11 de Janeiro-Evangelho
- Mc 1,14-20
João Batista foi preso por Herodes que, como os chefes religiosos de Israel, temia a popularidade de João e a contestação que fazia do sistema opressor sob o qual o povo vivia. Após a prisão, Jesus retorna à Galiléia, que é um território predominantemente gentílico. Aí, Jesus desenvolve seu ministério, com o mesmo anúncio de João Batista, da proximidade do Reino e da conversão à justiça.
Marcos, bem como Mateus e Lucas, narram o chamado
dos primeiros discípulos às margens do Mar da Galiléia. O evangelho de João
narra este chamado já na ocasião do batismo de Jesus, quando alguns discípulos
de João Batista se dispõem a seguir Jesus. O chamado, narrado em estilo
sumário, na realidade se fez em um clima de diálogo e conhecimento mútuo. Assim
como Jesus abandonou sua rotina de vida em Nazaré, também seus discípulos
abandonam seu antigo sistema de vida, não para fugirem do mundo, mas para
iniciarem uma nova prática social alternativa, de justiça e paz.
Segundo a narração de Marcos (1, 16-29) e de
Mateus (4, 18-22), o cenário da vocação dos primeiros Apóstolos é o lago da
Galileia. Jesus acabara de iniciar a pregação do Reino de Deus, quando o seu
olhar se pousou sobre dois pares de irmãos: Simão e André, Tiago e João. São
pregadores, empenhados no seu trabalho quotidiano. Lançam as redes,
consertam-nas. Mas outra pesca os aguarda. Jesus chama-os com decisão e eles
seguem-no imediatamente: agora serão “pescadores de homens” (cf. Mc 1, 17; Mt
4, 19). Lucas, ainda que siga a mesma tradição, faz uma narração mais elaborada
(5, 1-11). Ele mostra o caminho de fé dos primeiros discípulos, esclarecendo
que o convite para o seguimento lhes chega depois de terem ouvido a primeira
pregação de Jesus e experimentam os primeiros sinais prodigiosos por ele
realizados. Em particular, a pesca milagrosa constitui o contexto imediato e
oferece o símbolo da missão de pescadores de homens, que lhes foi confiada. O
destino destes “chamados”, de agora para o futuro, estará intimamente ligado ao
de Jesus. O apóstolo é um enviado mas, ainda antes, um “perito” em Jesus.
Precisamente este é o aspecto realçado pelo
evangelista João desde o primeiro encontro de Jesus com os futuros Apóstolos.
Aqui o cenário é diferente. A presença dos futuros discípulos, provenientes
também eles, como Jesus, da Galileia para viver a experiência do baptismo
administrado por João, esclarece o seu mundo espiritual. Eram homens na
expectativa do Reino de Deus, desejosos de conhecer o Messias, cuja vinda estava
anunciada como iminente.
Para eles, é suficiente a orientação de João
Baptista que indica em Jesus o Cordeiro de Deus (cf. Jo 1, 36), para que surja
neles o desejo de um encontro pessoal com o Mestre. As frases do diálogo de
Jesus com os primeiros dois futuros Apóstolos são muito expressivas. À
pergunta: “Que procurais?”, eles respondem com outra pergunta: “Rabi (que quer
dizer Mestre), onde moras?”. A resposta de Jesus é um convite: “Vinde e vereis”
(cf. Jo 1, 38-39). Vinde para poder ver. A aventura dos Apóstolos começa assim,
como um encontro de pessoas que se abrem reciprocamente. Começa para os
discípulos um conhecimento directo do Mestre. Vêem onde mora e começam a
conhecê-lo. De facto, eles não deverão ser anunciadores de uma ideia, mas
testemunhas de uma pessoa. Antes de serem enviados a evangelizar, deverão
“estar” com Jesus (cf. Mc 3, 14), estabelecendo com ele um relacionamento
pessoal. Sobre esta base, a evangelização não será mais do que um anúncio
daquilo que foi experimentado e um convite a entrar no mistério da comunhão com
Cristo (cf. 1 Jo 13).
A quem serão enviados os Apóstolos? No Evangelho
parece que Jesus limita a sua missão unicamente a Israel: “Não fui enviado
senão às ovelhas perdidas da casa de Israel” (Mt 15, 24). De modo análogo parece
que ele circunscreve a missão confiada aos Doze: “Jesus enviou estes Doze,
depois de lhes ter dado as seguintes instruções: “Não sigais pelo caminho dos
gentios, nem entreis em cidade de samaritanos. Ide, primeiramente, às ovelhas
perdidas da casa de Israel”” (Mt 10, 5s.). Uma certa crítica moderna de
inspiração racionalista tinha visto nestas expressões a falta de uma
consciência universalista do Nazareno. Na realidade, elas devem ser
compreendidas à luz da sua relação especial com Israel, comunidade da aliança,
em continuidade com a história da salvação. Segundo a expectativa messiânica as
promessas divinas, imediatamente dirigidas a Israel, ter-se-iam concretizado
quando o próprio Deus, através do seu Eleito, reunisse o seu povo, como faz um
pastor com o rebanho: “Eu virei em socorro das minhas ovelhas, para que elas
não mais sejam saqueadas… Estabelecerei sobre elas um único pastor, que as
apascentará, o meu servo David; será ele que as levará a pastar e lhes servirá
de pastor. Eu, o Senhor, serei o seu Deus, e o meu servo David será um príncipe
no meio delas” (Ez 34, 22-24). Jesus é o pastor escatológico, que reúne as
ovelhas perdidas da casa de Israel e vai à procura delas, porque as conhece e
ama (cf. Lc 15, 4-7 e Mt 18, 12-14; cf. também a figura do bom pastor em Jo 10,
11ss.). Através desta “reunião” o Reino de Deus é anunciado a todas as nações:
“Manifestarei a minha glória entre as nações, e todas me verão executar a minha
justiça e aplicar a minha mão sobre eles” (Ez 39, 21). E Jesus segue precisamente
este caminho profético. O primeiro passo é a “reunião” do povo de Israel, para
que assim todas as nações, chamadas a reunirem-se na comunhão com o Senhor,
possam ver e crer.
Assim os Doze, chamados a participar na mesma
missão de Jesus, cooperam com o Pastor dos últimos tempos, indo também eles, em
primeiro lugar, até às ovelhas perdidas da casa de Israel, isto é, dirigindo-se
ao povo da promessa, cuja reunião é o sinal de salvação para todos os povos, o
início da universalização da Aliança. Longe de contradizer a abertura
universalista da acção messiânica do Nazareno, a inicial limitação a Israel da
sua missão e da dos Doze torna-se assim o seu sinal profético mais eficaz. Depois
da paixão e da ressurreição de Cristo este sinal será esclarecido: o carácter
universal da missão dos Apóstolos tornar-se-á mais explícito. Cristo enviará os
Apóstolos “a todo o mundo” (Mc 16, 15), a “todas as nações” (Mt 28, 19); (Lc
24, 47), “até aos extremos confins da terra” (At 1, 8). E esta missão continua.
Continua sempre o mandato do Senhor de reunir os povos na unidade do seu amor.
Esta é a nossa esperança e este é também o nosso mandato: contribuir para esta
universalidade, para esta verdadeira unidade na riqueza das culturas, em
comunhão com o nosso verdadeiro Senhor Jesus Cristo.
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