Comentários Prof.Fernando*
SEGUNDO Dom.de PREPARAÇÃO para o NATAL 6 – 12 – 2015/
1. Uma voz no deserto de lama
·
Cataclismos funcionam às vezes como purgativos. O de Mariana,
somado ao turbilhão de horrores que presenciamos diuturnamente no Brasil e no
mundo, soam para mim como anúncios de uma calamidade maior (a lama do Rio Doce
é simbólica). O silêncio que sucede aos desastres, quem sabe, nos fará ouvir.
Ouvir o quê? A resposta, ou ao menos a pergunta pelo sentido da vida. Não vejo
sinais para otimismo, a não ser o que a fé oferece quando convoca a esperança
no auxílio divino. Em meio a tanta treva, aguardo um renascimento na política,
na igreja – como no tempo de São Francisco – de quem ele foi o grande arauto.
·
A reflexão é de Adélia Prado
(cf.entrevista, Segundo Caderno, O Globo, 28.11.15), poeta que faz 80 anos dia
13 de dezembro. Não poderia haver melhor comentário ao o tema de hoje (cf.
evangelho de Lucas 3,1-6): veio a palavra do Senhor no deserto a João, filho de
Zacarias. Ele percorria toda a região do Jordão, pregando o batismo de
arrependimento para remissão dos pecados, como está escrito no livro das
palavras do profeta Isaías: Uma voz clama no deserto: “Preparai o caminho do
Senhor, endireitai as suas veredas. Todo vale será aterrado, e todo monte e
outeiro serão arrasados; tornar-se-á direito o que estiver torto, e os caminhos
escabrosos serão aplainados. Todo homem verá a salvação de Deus”.
2.
Onde e quando João
anunciava a Palavra
·
Lucas situa detalhes do contexto
histórico em que aparece João, o Batista. Diferentemente de uma narrativa
mítica o autor precisa (estamos no no ano 28 de nossa era): “no
ano décimo quinto do reinado do imperador Tibério, sendo Pôncio Pilatos
governador da Judéia, Herodes tetrarca da Galiléia, seu irmão Filipe tetrarca
da Ituréia e da província de Traconites, e Lisânias tetrarca da Abilina, sendo
sumos sacerdotes Anás e Caifás”. Lucas começa mostrando o contraste da
Palavra de Deus (que se manifesta pela voz de João) com as autoridades que hoje
chamaríamos de “civis, militares e religiosas” da época. O evangelho de Lucas
indicará que o “o movimento profundo da história não se desenvolve no plano das
aparências da história oficial. É Jesus quem realiza o destino do mundo, dando
à história o verdadeiro sentido” (J.Konings).
3.
Onde e quando nós vivemos
·
O profeta Baruc está na primeira leitura
(liturgia romana). O LCR- Lecionário Comum Revisado consta a leitura de Malaquias
3,1-4, dado que, na tradição das Igrejas protestantes o livro de Baruc não faz
parte dos livros considerados inspirados (são chamados “apócrifos” – ou
“deuterocanônicos” na terminologia católica – por pertencerem à bíblia “grega”
e não figura na bíblia hebraica). O trecho refere-se à restauração de Israel
após o tempo do exílio: Em verdade, é o
próprio Deus quem conduz Israel, pleno de júbilo no esplendor de sua majestade,
pela sua justiça, pela sua misericórdia! A fé proclama que Deus é o senhor
da História. A segunda leitura, tirada da carta aos filipenses (1,4-11) retoma
a exortação de domingo passado quanto ao crescimento e aperfeiçoamento na fé. Advento é tempo de conversão e
renovação.
·
Não vivemos no século 5 a.C. (embora Brasília hoje se
pareça muito com Babilônia...). Não vivemos na colônia romana de Filipos por
volta do ano 50 d.C. Mas é aqui e agora que devemos nos preparar no silêncio e
na conversão, como sugere Adélia Prado. Não vivemos no império romano, ano 28
d.C. Mas, se vivemos sob este ou aquele governante, sendo presidentes da Câmara
e do Senado, este e aquele, saibamos que seu poder é passageiro: eles não
construirão a nossa história. Devemos cuidar de nossa própria conversão e
renovação. Ouçamos novamente Adélia Prado: Agora somos chamados a um recolhimento, a
um silêncio que nos permita ouvir atentamente, encontrar e admitir nossa culpa.
Há necessidade de oração, conversão, volta evangélica para a vida interior,
para valores esquecidos, desaparecendo sob lama, sangue e cinza. (...) Não sei
o que fazer. Só uma certeza me acode: devo começar em meu coração, dentro da
minha casa, a radical mudança para o amor, o perdão, a tolerância, para a
atenção real para o meu próximo, o que, segundo Jesus, resume a lei e os
profetas.
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