3 de Dezembro- Quarta - Evangelho - Mt 15,29-37
De fato, a compaixão realiza uma proximidade
solidária. Tanto quanto mostra a reciprocidade que põe face a face aquele que
oferece e aquele que recebe compaixão. Pois embora a situação de carência os
distinga, a humanidade que partilham é a mesma. Diversamente do caso de Deus,
que age com a distinção da graça: sendo Ele divino, se compadece da humanidade
realmente, sem renunciar à sua divindade, aproximando-se de nós por gratuita
benevolência. Fato extremo e contraditório humanamente falando, dessa divina
compaixão que se dá na Encarnação, Paixão e Ressurreição do Verbo, Jesus de
Nazaré. A piedade divina assume a miséria humana historicamente, para elevar a
humanidade à comunhão com Deus. Assim, a divina compaixão se mostra claramente
no mistério da piedade de Deus que nos devolveu a liberdade e a dignidade de
filhos de Deus.
O Novo
Testamento usa geralmente a palavra piedade, compaixão ou benevolência nos
remetendo a seguinte idéia: a piedade é o clamor que a humanidade eleva a Deus,
como entoamos na liturgia judaica e cristã.: Senhor tende piedade de nós.
Nas
relações fraternas, a compaixão move o sujeito ao próximo carente e miserável,
abrindo as portas da solidariedade. Tal comportamento diferencia o homem justo
do injusto. De fato, a piedade está mais ligada à justiça, do que ao sentimento
de pena ou dó. Se o Direito tarda em socorrer os aflitos, a compaixão nos leva
solicitamente até eles, favorecendo obras de misericórdia. Assim, a compaixão
adianta-se à Lei e garante que o bem seja feito, a começar dos mais carentes.
Compaixão, piedade e justiça caminham juntas.
Em Mc
6,30-44, cena da primeira multiplicação dos pães, a compaixão de Jesus é
retratada em cores fortes e dinâmicas. Tudo começa com sua sensibilidade: mais
que mestre, ele é o amigo atento às necessidades dos discípulos. Percebe-os
cansados e esgotados. Então os convida a irem, com Ele, a um lugar deserto, na
outra margem do lago, para repousar. Aqui, o deserto, a outra margem das águas
e o repouso – oferecido pelo Cristo – nos remete ao tempo que Jesus virá
restaurar a humanidade inteira e os congregará junto de Deus Seu Pai, em
paralelo com Mt 11,28: Vinde a mim todos os que estais cansados sob o peso do vosso fardo
e vos darei descanso. Jesus é
novo Moisés que, qual pastor, guia o povo no deserto, atravessa as águas e os
leva a repousar (cf. Sl 95,7-11).
Esta
sensibilidade diante do cansaço dos discípulos sinaliza a compaixão de Jesus,
presente em seu coração. Em seguida, Ele literalmente se comove, quando a
multidão de pobres e enfermos o alcança, chegando às margens de Tiberíades
antes dele e dos discípulos: Assim que Ele desembarcou, viu uma grande multidão e ficou tomado
de compaixão por eles, pois estavam como ovelhas sem pastor. E começou a
ensinar-lhes muitas coisas.
O olhar: Jesus vê a multidão e suas entranhas
se comovem. O olhar ativa a segunda esfera da compaixão em Jesus, que agracia o
povo com sua palavra salvadora: “E começou a ensinar-lhes muitas coisas”.
Contudo, o
ensino não basta. A noite vem e o povo faminto inspira cuidados. Jesus
questiona os discípulos, organiza o povo em grupos, toma pães e peixes, bendiz
a Deus, dá início à partilha e sacia a multidão. Eis a terceira esfera da
compaixão: a dádiva do alimento. Com isto, o lugar deserto se torna grama
verde: a mudança no cenário mostra Jesus como o pastor que conduz o rebanho às
verdes pastagens, onde comem e descansam (cf. Sl 23,2; Jo 10,3). Onde há
compaixão, há partilha; e onde a partilha acontece, a vida se renova, como
relva que germina em pleno deserto!
O olhar
favorece a compaixão e seus frutos, como a benevolência, o perdão e a cura.
Precisamos educar o olhar para sermos compassivos. O evangelho nos ensina isto
e mostra o contraste entre Jesus que vê a multidão e a compreende, e os
discípulos, que têm os olhos vendados pelo legalismo econômico. Ele manda que
sejam eles a dar de comer ao povo, a ter compaixão e a partilhar, porque eram
incapaz de vê-la realmente.
Eis aqui o
apelo do evangelho a todos nós, cristãos e cristãs: pousamos sobre as pessoas
um olhar de compaixão? Não por acaso, o evangelista João insiste que olhemos
para o Cristo transpassado, imagem da humanidade ferida de dor, violência,
miséria e opressão: “Olharão
para aquele que transpassaram (Jo 19,37).
Pai, a acolhida que teu Filho Jesus me
dispensa deve mudar profundamente o meu coração. Que eu seja transformado por
Ele e me torne mais disponível para Ti e seja cada vez mais misericordioso para
com os meus irmãos e irmãs.
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