história com o nome de “João23”. Há 100 anos ainda mais longe estávamos dos atuais esforços da reforma proposta por outro João 23. De nome Francisco.
·                    No documento referido escutamos certamente os ecos de uma Europa que acabava de sair Primeira grande guerra. A violência terrível da chamada 1ª.guerra Mundial enterrou definitivamente as ilusões da belle époque e o sonho que embalava o Ocidente no século 19: o da paz garantida pelo progresso das ciências, da indústria e da técnica. Mas a era da técnica não trouxe a paz. E a Igreja de Roma ainda tinha dificuldades para compreender a Modernidade que não combinava com monarquias, absolutismos e com a própria hegemonia eclesiástica no mundo. O documento ainda pensa em termos de uma “cristandade” onde a fé cristã podia moldar a sociedade: Com dar à autoridade dos príncipes e chefes de governo certo caráter sagrado, a dignidade real de Nosso Senhor enobrece com isto mesmo os deveres e a sujeição dos cidadãos. E chega a ser ingênuo imaginando que todas as pessoas e sociedades reconhecessem o domínio universal de Cristo: Oh! que ventura não pudéramos gozar, se os indivíduos, se as famílias, se a sociedade se deixasse reger por Cristo! "Então, finalmente – para citarmos as palavras que, há 25 anos, Nosso Predecessor Leão XIII dirigia aos Bispos do mundo inteiro – então fora possível sanar tantas feridas; o direito recobrara seu antigo viço, seu prestígio de outras eras; então tornaria a paz com todos os seus encantos e cairiam das mãos armas e espadas, quando todos de bom grado aceitassem o império de Cristo, lhe obedecessem, e toda língua proclamasse que "Nosso Senhor Jesus Cristo está na glória de Deus Padre" (Enc. Annum Sacrum).

Os Poderes
·                    A ideia tradicional de um “Rei” ou de Impérios leva-nos à experiência humana do poder. Desde a antiguidade a realeza era justificada como uma espécie de prolongação da autoridade divina no mundo. E todos nós corremos sempre o risco de polarizar a vida a partir do poder. Ele pode depender da força e da violência, ou das riquezas que podem comprar que se julga capaz de      comprar tudo (e hoje os votos na sociedade democrática). O poder dos costumes e da tradição sempre existiu nas comunidades humanas. Na vida atual surgem, além dos 3 poderes na democracia (executivo, legislativo e judiciário) o 4º poder dos meios de comunicação de massa. Hitler soube usar o poder da propaganda para construir sua máquina infernal de morte. Mas há os pequenos, mas fortes poderes no quotidiano: o dos costumes e tradições na cultura, o das religiões, o do medo diante do desconhecido e até do novo. Mais recentemente tomamos consciência da importância do conhecimento, da educação e da informação e então dizemos que detém o poder quem tem as informações.
·                    A trama que constitui as sociedades contemporâneas lançou-nos na complexidade da política e da economia, e a sobrevivência de pessoas e grupos está submetida inevitavelmente a poderes tão diversos como a tecnologia, o governo e seu impostos, a imprensa e suas notícias, etc. Os poderes na sociedade podem ser produtores de bens, saúde e vida, como podem ser responsáveis por novas escravidões e promotores da morte. L.Sakamoto, doutor em ciência política e jornalista leva-nos a ver que tanto o terror em Paris como a lama em Mariana têm em comum o fato de ser um crime contra a Humanidade.
·                    Fatos recentes nos questionam sobre o poder do terrorismo com sua carnificina que têm a repercussão “extraordinária” pela morte inesperada e de centenas em grandes capitais como Nova York (Torres Gêmeas, Pentágono), Madri (Metrô), Paris (bares e teatro lotado). Mas outros atos terroristas têm já uma repercussão “ordinária”, pois são “habituais”, como: o deslocamento de milhões de refugiados e migrantes; as guerras, ditaduras, bombas e sequestros em muitos países: Síria, Iêmen, Palestina, Israel, Lìbano (e vários na África); o povo yazíde, curdo e outras minorias lutam para sobreviver sob a expansão do grupo “DAESH” (sigla do nome árabe para o auto-intitulado “Estado Islâmico” que, de “islâmico”, não têm nada; na França a imprensa passou a evitar esta palavra e usa DAESH para não reforçar o preconceito que leva a identificar terrorismo e religião islâmica). A rotina quase elimina em nós a Compaixão – marca do humano em nós. Ela tende a desaparecer ao vermos diariamente uma imensa marcha de refugiados e migrantes em deslocamento. Outros poderes também tornam-se banais para nós, como tiroteios nas favelas e periferias e assaltos com morte nas esquinas dos centros urbanos. Enquanto para os mais pobres – como se não bastassem desemprego e inflação – surge a microcefalia, muitos fariseus lá no planalto central, discutem a partilha do império.

Raízes do Poder
·                    Todo poder (como dominação) traz a satisfação do agir sem obstáculos. Embora o grupo DAESH tente justificar suas ações escudando-se no Alcorão são os próprios muçulmanos que o temem, começam a rever apoios e o declaram fora do verdadeiro Islam e seus ramos históricos (sunitas e xiitas com suas subdivisões, como o Wahabismo saudita ou os Alauítas sírios); O DAESH é uma peça do xadrez regional, onde jogam as grandes potências regionais e mundiais.
·                    Mais intrigante, porém, é a adesão de centenas de jovens (de origem árabe ou ocidental) à ideologia terrorista. Mesmo que muitos sejam fanáticos adeptos de certas interpretações religiosas, o que a maioria encontra nas armas é a satisfação do Poder. Crianças ou adultos gostam de torcer pelos mocinhos em faroeste, “jogos vorazes”, agente OO7 ou “guerra nas estrelas”. É um modo de exorcizar o medo dos inimigos. Os Games trouxeram para a ponta dos dedos inimigos, guerras e mortes e muitos jovens encontram certamente um real prazer na dominação (real) sobre vida ou morte de outros, quando forem equipados com fuzis reais e bombas reais.
·                    Em qualquer grupo social, ou Dinheiro ou Prestígio abrem caminho para realizar toda sorte de desejos. Dinheiro dá poder (de compra) e Prestígio facilita a Corrupção. O pobre se define pela impotência e o anônimo sempre imagina os famosos abrindo todas as portas da felicidade. Todo ser humano arrisca ficar reduzido a seu lado (negativo) de pulsão de morte, que mora dentro dele ao lado do (positivo) que leva ao bem e ao amor. É inegável que esta “pulsão de morte” é perigosa como a lama das represas frágeis de Minas Gerais. E pode tornar-se incontrolável em sua força desmedida, (assemelha-se à hýbris na Grécia antiga). A 1ª.carta de João (2,16) a chama de “concupiscência” da “carne” (= em sentido negativo, ausência do “jeito” divino de ser) e dos “olhos” (= cobiça como criança que quer tudo o que vê, sem critérios). Esta “epithymía” (“desejo” descontrolado) acompanha a “soberba” da vida, ou arrogância. Entregues à “concupiscência” e à “arrogância” vivem os inimigos do “Reino”. O Mestre dava o nome aos bois: fariseus, líderes e intelectuais da época, como em Marcos 12,38: Guardai-vos dos escribas, pois eles gostam das saudações na rua, das primeiras cadeiras nas sinagogas, e primeiros assentos nos banquetes.

A estátua do Corcovado e o Cristo Rei
·                    O Cristo Redentor, símbolo mundialmente conhecido, abre os braços como num desejo de abraço universal. Talvez essa estátua nos ajude a perceber o Cristo (ou o Deus de cada um segundo suas crenças e religião) não como uma Príncipe feudal alimentando-se e vivendo às custas do que produzem seus vassalos. Esta pode ser uma imagem primitiva e rude do “Todo-poderoso”, mas seria ridículo imaginá-lo como exigindo sacrifícios ou divertindo-se com suas criaturas – histórias divertidas da mitologia grega. A fonte da vida e do universo, porém, não devora os filhos como o deus Crónos/Saturno da mitologia. Vem oferecer Vida e eternidade.
·                    Jesus, diante do representante (Pilatos) do maior poder do maior império de seu tempo (talvez de todos os tempos) aceita o título de rei, explicando que vem dar testemunho da Verdade. O texto lido hoje (cap. 1 Apocalipse) lembra que ele é rei universal, e sua autoridade está muito além dos poderosos deste mundo – “autoridade maior, acima dos reis da terra”. Nos versos 5 e 6 ele é “testemunha confiável” (o único que pode falar de Deus para nós). Aquele “que nos ama” pode livrar-nos de tantos micropoderes sujos e pérfidos, na medida em que agirmos como ele agiu. Porque “ele fez para nós um Reino”. Ele nos constituiu “sacerdotes” (simbolicamente, não para uma função religiosa, pois é o único Sacerdote entre o Pai e os seres humanos) no sentido de com-sagrados a Deus e Pai. Ele “nos desatou das amarras de nossos pecados (o termo “hamartía” significa os desacertos, isto é – lieralmente – desvios da direção certa e boa).
·                    No próximo domingo começa o “Advento”, 4 semanas de preparação do Natal, tempo de meditação sobre esse Rei que vem até nós sem o poder desejado, seja por terroristas, seja por políticos hipócritas – uns e outros se julgam melhores do que o resto do mundo. O grande mistério ainda está por vir no próximo ciclo de meditações: o Rei do universo chega junto de nós como frágil e mortal criancinha. O “Filho do Homem” (ver leitura de Daniel 7) é filho de Maria.

[Textos hoje: Daniel 7 especialmente 13-14; Apocalipse 1,4-8; João 18,33-37]

ooooooooooo ( * ) Prof. (Edu/Teo/Fil, 1975-2012) fesomor2@gmail.com

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