6 Agosto 2017
Ano A
Tema do 18º Domingo do Tempo Comum
A liturgia do 18º Domingo do Tempo Comum
apresenta-nos o convite que Deus nos faz para nos sentarmos à mesa que Ele
próprio preparou, e onde nos oferece gratuitamente o alimento que sacia a nossa
fome de vida, de felicidade, de eternidade.
Na primeira leitura, Deus convida o seu Povo a deixar a terra da escravidão e a
dirigir-se ao encontro da terra da liberdade – a Jerusalém nova da justiça, do
amor e da paz. Aí, Deus saciará definitivamente a fome do seu Povo e
oferecer-lhe-á gratuitamente a vida em abundância, a felicidade sem fim.
O Evangelho apresenta-nos Jesus, o novo Moisés, cuja missão é realizar a
libertação do seu Povo. No contexto de uma refeição, Jesus mostra aos seus
discípulos que é preciso acolher o pão que Deus oferece e reparti-lo com todos
os homens. É dessa forma que os membros da comunidade do Reino fugirão da
escravidão do egoísmo e alcançarão a liberdade do amor.
A segunda leitura é um hino ao amor de Deus pelos homens. É esse amor – do qual
nenhum poder hostil nos pode afastar – que explica porque é que Deus enviou ao
mundo o seu próprio Filho, a fim de nos convidar para o banquete da vida
eterna.
LEITURA I – Is 55,1-3
Leitura do Livro de Isaías
Eis o que diz o Senhor:
“Todos vós que tendes sede, vinde à nascente das águas.
Vós que não tendes dinheiro, vinde, comprai e comei.
Vinde e comprai, sem dinheiro e sem despesa, vinho e leite.
Porque gastais o vosso dinheiro naquilo que não alimenta
e o vosso trabalho naquilo que não sacia?
Prestai-Me atenção e vinde a Mim;
escutai e a vossa alma viverá.
Firmarei convosco uma aliança eterna,
com as graças prometidas a David.
AMBIENTE
Em 597 a.C., no reinado de Joaquin, os
babilónios derrotaram os exércitos de Judá, conquistaram Jerusalém e deportaram
para a Babilónia uma primeira leva de exilados, escolhidos de entre a classe
dirigente de Judá. No entanto, esse primeiro grupo de exilados acreditava que o
Exílio não estava para durar e que rapidamente poderiam regressar à sua terra. O
profeta Jeremias, no entanto, desfez essas falsas esperanças, anunciando aos
exilados que o desterro iria prolongar-se e convidando-os a refazer a sua vida
na Babilónia (“edificai casas e habitai-as; plantai pomares e comei os seus
frutos. Casai, gerai filhos e filhas, casai os vossos filhos e filhas, para que
tenham filhos e filhas. Multiplicai-vos, em vez de diminuir. Procurai o bem do
país para onde vos exilei e rogai por ele ao Senhor, porque só tereis a lucrar
com a sua prosperidade” – Jer 29,5-7). Aos poucos, estes exilados acabaram por
se adaptar à situação e por lançar as bases para uma permanência prolongada na
Babilónia.
Em 586 a.C. deu-se uma nova catástrofe para o Povo de Deus: Jerusalém foi de
novo conquistada pelos babilónios e completamente arrasada… Os que tinham
escapado à primeira deportação foram levados cativos para a Babilónia e
juntaram-se aos seus irmãos exilados.
Os tempos do Exílio foram tempos de desolação e de sofrimento… Todas as
referências tinham caído; Jerusalém, a cidade santa, estava reduzida a um
montão de ruínas; à frustração pela humilhação nacional, juntavam-se as dúvidas
religiosas: Jahwéh será o Deus libertador, como anunciava a teologia e a
catequese de Israel – ou será um “bluff”, incapaz de proteger o seu Povo? Para alguns
dos exilados já nada importava, pois o quadro de referência que dava segurança
ao Povo tinha sido completamente subvertido. Enquanto que alguns continuavam a
sonhar com a libertação e o regresso, muitos outros deixaram de sonhar e
lançaram as bases materiais para se enraizarem definitivamente na Babilónia.
O Exílio prolongou-se até 539 a.C., quando Ciro, rei dos Persas, tomou a
Babilónia e deu aos exilados a possibilidade de retornarem à sua terra de
origem.
É no contexto do Exílio que aparece o Deutero-Isaías, um profeta anónimo cuja
mensagem nos é oferecida nos capítulos 40-55 do Livro de Isaías. O profeta
esforça-se por “consolar” os exilados, anunciando-lhes a libertação iminente, o
regresso à Terra (cf. Is 40-48) e a reconstrução de Jerusalém (cf. Is 49-55).
O texto que nos é proposto como primeira leitura apresenta-nos as últimas
palavras do “livro da consolação”. Depois de um oráculo que anuncia a
restauração de Jerusalém (cf. Is 54,11-17), o Deutero-Isaías procura dar aos
exilados razões para regressarem à cidade santa.
MENSAGEM
O profeta convida os exilados a cumprirem um
novo êxodo, deixando a terra da escravidão e dirigindo-se ao encontro da terra
da liberdade – a Jerusalém nova que Deus vai reconstruir para o seu Povo. Aí,
Judá redescobrirá o Deus libertador, que derrama sobre o seu Povo – gratuita e
abundantemente – a justiça, a prosperidade, a abundância, a paz sem fim. O
profeta representa esse quadro de salvação através da imagem de um “banquete”:
em Jerusalém, à volta da mesa de Deus, esse Povo sofredor, desolado, carente,
faminto, encontrará trigo, “vinho”, “leite” e “manjares suculentos” (vers. 1).
Será fácil, depois de mais de quarenta anos de Exílio, deixar a relativa
segurança da Babilónia, enfrentar uma terra devastada e começar tudo de novo? É
claro que não. Muitos exilados, correspondendo às palavras do profeta Jeremias
(cf. Jer 29), construíram as suas casas, refizeram as suas vidas, lançaram as
suas raízes no solo babilónico e consolidaram existências tranquilas e cómodas.
A referência ao gastar “o dinheiro naquilo que não alimenta” e “o trabalho
naquilo que não sacia” parece dizer respeito ao facto de muitos exilados
pretenderem continuar na Babilónia, em lugar de arriscarem o regresso a uma
terra desolada e, aparentemente, sem futuro (vers. 2).
O profeta adverte: é preciso ter a coragem de arriscar, de se desinstalar, de
partir ao encontro do sonho. Àqueles que forem capazes de sair dos seus
esquemas para abrirem o coração ao seu dom, Deus vai oferecer, de forma
gratuita e incondicional, a vida em abundância, a felicidade infinita.
Mais: a esses que estão dispostos a deixar as suas certezas e seguranças para
partir ao encontro do seu chamamento, Deus oferecerá uma aliança eterna (vers.
3), que nada nem ninguém poderão romper.
Quem aceitar esse dom que Deus oferece encontrará aí a água que mata a sua sede
de vida e o alimento que sacia a sua fome de felicidade. Viverá uma relação
nova com Deus e integrará, em definitivo, a comunidade do Povo de Deus.
ACTUALIZAÇÃO
Considerar, na reflexão, os seguintes pontos:
• Antes de mais, a leitura que nos é proposta
revela o “coração” de Deus: o seu amor, o seu cuidado, a sua preocupação com a
situação de um Povo atolado na miséria, no sofrimento, na desolação. Deus não
fica, nunca, indiferente à sorte dos seus filhos; mas está continuamente atento
às suas necessidades, à sua fome de vida, à sua sede de felicidade. Os crentes
podem estar seguros de que, à mesa desse banquete onde Deus os reúne, encontram
o alimento que os sacia, a mão que os apoia, a palavra que lhes dá ânimo, o
coração que os ama. A reflexão deste texto convida-nos, antes de mais, a
descobrir este Deus providente, amoroso e dedicado e a colocar toda a nossa
existência nas suas mãos. A reflexão deste texto convida-nos também a sermos
testemunhas deste Deus no meio dos nossos irmãos: os pobres, os famintos, os
desesperados têm de encontrar nos nossos gestos e palavras esse “coração”
amoroso de Deus que os apoia, que lhes dá esperança, que os ajuda a recuperar a
dignidade e o gosto pela vida, que lhes mata a fome e a sede de justiça, de
fraternidade, de amor e de paz.
• Se é verdade que Deus não cessa de nos
oferecer a salvação, também é verdade que nós, os homens, nem sempre acolhemos
a oferta que Deus nos faz. Muitas vezes escolhemos caminhos de egoísmo e de
auto-suficiência, à margem do “banquete” de Deus. Na leitura que nos foi
proposta, há um apelo a não gastar o dinheiro naquilo que não alimenta e o
trabalho naquilo que não sacia. Corresponde a um convite a não nos deixarmos
seduzir por falsas miragens de felicidade (os bens materiais, a ilusão do
poder, os aplausos e a consideração dos outros homens) e a não gastarmos a vida
a beber em fontes que não matam a nossa sede de vida plena e verdadeira. Como é
que eu me situo face a isto? De que é que eu sinto “fome”? Como é que eu
procuro saciá-la? Eu também sou dos que gastam o tempo, as forças e as
oportunidades a correr atrás de ilusões, de valores efémeros, de miragens?
Quais são as verdadeiras fontes de vida em que eu devo apostar de forma
incondicional?
• Para acolher os dons que Deus oferece, é
preciso desinstalar-se, abandonar os esquemas de comodismo e de preguiça que
impedem que no coração haja lugar para a novidade de Deus e para os desafios
que ele lança. Estou disponível para deixar cair os meus preconceitos,
seguranças, esquemas organizados, egoísmos, e para me deixar questionar por
Deus e pelas suas propostas?
SALMO RESPONSORIAL – Salmo 144 (145)
Refrão: Abris, Senhor, as vossas mãos e saciais
a nossa fome.
O Senhor é clemente e compassivo,
paciente e cheio de bondade.
O Senhor é bom para com todos
e a sua misericórdia se estende a todas as criaturas.
Todos têm os olhos postos em Vós
e a seu tempo lhes dais o alimento.
Abris as vossas mãos
e todos saciais generosamente.
O Senhor é justo em todos os seus caminhos
e perfeito em todas as suas obras.
O Senhor está perto de quantos O invocam,
de quantos O invocam em verdade.
LEITURA II – Rom 8,35.37-39
Irmãos:
Quem poderá separar-nos do amor de Cristo?
A tribulação, a angústia, a perseguição,
a fome, a nudez, o perigo ou a espada?
Mas em tudo isto somos vencedores,
graças Àquele que nos amou.
Na verdade, eu estou certo de que nem a morte nem a vida,
nem os Anjos nem os Principados,
nem o presente nem o futuro,
nem as Potestades nem a altura nem a profundidade
nem qualquer outra criatura
poderá separar-nos do amor de Deus,
que se manifestou em Cristo Jesus, Nosso Senhor.
AMBIENTE
O texto que nos é hoje proposto como segunda
leitura conclui a reflexão de Paulo sobre a questão da salvação.
Há já alguns domingos que temos vindo a acompanhar o desenvolvimento das ideias
de Paulo sobre esta questão: toda a humanidade vive mergulhada numa realidade
de pecado (cf. Rom 1,18-3,20); mas a bondade de Deus oferece a todos os homens,
de forma gratuita e incondicional, a salvação (cf. 3,21-4,25). Essa salvação
chega ao homem através de Jesus Cristo (cf. Rom 5,1-7,25). O Espírito Santo é
que dá ao homem a força para acolher esse dom (cf. Rom 8,1-39), para renunciar
à vida do egoísmo e do pecado (a vida “segundo a carne”) e para ascender a uma
nova situação – a situação de “filho de Deus” (vida “segundo o Espírito”).
Acolher a salvação que Deus oferece, identificar-se com Jesus e percorrer com
Ele o caminho do amor a Deus e da entrega aos irmãos (vida “segundo o
Espírito”) não é, no entanto, um caminho fácil, de triunfos e de êxitos
humanos; mas é um caminho que é preciso percorrer, tantas vezes na dor, no
sofrimento e na renúncia, enfrentando as forças da morte, da opressão, do
egoísmo e da injustiça.
Apesar das barreiras que é necessário vencer, das nuvens ameaçadoras e dos mil
desafios que, dia a dia, se põem ao crente que segue o caminho de Jesus, o
cristão pode e deve confiar no êxito final. Porquê?
É a esta questão que Paulo procura responder nestes versículos que nos são hoje
propostos.
MENSAGEM
“Se Deus é por nós, quem será contra nós”? –
pergunta Paulo no início da perícopa (Rom 8,31). A verdade é que nada pode
derrotar aquele que é objecto do amor imenso e imortal de Deus – amor
manifestado nesse movimento que levou Cristo até à entrega total da vida para
nos colocar na rota da salvação e da vida plena.
O crente tem de estar certo de que Deus o ama e que lhe reserva a vida em
plenitude, a felicidade total, a comunhão plena com Ele. Dessa forma, pode
escolher, com tranquilidade e serenidade o caminho de Jesus – caminho de dom,
de entrega da vida, de amor até às últimas consequências… Pode, como Jesus,
lutar objectivamente contra o egoísmo, a injustiça, a opressão, o pecado; pode
gastar a vida nessa luta, sem temer o aniquilamento ou o fracasso; pode
enfrentar a perseguição, a angústia, os perigos, as armadilhas montadas pelos
homens, com a certeza de que nada o pode vencer ou destruir… E, no final do
caminho, espera-o essa vida plena de felicidade sem fim, que Deus oferece
àqueles que aceitam a sua proposta de amor e caminham nela.
Nos dois últimos versículos do texto que nos é proposto (vers. 38-39), Paulo
enumera uma série de forças que, na época, se julgavam mais ou menos hostis ao
homem. Não devemos, contudo, tomar essas expressões como uma descrição
detalhada daquilo que, para Paulo, era o mundo sobrenatural. Devemos ver nessa
lista, apenas uma forma retórica de sugerir que nada – nem sequer esses poderes
que os antigos acreditavam que hostilizavam o homem – será capaz de separar o
crist&a
tilde;o do amor de Deus, manifestado em Jesus Cristo.
ACTUALIZAÇÃO
A reflexão da leitura pode fazer-se a partir das
seguintes linhas:
• Para Paulo, há uma constatação incrível, que
não cessa de o espantar (e que temos repetidamente encontrado nos textos da
Carta aos Romanos lidos nos últimos domingos): Deus ama-nos com um amor
profundo, total, radical, que nada nem ninguém consegue apagar ou eliminar.
Esse amor veio ao nosso encontro em Jesus Cristo, atingiu a nossa existência e
transformou-a, capacitando-nos para caminharmos ao encontro da vida eterna.
Ora, antes de mais, é esta descoberta que Paulo nos convida a fazer… Nos
momentos de crise, de desilusão, de perseguição, de orfandade, quando parece
que o mundo está todo contra nós e que não entende a nossa luta e o nosso
compromisso, a Palavra de Deus grita: “não tenhais medo; Deus ama-vos”.
• Descobrir esse amor dá-nos a coragem necessária
para enfrentar a vida com serenidade, com tranquilidade e com o coração cheio
de paz. O crente é aquele homem ou mulher que não tem medo de nada porque está
consciente de que Deus o ama e que lhe oferece, aconteça o que acontecer, a
vida em plenitude. Pode, portanto, entregar a sua vida como dom, correr riscos
na luta pela paz e pela justiça, enfrentar os poderes da opressão e da morte,
porque confia no Deus que o ama e que o salva.
ALELUIA – Mt 4,4b
Aleluia. Aleluia.
Nem só de pão vive o homem,
mas de toda a palavra que sai da boca de Deus.
EVANGELHO – Mt 14,13-21
Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo
São Mateus
Naquele tempo,
quando Jesus ouviu dizer que João Baptista tinha sido morto,
retirou-Se num barco para um local deserto e afastado.
Mas logo que as multidões o souberam,
deixando as suas cidades, seguiram-n’O a pé.
Ao desembarcar, Jesus viu uma grande multidão
e, cheio de compaixão, curou os seus doentes.
Ao cair da tarde, os discípulos aproximaram-se de Jesus
e disseram-Lhe:
“Este local é deserto e a hora avançada.
Manda embora toda esta gente,
para que vá às aldeias comprar alimento”.
Mas Jesus respondeu-lhes:
“Não precisam de se ir embora; dai-lhes vós de comer”.
Disseram-Lhe eles:
“Não temos aqui senão cinco pães e dois peixes”.
Disse Jesus: “Trazei-mos cá”.
Ordenou então à multidão que se sentasse na relva.
Tomou os cinco pães e os dois peixes,
ergueu os olhos ao Céu e recitou a bênção.
Depois partiu os pães e deu-os aos discípulos
e os discípulos deram-nos à multidão.
Todos comeram e ficaram saciados.
E, dos pedaços que sobraram, encheram doze cestos.
Ora, os que comeram eram cerca de cinco mil homens,
sem contar mulheres e crianças.
AMBIENTE
No capítulo 13 do Evangelho segundo Mateus,
começa uma longa secção que poderíamos intitular “instrução sobre o Reino” (cf.
Mt 13,1-17,27).
Na primeira parte desta secção (cf. Mt 13,1-52), Jesus apresentou em parábolas
a realidade do Reino (como vimos, aliás, nos domingos anteriores). Como é que
os interlocutores de Jesus reagiram, frente a essa apresentação viva, popular,
interpeladora, questionante? Aderiram à proposta de Jesus?
A resposta a esta questão vai ser dada na segunda secção da “instrução sobre o
Reino” (cf. Mt 13,53-17,27). De uma forma geral, a comunidade judaica responde
negativamente ao desafio apresentado por Jesus. Quer os nazarenos (cf. Mt
13,53-58), quer Herodes (cf. Mt 14,1-12), quer os escribas, quer os fariseus,
quer os saduceus (cf. Mt 15,1-9; 16,1-4. 5-12) recusam embarcar na aventura do
Reino. Diante dessa recusa, Jesus volta-Se, cada vez mais decisivamente, para o
pequeno grupo dos seus seguidores – os discípulos. Esse pequeno grupo vai-se
definindo cada vez mais como a comunidade do Messias, que acolhe as propostas
de Jesus e aceita o Reino. As multidões continuam a seguir Jesus; mas, cada vez
mais, é aos discípulos que Jesus Se dirige e a quem destina a sua “instrução”.
O texto que nos é proposto neste domingo situa-nos no âmbito de uma refeição. O
“banquete” é, para os semitas, o momento do encontro, da fraternidade, em que
os convivas estabelecem entre si laços de familiaridade e de comunhão. É,
portanto, símbolo desse mundo novo que há-de vir e no qual todos os homens se
sentarão à mesa de Deus para celebrar a fraternidade, a igualdade e a
felicidade sem fim. Torna-se, pois, um símbolo privilegiado desse Reino para o
qual Jesus veio convidar os homens.
MENSAGEM
Na introdução ao episódio de hoje, Mateus anota
que Jesus se retirou para o deserto, seguido por uma “grande multidão”; e que,
impressionado pela fome de vida de toda essa gente, Se encheu “de compaixão e
curou os seus doentes” (vers. 13-14).
Provavelmente, Mateus quer sugerir, com esta referência, que Jesus é um novo
Moisés, cuja missão é libertar o seu Povo da escravidão, a fim de conduzi-lo à
terra da liberdade e da vida plena. Como é que vai fazê-lo? Conduzindo-o ao
deserto…
O deserto é, para Israel, o tempo e o espaço do encontro com Deus; aí, Israel
aprendeu a despir-se das suas seguranças humanas, das suas certezas, da sua
auto-suficiência, para descobrir que cada passo em direcção à liberdade, cada
pedaço de pão caído do céu, cada gota de água que brota de um rochedo, é um
“milagre” que é preciso agradecer ao amor de Deus. Tudo é um dom de Deus, que o
Povo deve acolher com o coração agradecido. O deserto é ainda o lugar e o tempo
da partilha, da igualdade, em que cada membro do Povo conta com a solidariedade
do resto da comunidade, onde não há egoísmo, injustiça, prepotência,
açambarcamento dos bens que pertencem a todos, e em que todos dão as mãos para
superar as dificuldades da caminhada (no deserto, quem é egoísta,
auto-suficiente e não aceita contar com os outros, está condenado à morte).
É esta experiência que Jesus vai convidar os discípulos a fazer. Vai
ensinar-lhes – com uma lição concreta – que tudo é um dom que deve ser
agradecido ao amor de Deus; e vai ensinar-lhes também que os dons de Deus são
para ser partilhados, colocados ao serviço dos irmãos. É deste processo
libertador – que conduz do egoísmo ao amor – que vai nascer a comunidade do
Reino.
A história da multiplicação dos pães apresenta todas as características de uma
lição, destinada a demonstrar como é que deve viver quem quer aderir ao Reino.
O primeiro momento desse processo pedagógico destinado a formar os membros do
Reino tem a ver com a constatação da fome do mundo e com a responsabilização da
comunidade do Reino nesse problema&hell
ip; Quando os discípulos Lhe pedem que mande a multidão embora, para que ela
encontre comida (lavando as mãos face à situação de necessidade em que a
multidão está), Jesus pede-lhes: “dai-lhes vós de comer” (vers. 16).
Ensina-lhes, dessa forma, que têm uma responsabilidade inalienável face a esse
desafio que o mundo dos pobres todos os dias grita… Depois disto, nunca um
discípulo de Jesus poderá dizer que não tem nada a ver com a fome, com a
miséria, com as necessidades dos mais desfavorecidos. Qualquer irmão
necessitado – de pão, de alegria, de apoio, de esperança – é da
responsabilidade dos discípulos de Jesus. A dinâmica do Reino passa pela
solidariedade que torna todos os cristãos responsáveis pelas necessidades dos
pobres.
No segundo momento deste processo pedagógico, Jesus ensina como dar resposta a
este desafio. Começa por pedir aos discípulos que façam a listagem dos bens
disponíveis; depois, toma os “cinco pães e dois peixes”, recita a bênção e
manda repartir por todos os presentes… E todos comeram até ficarem saciados.
A lição é clara: diante do apelo dos pobres, a comunidade do Reino tem de
aprender a partilhar. “Cinco pães e dois peixes” significam totalidade
(“sete”): é na partilha da totalidade do que se tem que se responde à carência
dos irmãos. É uma totalidade fraccionada e diversificada mas que, posta ao
serviço dos irmãos, sacia a fome do mundo. A comunidade do Reino é, portanto,
não só uma comunidade que se sente responsável pela fome dos irmãos, mas também
uma comunidade de coração aberto, disposta a repartir tudo o que tem… É uma
comunidade que venceu a escravidão do egoísmo, para fazer a experiência da
partilha que sacia e que torna todos os homens irmãos.
No terceiro momento deste processo pedagógico, Jesus dá a razão para a
partilha. “Tomou os cinco pães e os dois peixes, ergueu os olhos ao céu e
recitou a bênção” (vers. 19). A “bênção” é uma fórmula de acção de graças, na
qual se agradece a Deus pelos seus dons. Isso significa, em concreto,
reconhecer que algo que se possui é um dom recebido de Deus… Para quem? Para um
único homem ou para uma única família? Mas Deus não é o Pai de todos, que se
preocupa com todos e que a todos ama da mesma forma? Portanto, “pronunciar a
bênção” é reconhecer que determinado dom veio de Deus e que pertence a todos os
filhos de Deus. Aquele que recebeu esse dom não é o seu dono; mas é apenas um
administrador a quem Deus confiou determinado dom, para que o pusesse ao
serviço dos irmãos com a mesma gratuidade com que o recebeu. À comunidade do
Reino é proposto que aprenda a considerar os bens postos à sua disposição como
dons de Deus Pai, colocando-os livremente ao serviço de todos.
Jesus é aqui apresentado como o novo Moisés, cuja missão é realizar a
libertação do seu Povo e oferecer-lhe a vida em abundância. Como é que Ele o
faz? Criando a comunidade do Reino – isto é, uma comunidade de homens novos,
que reconhecem que tudo o que têm é um dom de Deus, destinado a ser partilhado
com os outros irmãos.
ACTULIZAÇÃO
Na reflexão, ter em conta os seguintes aspectos:
• Antes de mais, o texto convida-nos a reflectir
sobre a preocupação de Deus em oferecer a todos os homens a vida em abundância.
Ele convida todos os homens para o “banquete” do Reino… Aos desclassificados e
proscritos que vivem à margem da vida e da história, aos que têm fome de amor e
de justiça, aos que vivem atolados no desespero, aos que têm permanentemente os
olhos toldados por lágrimas de tristeza, aos que o mundo condena e marginaliza,
aos que não têm pão na mesa nem paz no coração, Deus diz: “quero oferecer-te
essa plenitude de vida que os homens teus irmãos te negam. Tu também estás
convidado para a mesa do Reino”.
• A nossa responsabilidade de seguidores de
Jesus compromete-nos com a “fome” do mundo. Nenhum cristão pode dizer que não
tem culpa pelo facto de 80 por cento da humanidade ser obrigada a viver com 20
por cento dos recursos disponíveis… Nenhum cristão pode “lavar as mãos” quando
se gastam em armas e extravagâncias recursos que deviam estar ao serviço da
saúde, da educação, da habitação, da construção de redes de saneamento básico…
Nenhum cristão pode dormir tranquilo quando tantos homens e mulheres, depois de
uma vida de trabalho, recebem pensões miseráveis que mal dão para pagar os
medicamentos, enquanto se gastam quantias exorbitantes em obras de fachada que
só servem para satisfazer o ego dos donos do mundo… Nós temos responsabilidades
na forma como o mundo se constrói… Que podemos fazer para que o nosso mundo
seja alicerçado sobre outros valores?
• É preciso criarmos a consciência de que os
bens criados por Deus pertencem a todos os homens e não a um grupo restrito de
privilegiados. O Vaticano II afirma: “Deus destinou a terra com tudo o que ela
contém para uso de todos os povos; de modo que os bens criados devem chegar
equitativamente às mãos de todos (…). Sejam quais forem as formas de
propriedade, conforme as legítimas instituições dos povos e segundo as
diferentes e mutáveis circunstâncias, deve-se sempre atender a este destino
universal dos bens. Por esta razão, quem usa desses bens temporais, não deve
considerar as coisas exteriores que legitimamente possui só como próprias, mas
também como comuns, no sentido de que possam beneficiar não só a si, mas também
os outros. De resto, todos têm o direito de ter uma parte de bens suficientes
para si e suas famílias” (Gaudium et Spes, 69). Como me situo face aos bens?
Vejo os bens que Deus me concedeu como “meus, muito meus e só meus”, ou como
dons que Deus depositou nas minhas mãos para eu administrar e partilhar, mas
que pertencem a todos os homens?
• O problema da fome no mundo não se resolve
recorrendo a programas de assistência social, de “rendimento mínimo garantido”
ou de outros esquemas de “caridadezinha”; mas resolve-se recorrendo a uma
verdadeira revolução das mentalidades, que leve os homens a interiorizar a
lógica de partilha. Os bens que Deus colocou à disposição dos seus filhos não
podem ser açambarcados por alguns; pertencem a todos os homens e devem ser
postos ao serviço de todos. É preciso quebrar a lógica do capitalismo, a lógica
egoísta do lucro (mesmo quando ela reparte alguns trocos pelos miseráveis para
aliviar a consciência dos exploradores), e substitui-la pela lógica do dom, da
partilha, do amor. Sem isto, nenhuma mudança social criará, de verdade, um
mundo mais justo e mais fraterno.
• A narração que hoje nos é proposta tem um
inegável contexto eucarístico (as palavras “ergueu os olhos ao céu e recitou a
bênção, partiu os pães e deu-os aos discípulos” levam-nos à fórmula que usamos
sempre que celebrámos a Eucaristia). Na verdade, sentar-se à mesa com Jesus e
receber o pão que Ele oferece (Eucaristia) é comprometer-se com a dinâmica do
Reino e é assumir a lógica da partilha, do amor, do serviço. Celebrar a
Eucaristia obriga-nos a lutar contra as desigualdades, os sistemas de
exploração, os esquemas de açambarcamento dos bens, os esbanjamentos, a procura
de bens supérfluos… Quando celebramos a Eucaristia e nos comprometemos com uma
lógica de partilha e de dom, estamos a tornar Jesus presente no mundo e a fazer
com que o Reino seja uma realidade viva na história dos homens.
ALGUMAS SUGESTÕES PRÁTICAS PARA O 18º DOMINGO DO
TEMPO COMUM
(adaptadas de “Signes d’aujourd’hui”)
1. A PALAVRA MEDITADA AO LONGO DA SEMANA.
Ao longo dos dias da semana anterior ao 18º Domingo do Tempo Comum, procurar
meditar a Palavra de Deus deste domingo. Meditá-la pessoalmente, uma leitura em
cada dia, por exemplo… Escolher um dia da semana para a meditação comunitária
da Palavra: num grupo da paróquia, num grupo de padres, num grupo de movimentos
eclesiais, numa comunidade religiosa… Aproveitar, sobretudo, a semana para
viver em pleno a Palavra de Deus.
2. “VINDE, ESCUTAI, COMEI”.
Estes três apelos da leitura de Isaías marcam os três primeiros tempos da
celebração de qualquer domingo: reunião da assembleia, liturgia da Palavra,
liturgia eucarística (o último é o envio). Para a proclamação do texto de
Isaías, procure-se valorizar os imperativos: “Vinde… escutai-Me… prestai
atenção… vinde a Mim”, procurando o tom que convém à aliança que Deus quer
concluir com o seu povo. É uma questão de atitude interior! Para pôr em realce
o convite, o texto poderia ser proclamado por dois leitores, alternando os
apelos contidos na leitura.
3. DAR AMPLITUDE AO RITO DA FRACÇÃO.
Na homilia, o sacerdote poderia destacar o relato evangélico que descreve os
gestos de Jesus aquando da multiplicação dos pães como gestos litúrgicos, os
mesmos que são empregues no coração da Eucaristia: “ergueu os olhos ao Céu e
recitou a bênção. Depois partiu os pães e deu-os aos discípulos e os discípulos
deram-nos à multidão”. Procurar ligar esta passagem ao momento da fracção do
pão ou da comunhão. É conveniente hoje dar amplitude ao rito da fracção do pão.
4. ORAÇÃO NA LECTIO DIVINA.
Na meditação da Palavra de Deus (lectio divina), pode-se prolongar o
acolhimento das leituras com a oração.
No final da primeira leitura:
Nós Te damos graças por todas as refeições que ofereceste ao teu Povo, para
saciar a sua fome e para anunciar o banquete da Nova Aliança.
Nós Te pedimos por todos os famintos da nossa terra e por todas as formas de
pobreza: os mendigos de pão, de atenção, de ternura, de justiça e de paz.
Dá-nos a coragem de lhes deixar mais do que as migalhas.
No final da segunda leitura:
Pai Nosso, nós Te bendizemos pelo amor de Cristo, que manifestaste nas missões
do apóstolo Paulo e do qual nada nos pode separar: Tu comunicas o amor de
Cristo em cada Eucaristia, ao ponto de nos unires a Ti.
Nós Te pedimos por todos os nossos irmãos e irmãs desencorajados, ameaçados
pelo desânimo, a angústia, a perseguição, a fome, os perigos.
No final do Evangelho:
Erguemos os olhos para Ti e damos-Te graças pela infinita ternura do teu Filho
Jesus. Nós Te bendizemos pelo pão de vida que nos ofereces.
Nós Te pedimos pelos teus discípulos, encarregados de distribuir o pão
produzido pelos nossos pobres meios; que a bênção cumule as nossas refeições
com a graça do teu Espírito Santo.
5. ORAÇÃO EUCARÍSTICA.
Pode-se escolher a Oração Eucarística III das Assembleias com Crianças, que faz
alusão à obra de misericórdia de Cristo.
6. PALAVRA PARA O CAMINHO.
Ousemos! Quantas sedes e fomes estão em nós e entre nós, para as quais gastamos
sem contar o nosso dinheiro e as nossas forças, sem nunca ficarmos saciados!
Ousemos… “ir a Ele… e levemos-Lhe…” com toda a confiança o pouco que temos,
seguros de que só Ele nos pode satisfazer para além de qualquer desejo.
UNIDOS PELA PALAVRA DE DEUS
PROPOSTA PARA
ESCUTAR, PARTILHAR, VIVER E ANUNCIAR A PALAVRA NAS COMUNIDADES DEHONIANAS
Grupo Dinamizador:
P. Joaquim Garrido, P. Manuel Barbosa, P. José Ornelas Carvalho
Província Portuguesa dos Sacerdotes do Coração de Jesus (Dehonianos)
Rua Cidade de Tete, 10 – 1800-129 LISBOA – Portugal
Tel. 218540900 – Fax: 218540909
portugal@dehonianos.org – www.dehonianos.org