20 de Março- Segunda - Lc 2,41-51a
A narrativa de Jesus entre os doutores encerra o chamado evangelho
da infância, indicando sua identidade e missão. Está centrada na
indagação que supõe uma afirmação cristológica cuja verdade é inegável para a
fé: Não sabíes que devo na Casa de meu Pai? Deste modo, Jesus começa a
revelar-se mediante a alusão ao relacionamento especialíssimo com Deus seu
Pai. Esta relação Pai-Filho há de caracterizar suas opções e todas as
suas opções e todas as suas ações. Por isso, a narrativa não só encerra
uma etapa – a infância – mas nos introduz dinamicamente no modo cristológico de
leitura do que será narrado a seguir. Mais do que curiosidade ou
reconstituição de palavras e fatos, trata-se de ler os ditos e feitos em
sintonia com a decisão de Jesus em cumprir a vontade de projeto salvífico do
Pai, no Espírito Santo.
A união de Jesus com o Pai explica sua sabedoria. Tal
sabedoria é revelada precisamente no templo, a casa do seu Pai, em meio aos
doutores, mestres ou sábios, ouvindo e também perguntando e, sobretudo,
causando admiração pela profundidade de suas respostas. Participa, pois,
da discussão conforme o método das escolas rabínicas, após ter completado doze
anos, iniciando sua maturidade, como qualquer jovem judeu, crescendo em
sabedoria, estatura e em graça, diante de Deus e dos homens, mas já revelando o
que durante a vida pública será uma das marcas de seu ministério profético: o
ensinamento constante com sabedoria e autoridade.
A surpresa da Mãe, a angústia da procura de José e de Maria diante
da perda e a incompreensão da resposta dada por Jesus convidam à reflexão da
pergunta por ele formulada: Não sabíeis…? A resposta é o próprio segredo
de Jesus a ser desvendado progressivamente em sua vida pública, máxime na morte
e na ressurreição. Segredo que consiste precisamente no ocupar-se das
realidades do Pai a nosso favor: seu plano salvífico. Mesmo retornando a
Nazaré, sua cidade, e sendo submisso a Maria e a José, o prioritário na vida e
na missão de Jesus não podia ser condicionado por sua família. Sem dizer
explicitamente, Lucas nos faz entrever que a missão de Maria e de José aos
poucos há de chegar ao cumprimento. A autonomia de Jesus em relação a
ambos e a todos só se daria após o batismo como ato inaugural de sua tal
liberdade em face à missão, ao ser acolhido, autorizado e confirmado pelo
próprio Pai como Filho bem amado. Nesse sentido, é possível também
compreender por que o evangelista alude ao fato que Jesus crescia, pois o tempo
da verdadeira maturidade ou da autonomia e da plena manifestação ainda não
chegaria.
Embora sendo o Filho do Altíssimo, o Messias viverá a condição
humana integralmente. Veja: o menino crescia, tornava-se robusto,
enchia-se de sabedoria e a graça de Deus estava com ele. Portanto Jesus
experimentará as leis naturais do crescimento, tanto no plano físico quanto no
espiritual. Passando pelas etapas normais da infância e da adolescência
até chegar à maturidade, viverá sua missão num extraordinário esvaziamento da
sua condição divina. Por isso, Nazaré, sua cidade, é o símbolo forte da
vivência em família na qual expressa, no silêncio ou no ocultamento, a sua
fidelidade incondicional ao Pai dentro da absoluta fidelidade à sua condição
humana.
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