Homilia do D.
Henrique Soares da Costa – XXVI Domingo do Tempo Comum – Ano B
Nm 11,25-29
Sl 18
Tg 5,1-6
Mc 9,38-43.45.47-48
Hoje, a Palavra de Deus apresenta alguns elementos
importantes que nos precisam ser continuamente recordados. Tanto a primeira
leitura quanto o Evangelho, recordam-nos que Deus não é propriedade de ninguém.
Ante o zelo mesquinho de João, Jesus afirma:
“Quem não é contra nós é a nosso favor”. É preciso
compreender bem a afirmação do Senhor. Certamente, ele é o Caminho e a Verdade
da humanidade; certamente ele fundou a Igreja, comunidade de seus discípulos;
dotou essa Igreja do seu Espírito, de pastores e de toda uma estrutura visível.
Esta Igreja de Cristo, nós cremos que permanece de modo pleno na Igreja
católica. Isto significa que os elementos essenciais da Igreja de Cristo
permanecem, por graça e fidelidade do Senhor, naquela Comunidade que ele fundou
desde o início, a Igreja una, santa, católica e apostólica. Quais são esses
elementos essenciais? A Palavra de Deus, pregada e interpretada segundo a
Tradição apostólica, a Eucaristia como banquete e sacrifício, os sete
sacramentos, o ministério de Pedro, presente nos seus sucessores, os Papas de
Roma, o ministério episcopal, no qual se concretiza a sucessão apostólica, a
caridade fraterna, os vários dons e carismas da comunidade, o sentido da missão
de anunciar Jesus ao mundo como Senhor e Salvador, o martírio como testemunho
máximo de Cristo, a presença materna da Virgem Maria e dos Santos, amigos de
Cristo. A Igreja católica é, portanto, Igreja de Cristo, pertence a Cristo e,
por graça de Cristo, conserva e conservará sempre, sem poder perder, estes
elementos. Mas, isso não significa que a Igreja seja proprietária de Cristo.
Aqui é preciso dizer claramente: a Igreja pertence a Cristo, mas Cristo não é
propriedade da Igreja! De fato, na força do seu Espírito Santo, ele manifesta
sua ação também fora da estrutura visível da Igreja católica. Pensemos nos
nossos irmãos separados, de tradição protestante. Eles têm tantos elementos da
Igreja de Cristo: a Palavra de Deus, a confissão de Jesus como Senhor e
Salvador, tantos dons e carismas, o amor sincero a Jesus, a caridade fraterna,
o ela missionário. Tudo isso deve ser, para nós, católicos, causa de alegria.
Ainda que não estejam em comunhão plena com a Igreja de Cristo e falte-lhe
elementos essenciais da Igreja de Cristo, eles não estão fora do caminho da
salvação! Hoje, Jesus nos convida à tolerância e ao amor a esses irmãos.
Isto não significa de modo algum dizer que está
tudo bem, que tanto faz ser católico como não ser, que o importante é a fé em
Jesus e pronto. Não! É preciso recordar que a divisão na Igreja é um pecado
grave e contraria o desejo de unidade que o Senhor deixou como testamento:
“Pai, não rogo somente por eles, mas pelos que, por meio de sua palavra, crerão
em mim: a fim de que sejam um. Como tu, Pai, estás em mim e eu em ti, que eles
estejam em nós, para que o mundo creia que tu me enviaste” (Jo 17,20s). É
também absolutamente falso afirmar que as questões de doutrina não são
importantes. O Novo Testamento está repleto de advertências contra os que
ensinam doutrinas erradas e contrárias à fé dos apóstolos e são Paulo mesmo
exorta a separar da Comunidade quem pregar um evangelho diferente do dele (cf.
Gl 1,6-9). A busca de recompor a unidade visível da Igreja em torno de Cristo,
com os mesmos pastores, os mesmos sacramentos e a mesma doutrina é dever de
todos os cristãos! Mas, também é necessário deixar claro o dever que todos nós
temos da tolerância respeitosa e amorosa para com os irmãos separados. Se nos
entristece ouvi-los falar mal da Igreja – às vezes até caluniando-a e mentindo
contra ela -, deve alegrar-nos ouvi-los falar bem de Cristo e pregar o
Evangelho. Ainda mais: até para com os não-cristãos, como os espíritas,
muçulmanos, budistas, adeptos da seicho-no-iê… temos o dever do respeito e da
tolerância. Deles, o Senhor afirma no evangelho de hoje: “Quem vos der a beber
um copo da água, porque sois de Cristo, não ficará sem receber a sua
recompensa”. Então, que fique bem claro o dever da tolerância que nós,
discípulos de Cristo, temos para com os demais.
Mas, a Palavra de Deus também fala hoje de
radicalidade. Tolerância para com os outros; radicalidade para conosco, no
nosso ser cristãos! Vejamos: (1) Radicalidade no respeito pela debilidade dos
pequeninos e fracos na fé: “Se alguém escandalizar um destes pequeninos que
crêem, melhor seria que fosse jogado no mar com uma pedra de moinho amarrada ao
pescoço”. Deus nos livre de escandalizar, Deus nos livre de, por nossas
atitudes, ser causa de tropeço para os irmãos mais fracos na fé! (2)
Radicalidade para cortar o que em nós é escândalo, isto é, o que em nós leva ao
pecado e ao afastamento de Cristo: “Se tua mão te leva a pecar, corta-a… Se teu
pé te leva a pecar, corta-o… Se teu olho te leva a pecar, arranca-o!” Hoje, a
tendência é arrancar o Evangelho para não termos que arrancar nada em nós, para
não termos que nos incomodar nem mudar de vida! Jesus é claro: não entrará na
vida quem sinceramente não combater aquilo que o faz tropeçar no caminho
cristão. (3) Finalmente, a radicalidade de apoiar-se somente no Senhor e não
nas nossas posses espirituais e materiais: espiritualmente, nunca pensar que
somos proprietários do Senhor e da salvação e, materialmente, recordar que
nossas riquezas apodrecem e nosso outro enferruja. São Tiago nos adverte
duramente na segunda leitura de hoje: triste de quem é rico para si,
desprezando os outros, mas não é rico para Deus!
Que o Senhor, pela sua graça, nos dê toda
tolerância e toda intolerância. Toda tolerância com os irmãos e toda
intolerância com o nosso pecado e as nossas manhas,! Que o Senhor nos converta,
ele que é bendito para sempre. Amém.
D. Henrique
Soares da Costa
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