domingo, 21 de outubro de 2018

30° Domingo do Tempo Comum – Ano B,Dehonianos




28 Outubro 2018
Tempo Comum
30° Domingo do Tempo Comum – Ano B
TEMA
A liturgia do 30° Domingo do Tempo Comum fala-nos da preocupação de Deus em que o homem alcance a vida verdadeira e aponta o caminho que é preciso seguir para atingir essa meta. De acordo com a Palavra de Deus que nos é proposta, o homem chega à vida plena, aderindo a Jesus e acolhendo a proposta de salvação que Ele nos veio apresentar.
A primeira leitura afirma que, mesmo nos momentos mais dramáticos da caminhada histórica de Israel, quando o Povo parecia privado definitivamente de luz e de liberdade, Deus estava lá, preocupando-se em libertar o seu Povo e em conduzi-lo pela mão, com amor de pai, ao encontro da liberdade e da vida plena.
A segunda leitura apresenta Jesus como o sumo-sacerdote que o Pai chamou e enviou ao mundo a fim de conduzir os homens à comunhão com Deus. Com esta apresentação, o autor deste texto sugere, antes de mais, o amor de Deus pelo seu Povo; e, em segundo lugar, pede aos crentes que “acreditem” em Jesus – isto é, que escutem atentamente as propostas que Ele veio fazer, que as acolham no coração e que as transformem em gestos concretos de vida.
No Evangelho, o catequista Marcos propõe-nos o caminho de Deus para libertar o homem das trevas e para o fazer nascer para a luz. Como Bartimeu, o cego, os crentes são convidados a acolher a proposta que Jesus lhes veio trazer, a deixar decididamente a vida velha e a seguir Jesus no caminho do amor e do dom da vida. Dessa forma, garante-nos Marcos, poderemos passar da escravidão à liberdade, da morte à vida.
LEITURA 1- Jer 31,7-9
Eis o que diz o Senhor:
«Soltai brados de alegria por causa de Jacob, enaltecei a primeira das nações.
Fazei ouvir os vossos louvores e proclamai:
‘O Senhor salvou o seu povo, o resto de Israel’. Vou trazê-los das terras do Norte
e reuni-los dos confins do mundo.
Entre eles vêm o cego e o coxo,
a mulher que vai ser mãe e a que já deu à luz. É uma grande multidão que regressa.
Eles partiram com lágrimas nos olhos
e Eu vou trazê-los no meio das consolações. Levá-Ios-ei às águas correntes,
por caminho plano em que não tropecem. Porque Eu sou um Pai para Israel
e Efraim é o meu primogénito».
AMBIENTE
Jeremias, o profeta nascido em Anatot por volta de 650 a.C., exerceu a sua missão profética desde 627/626 a.C., até depois da destruição de Jerusalém pelos Babilónios (586 a.C.). O cenário da actividade do profeta é, em geral, o reino de Judá (e, sobretudo, a cidade de Jerusalém).
A primeira fase da pregação de Jeremias abrange parte do reinado de Josias. Este rei – preocupado em defender a identidade política e religiosa do Povo de Deus – leva a cabo uma impressionante reforma religiosa, destinada a banir do país os cultos aos deuses estrangeiros. A mensagem de Jeremias, neste período, traduz-se num constante apelo à conversão, à fidelidade a Jahwéh e à aliança.
No entanto, em 609 a.C., Josias é morto, em combate contra os egípcios. Joaquim sucede-lhe no trono. A segunda fase da actividade profética de Jeremias abrange o tempo de reinado de Joaquim (609-597 a.C.).
O reinado de Joaquim é um tempo de desgraça e de pecado para o Povo, e de incompreensão e sofrimento para Jeremias. Nesta fase, o profeta aparece a criticar as injustiças sociais (às vezes fomentadas pelo próprio rei) e a infidelidade religiosa (traduzida, sobretudo, na busca das alianças políticas: procurar a ajuda dos egípcios significava não confiar em Deus e, em contrapartida, colocar a esperança do Povo em exércitos estrangeiros). Jeremias está convencido de que Judá já ultrapassou todas as medidas e que está iminente uma invasão babilónica que castigará os pecados do Povo de Deus. É, sobretudo, isso que ele diz aos habitantes de Jerusalém … As previsões funestas de Jeremias concretizam-se: em 597 a.C., Nabucodonosor invade Judá e deporta para a Babilónia uma parte da população de Jerusalém.
No trono de Judá fica, então, Sedecias (597-586 a.C.). A terceira fase da missão profética de Jeremias desenrola-se, precisamente, durante este reinado.
Após alguns anos de calma submissão à Babilónia, Sedecias volta a experimentar a velha política das alianças com o Egipto. Jeremias não está de acordo que se confie em exércitos estrangeiros mais do que em Jahwéh … Mas, nem o rei, nem os notáveis prestam qualquer atenção à opinião do profeta.
Em 587 a.C., Nabucodonosor põe cerco a Jerusalém; no entanto, um exército egípcio vem em socorro de Judá e os babilónios retiram-se. Nesse momento de euforia nacional, Jeremias aparece a anunciar o recomeço do cerco e a destruição de Jerusalém (cf. Jer 32,2-5). Acusado de traição, o profeta é encarcerado (cf. Jer 37,11- 16) e corre, inclusive, perigo de vida (cf. Jer 38,11-13). Enquanto Jeremias continua a pregar a rendição, Nabucodonosor apossa-se, de facto, de Jerusalém, destrói a cidade e deporta a sua população para a Babilónia (586 a.C.).
É impossível dizer com segurança o contexto em que apareceu essa mensagem que o texto que nos é hoje proposto apresenta.
Para alguns comentadores, trata-se de um oráculo que poderia situar-se na primeira fase da actividade profética de Jeremias (reinado de Josias) e dirigir-se-ia aos israelitas do Reino do Norte. Seria uma mensagem de esperança, destinada a animar esse povo que há cerca de cem anos tinha perdido a independência e estava sob o domínio assírio.
Para outros, contudo, este texto será da época de Sedecias, algures entre a primeira e a segunda deportação do Povo para a Babilónia (597-586 a.C.). É a época em que Jeremias descobre perspectivas teológicas novas e começa a reflectir sobre um tempo novo que Deus irá oferecer ao seu Povo: após a catástrofe, será possível recomeçar tudo, pois Deus tem em mente fazer uma nova Aliança com Judá.
MENSAGEM
O texto que nos é proposto começa com um convite à alegria e ao louvor (vers. 7). Porquê? Porque Jahwéh vai reunir o seu Povo (disperso na Assíria? Na Babilónia?), vai conduzi-lo através do deserto e vai fazê-lo retornar à sua pátria. Reunir, conduzir e fazer retornar à pátria são os três verbos que, tradicionalmente, definem a acção de Deus em favor do seu Povo, durante o Êxodo.
Depois da afirmação geral, o profeta apresenta alguns pormenores deste Novo Êxodo. Da comitiva farão parte “o cego e o coxo, a mulher grávida e a que deu à luz” (vers. 8b). O cego e o coxo são figuras tradicionais ligadas ao tema do Êxodo (cf. Is 35,5), onde relembram a situação de necessidade e de carência em que os exilados jazem e, ao mesmo tempo, evocam a acção extraordinária de Deus no sentido de libertar o seu Povo dessa carência e dessa necessidade. Na imagem da mulher grávida e na da mulher que deu à luz, o profeta representa a dor e o sofrimento, mas também a fecundidade, a alegria, a esperança num futuro novo e cheio de vida.
No último versículo do nosso texto (vers. 9), Jahwéh apresenta-Se como um pai cheio de amor pelo seu filho/Povo. Esse amor irá traduzir-se no final do Exílio e no regresso dos exilados à sua terra “entre grande consolação”, por “caminhos direitos” e fáceis. No final desse Êxodo triunfal, Jahwéh vai oferecer ao seu Povo vida abundante e fecunda (“conduzi-Ios-ei às torrentes de água”).
O texto dá conta da preocupação de Deus com a vida, a felicidade e a realização plena do seu Povo. Mesmo nos momentos mais dramáticos da caminhada histórica de Israel, quando o Povo parecia privado definitivamente de luz e de liberdade (o “cego” e o “coxo”), Deus estava lá, preocupando-se em libertar o seu Povo e em conduzi-lo pela mão, com amor de pai, ao encontro da liberdade e da vida plena.
ACTUALIZAÇÃO
• O que este texto nos diz, antes de mais, é que o Deus em quem acreditamos não é um Deus insensível e alheado das dores e dificuldades dos homens; mas é um Deus sensível e atento, que cuida dos seus filhos com cuidados de pai. Ao longo do percurso que vamos percorrendo pela história, também nós fazemos, como os antigos israelitas, a experiência da escravidão, da dependência, do medo, do desespero, da decepção … A Palavra de Deus que hoje nos é servida garante-nos: não estamos sozinhos frente aos nossos dramas e sofrimentos; Deus vai ao nosso lado e, com amor de pai, cuida de nós, dá-nos a mão, conduz-nos ao encontro da vida eterna e verdadeira. A nós resta-nos reconhecer a sua presença (às vezes tão discreta que nem a notamos) e, com humildade e simplicidade, aceitar o seu amor.
• Na perspectiva do profeta, a acção salvadora e libertadora de Deus estender-se-á a todos, inclusive aos “cegos” e aos “coxos”. Os “coxos” e os “cegos representam, aqui, aqueles que estão numa situação de fragilidade, de debilidade, de dependência e que são incapazes, por si sós, de deixar essa condição. Também com esses – ou especialmente com esses – Deus quer caminhar. Na verdade, Deus não marginaliza ninguém, nem coloca ninguém à margem da sua proposta de salvação … Os fracos, os débeis, os limitados, os marginalizados ocupam um lugar especial no coração de Deus e são objecto privilegiado do seu amor e da sua misericórdia. Na nossa sociedade, os pequenos, os pobres, os doentes, os velhos, os estrangeiros sem papéis são, frequentemente, marginalizados e ultrapassados pelo comboio da história. A sociedade edifica-se sem eles ou, pelo menos, sem ter em conta as suas necessidades e carências… Nós, os crentes, formados na escola de Deus, precisamos olhar para eles com o mesmo olhar de Deus, descobrir que também eles são filhos queridos e amados de Deus, denunciar as estruturas que os marginalizam, criar mecanismos de inclusão e de integração. É preciso ver em cada homem ou mulher – no “coxo”, no “cego”, no velho, no doente, no marginal – um irmão que Deus ama e a quem quer oferecer, por nosso intermédio, a vida plena, a salvação definitiva.
• Em todo o capítulo 31 do profeta Jeremias (de onde é retirado o texto que nos é proposto), há um impressionante apelo à esperança, à confiança em Deus. Por vezes, somos tentados a olhar para a nossa vida e para a história do nosso mundo, com os óculos do pessimismo, do medo e do desespero … O terrorismo, os crimes ambientais, as dificuldades económicas, as doenças incuráveis, a fome, a miséria, os valores efémeros, parecem pintar de negro o nosso futuro e o futuro do nosso planeta … Contudo, a Palavra de Deus que hoje nos é proposta garante¬nos: não tenhais medo, pois Deus caminha convosco pela história e, como um pai cheio de bondade que ensina o filho a caminhar, há-de conduzir-vos pela mão ao encontro da vida verdadeira. Há, certamente, um futuro para nós, pois Deus ama¬nos e caminha connosco.
SALMO RESPONSORIAL – Salmo 125 (126)
Refrão 1: Grandes maravilhas fez por nós o Senhor, por isso exultamos de alegria.
Refrão 1: O Senhor fez maravilhas em favor do seu povo.
Quando o Senhor fez regressar os cativos de Sião, parecia-nos viver um sonho.
Da nossa boca brotavam expressões de alegria e dos nossos lábios cânticos de júbilo.
Diziam então os pagãos:
«O Senhor fez por eles grandes coisas». Sim, grandes coisas fez por nós o Senhor, estamos exultantes de alegria.
Fazei regressar, Senhor, os nossos cativos, como as torrentes do deserto.
Os que semeiam em lágrimas
recolhem com alegria.
À ida vão a chorar, levando as sementes; à volta vêm a cantar,
trazendo os molhos de espigas.
LEITURA 11- Heb 5,1-6
Todo o sumo sacerdote, escolhido de entre os homens, é constituído em favor dos homens,
nas suas relações com Deus,
para oferecer dons e sacrifícios pelos pecados. Ele pode ser compreensivo
para com os ignorantes e os transviados, porque também ele está revestido de fraqueza; e, por isso, deve oferecer sacrifícios
pelos próprios pecados e pelos do seu povo. Ninguém atribui a si próprio esta honra,
senão quem foi chamado por Deus, como Abraão. Assim também, não foi Cristo que tomou para Si a glória de Se tornar sumo sacerdote;
deu-Lha Aquele que Lhe disse:
«Tu és meu Filho, Eu hoje Te gerei»,
e como disse ainda noutro lugar: «Tu és sacerdote para sempre, segundo a ordem de Melquisedec».
AMBIENTE
Continuamos, neste 30° Domingo do Tempo Comum, a ler a Carta aos Hebreus – uma reflexão destinada a comunidades cristãs em situação difícil, expostas a perigos vários e que, por isso mesmo, estão numa situação de fragilidade, de cansaço e de desalento. O objectivo do autor da Carta é ajudar esses cristãos a redescobrir o seu entusiasmo inicial, a revitalizar o seu compromisso com Cristo e a empenhar-se numa fé mais coerente e mais comprometida.
Nesse sentido, o autor desta reflexão convida os crentes a apreciar o mistério de Cristo, o sacerdote por excelência, que o Pai enviou ao mundo com a missão de convidar todos os homens a integrar a comunidade do Povo sacerdotal. Uma vez comprometidos com Cristo, os crentes – membros desse Povo sacerdotal – devem fazer da sua vida um contínuo sacrifício de louvor, de entrega e de amor. Ao lembrar aos crentes o seu compromisso com Cristo e com a comunidade do Povo sacerdotal, o autor oferece aos cristãos a base para revitalizarem a sua experiência de fé, enfraquecida pela hostilidade do ambiente, pela acomodação, pela monotonia.
O texto que nos é proposto está incluído na segunda parte da Carta aos Hebreus (cf. Heb 3,1-5,10). Aí, o autor apresenta Jesus como o sacerdote fiel e misericordioso que o Pai enviou ao mundo para mudar os corações dos homens e para os aproximar de Deus. Aos crentes pede-se que “acreditem” em Jesus – isto é, que escutem atentamente as propostas que Cristo veio fazer, que as acolham no coração e que as transformem em gestos concretos de vida.
MENSAGEM
No universo religioso judaico, o sumo-sacerdote ocupava o lugar cimeiro na hierarquia do clero do Templo e, de alguma forma, presidia à instituição sacerdotal. Era ele o único a entrar, uma vez no ano, no lugar mais sagrado do Templo (“Debir” ou “Santo dos Santos”), no solene “Dia das Expiações” (“Yom Kippurim”), com o sangue de um animal imolado, para aspergir o “propiciatório” (“kapporet”) e conseguir o perdão de Deus para os pecados do Povo. Dessa forma, o sumo-sacerdote tornava-se o intermediário por excelência da relação entre os homens e Deus.
Para a mentalidade judaica, há três elementos fundamentais ligados à figura do sumo¬sacerdote. Em primeiro lugar, ele é um escolhido de Deus: o sumo-sacerdote não é alguém que, por sua iniciativa pessoal, se propõe para o cargo; mas é alguém a quem Deus chama e a quem confia esta missão (foi Deus que, por sua iniciativa, chamou Aarão e toda a sua descendência). Em segundo lugar, o sumo-sacerdote é um homem tomado de entre os homens: a sua humanidade não o torna inapto para uma missão tão sublime; pelo contrário, a fragilidade e debilidade que resultam da sua humanidade tornam-no apto para compreender os erros e os pecados dos outros homens por quem intercede. Em terceiro lugar, o sumo-sacerdote tem uma função mediadora: a sua missão é “oferecer dons e sacrifícios pelos pecados”, apresentando diante de Deus o arrependimento dos homens e trazendo aos homens o perdão de Deus; dessa forma, ele refaz a relação dos homens com Deus.
Na perspectiva do autor da Carta aos Hebreus, Jesus é o sumo-sacerdote por excelência. Em primeiro lugar, porque Ele foi chamado e destinado por Deus a esta missão (apesar de não ser da linhagem do sacerdote Aarão); o facto de ser Filho de Deus dá ao seu sacerdócio uma categoria, uma dignidade e uma qualidade suprema, uma vez que o coloca em contacto pessoal e íntimo com o Pai, dando dessa forma
uma expressão mais completa a essa mediação que Ele é chamado a realizar entre Deus e os homens.
Em segundo lugar, porque Ele foi homem, também. Ao assumir a nossa humanidade, Ele experimentou a nossa debilidade e fragilidade e tornou-Se capaz de entender as nossas fraquezas e os nossos pecados e de Se tornar o nosso mediador e intercessor junto do Pai.
A sua proximidade e intimidade com o Pai, por um lado, e a sua humanidade, por outro tornam-n’O, finalmente, o perfeito mediador e intercessor, capaz de restabelecer definitivamente a comunhão entre Deus e os homens. De facto, Ele veio ao nosso encontro, mostrou-nos o amor do Pai, convidou-nos a eliminar o egoísmo e o pecado que nos afastavam da comunhão com Deus, chamou-nos a integrar a família de Deus e ensinou-nos o que fazer para sermos filhos de Deus.
ACTUALIZAÇÃO
• Ao apresentar Jesus como o sumo-sacerdote, chamado pelo Pai e enviado ao mundo para libertar os homens do egoísmo e do pecado e para os conduzir à comunhão com Deus, o autor da Carta aos Hebreus convida-nos (todos os textos que a liturgia deste domingo nos propõe apontam no mesmo sentido) a contemplar a grandeza do amor que Deus nos dedica. A contemplação da incarnação de Jesus e de tudo o que Ele realizou enquanto percorreu os caminhos e aldeias da Palestina fala-nos de um amor sem limites, expresso em gestos concretos e que culmina na entrega total, na cruz. A nós resta-nos olhar para Jesus, escutá-I’O, aceitar a sua proposta, banir da nossa vida o egoísmo e o pecado, segui-l’O nesse caminho do dom e da entrega que irá levar-nos a integrar a família de Deus e a possuir a vida verdadeira.
• Para o autor do nosso texto, ao assumir a nossa humanidade, Jesus experimentou a nossa fragilidade, a nossa debilidade, a nossa dependência; tornou-Se, portanto, capaz de compreender os nossos erros e falhas e de olhar para as nossas insuficiências com bondade e misericórdia. Para a nossa vida concreta, há duas consequências que resultam daqui… A primeira leva-nos à confiança e à esperança: junto de Deus nosso Pai, temos um intercessor que entende as nossas dificuldades e que, apesar das nossas falhas, continua apostado em integrar-nos na família de Deus. A segunda leva-nos ao compromisso com os irmãos: a solidariedade de Cristo connosco convida-nos à solidariedade com os pequenos, com os últimos, com os pobres, com aqueles que o mundo rejeita e marginaliza; convida-nos a identificarmo-nos com os sofrimentos e angústias, com as alegrias e esperanças de cada homem ou mulher; convida-nos a fazer o que estiver ao nosso alcance para promover aqueles que são humilhados, explorados, incompreendidos, colocados à margem da vida …
• Os planos de Deus para salvar e libertar os homens concretizaram-se porque Cristo, o Filho, assumiu os projectos do Pai e viveu sempre na obediência incondicional às propostas de Deus. Hoje, os projectos de salvação e de libertação que Deus tem para os homens continuam a concretizar-se através daqueles que aderiram a Jesus e querem, como Ele, viver na estrita obediência aos planos de Deus. Sinto-me, como Jesus, testemunha da salvação de Deus diante dos meus irmãos? ° meu egoísmo e a minha acomodação alguma vez me desviaram do cumprimento dos projectos de Deus? Aqueles que eu encontro, a cada passo, nos caminhos do mundo, têm encontrado em mim uma proposta credível de vida e de libertação?
ALELUIA – cf. 2 Tim 1,10
Aleluia. Aleluia.
Jesus Cristo, nosso Salvador, destruiu a morte e fez brilhar a vida por meio do Evangelho.
EVANGELHO – Mc 10,46-52
Naquele tempo,
quando Jesus ia a sair de Jericó
com os discípulos e uma grande multidão,
estava um cego, chamado Bartimeu, filho de Timeu, a pedir esmola à beira do caminho.
Ao ouvir dizer que era Jesus de Nazaré que passava, começou a gritar:
«Jesus, Filho de David, tem piedade de mim». Muitos repreendiam-no para que se calasse. Mas ele gritava cada vez mais:
«Filho de David, tem piedade de mim».
Jesus parou e disse: «Chamai-O».
Chamaram então o cego e disseram-lhe: «Coragem! Levanta-te, que Ele está a chamar-te».
O cego atirou fora a capa, deu um salto e foi ter com Jesus. Jesus perguntou-lhe:
«Que queres que Eu te faça?» O cego respondeu-Lhe: «Mestre, que eu veja».
Jesus disse-lhe:
«Vai: a tua fé te salvou». Logo ele recuperou a vista
e seguiu Jesus pelo caminho.
AMBIENTE
O Evangelho deste domingo propõe-nos a última etapa desse caminho (geográfico, mas também espiritual) que Jesus iniciou com os discípulos na Galileia e que irá levá- 1’0 a Jerusalém, ao encontro da paixão, morte e ressurreição. É a última cena de um percurso que não tem sido fácil e no qual os discípulos, como cegos, se aferram às suas ideias e projectos próprios, recusando-se a entender e a aceitar que o caminho do Reino deva passar pela cruz e pelo dom da vida.
O episódio que hoje nos é proposto situa-nos à saída da cidade de Jericó. Jericó, a “cidade das Palmeiras”, é um oásis situado na margem do rio Jordão, a norte do Mar Morto, e que dista cerca de 30 quilómetros de Jerusalém. Na época de Jesus, era uma cidade relativamente importante, onde Herodes, o Grande, tinha edificado um luxuoso palácio de Inverno.
Além de Jesus, Marcos coloca no centro da cena um mendigo cego com o nome de Bartimeu (“filho de Timeu”). Este nome, meio aramaico (“bar”) e meio grego (“timaios”), é um nome perfeitamente inusual no ambiente hebraico-palestinense onde a história é situada (nunca aparece entre os cerca de 2.000 nomes próprios que ocorrem no Antigo Testamento); aos leitores romanos de Marcos, contudo, o nome devia evocar o “Timeo”, um dos mais conhecidos “diálogos” de Platão. Alguns autores pensam que, mais do que um personagem histórico, o cego Bartimeu seria uma figura simbólica.
Os “cegos” faziam parte do grupo dos excluídos da sociedade palestina de então. As deficiências físicas eram consideradas – pela teologia oficial – como resultado do pecado. Segundo a concepção da época, Deus castigava de acordo com a gravidade da culpa. A cegueira era considerada o resultado de um pecado especialmente grave: uma doença que impedisse o homem de estudar a Lei era considerada uma maldição de Deus por excelência. Pela sua condição de impureza notória, os cegos eram impedidos de servir de testemunhas no tribunal e de participar nas cerimónias religiosas no Templo.
MENSAGEM
É natural que Jesus tenha encontrado, quando saía de Jericó, um cego que mendigava junto da estrada… No entanto, parece claro que, à volta desse acontecimento fundamental, Marcos construiu uma catequese para os seus leitores. Quem é, na catequese de Marcos, este “cego” que Jesus encontra ao longo do caminho, quando se dirige para Jerusalém? Ele representa todos esses a quem a teologia oficial considerava pecadores, malditos, impuros, marginais, longe de Deus e da sua proposta de salvação.
O cego da nossa história está sentado à beira do caminho, provavelmente a pedir esmola. O estar sentado significa acomodação, instalação, conformismo. Ele está privado da luz e da liberdade e está conformado com a sua triste situação, sabendo que, por si só, é incapaz de sair dela. O pedir esmola (o texto refere explicitamente a sua condição de mendigo – verso 46) indica a situação de escravidão e de dependência em que o homem se encontra.
Contudo, a passagem de Jesus de Nazaré dá ao cego a consciência da sua situação de miséria, de dependência, de escravidão. Então, Bartimeu percebe o sem sentido da sua situação e sente a vontade de apostar numa outra experiência. A passagem de Jesus na vida de alguém é sempre um momento de tomada de consciência, de questionamento, de desafio, que leva a pôr em causa a vida velha e a sentir o imperativo de ir mais além … No entanto, Bartimeu está consciente da sua debilidade e sente que, sem a ajuda de Jesus, continuará envolvido pelas trevas da dependência, da escravidão, da instalação … Por isso, pede: “Jesus, filho de David, tem misericórdia de mim” (vers. 47). O título “filho de David” é um título messiânico. Portanto, Bartimeu vê em Jesus esse Messias libertador que, segundo a mentalidade judaica, havia de vir não só para salvar Israel dos opressores, mas também para dar vida em plenitude a cada membro do Povo de Deus.
Antes de referir a intervenção de Jesus, Marcos dá conta da reacção dos que estão à volta de Jesus: repreendiam o cego e queriam fazê-lo calar (vers. 48). Quando alguém encontra Jesus e resolve deixar a vida antiga para aderir ao Reino que Jesus veio propor, encontra sempre resistências (que vêm, por vezes, dos familiares, dos amigos, dos colegas). Estes que repreendem e mandam calar o cego representam, portanto, todos aqueles que colocam obstáculos a quem quer deixar a sua situação de miséria e de escravidão para aderir à proposta libertadora que Cristo faz. No entanto, a oposição não só não desarma o cego, como o leva a gritar ainda mais forte: “filho de David, tem misericórdia de mim” … A incompreensão ou a oposição dos homens nunca fazem desistir aquele que viu Jesus passar e que viu n’Ele uma proposta de vida e de liberdade.
Jesus parou e mandou chamar o cego. A cena recorda-nos os relatos do chamamento dos discípulos (cf. Mc 1,16-20; 2,14; 3,13). Os mediadores que transmitem ao cego as palavras de Jesus dizem-lhe: “coragem, levanta-te que Ele chama-te” (vers. 49). Ou seja: deixa a tua situação de miséria, de escravidão e de dependência, porque Jesus chama-te. O chamamento é sempre, nestes casos, a tornar-se discípulo, a seguir Jesus no caminho do amor e do dom da vida.
Em resposta, o cego atirou fora a capa, deu um salto e foi ter com Jesus (vers. 50). A capa podia estar colocada debaixo do cego, como almofada, ou nos seus joelhos, para recolher as moedas que lhe atiravam; em qualquer caso, a capa é tudo o que um mendigo possui, a única coisa de que ele pode separar-se (outros deixaram o barco, as redes ou a banca onde recolhiam impostos). O deitar fora a capa significa, portanto, o deixar tudo o que se possui para ir ao encontro de Jesus. É um corte radical com o passado, com a vida velha, com a anterior situação, com tudo aquilo em que se apostou anteriormente, a fim de começar uma vida nova ao lado de Jesus.
Jesus perguntou ao cego: “que queres que te faça?”. É a mesma pergunta que, pouco antes, Jesus fizera a João e Tiago (cf. Mc 10,36). A identidade da pergunta acentua, contudo, a diferença da resposta … Os dois irmãos queriam sentar-se ao lado de Jesus e ver concretizados os seus sonhos de grandeza e de poder; o cego Bartimeu, ao contrário, cansado de estar sentado numa vida de escravidão e de cegueira, quer encontrar a luz para seguir Jesus (vers. 51).
Jesus responde a Bartimeu: “vai, a tua fé te salvou” (vers. 52). A fé não é a simples adesão a determinadas verdades abstractas, que o crente aceita acriticamente; mas, no contexto neo-testamentário, a fé é a adesão a Jesus e à sua proposta de salvação. Por isso, Marcos termina a sua história dizendo que o cego recuperou a vista e seguiu Jesus – isto é, fez-se discípulo de Jesus. Ao aderir a Jesus e à sua proposta de salvação, ao aceitar seguir Jesus no caminho do amor e do dom da vida (Jesus prepara-Se para entrar em Jerusalém, onde vai fazer dom da sua vida em favor dos homens), Bartimeu encontrou a salvação: deixou a vida da escuridão, da escravidão, da dependência em que estava e nasceu para essa vida verdadeira e eterna que, através de Jesus, Deus oferece aos homens.
O cego Bartimeu que encontráramos a mendigar, sentado à beira do caminho, à saída de Jericó representava, inicialmente, os pecadores que viviam longe de Deus e à margem da salvação. Depois de encontrar Jesus, Bartimeu transforma-se e torna-se o protótipo do verdadeiro discípulo … Destinatário privilegiado da proposta de salvação que Jesus traz, ele proclama sem hesitações a sua fé, invoca a ajuda e a misericórdia de Jesus, acolhe sem hesitações o chamamento que lhe é feito, liberta-se da vida velha e, com alegria, decisão e entusiasmo, aceita, sem condições, seguir Jesus no caminho do amor e do dom da vida. É com Bartimeu que os discípulos de Jesus são convidados a identificar-se.
ACTUALIZAÇÃO
• A situação inicial do cego Bartimeu (que jaz na escuridão, dependente, acomodado, conformado) evoca uma realidade que conhecemos bem … Evoca a condição do homem escravo, prisioneiro do egoísmo, do orgulho, dos bens materiais, da preguiça, da vaidade, do êxito; evoca a condição daquele que está acomodado na sua situação de miséria, instalado nos seus preconceitos e projectos pessoais, conformado com uma vida de horizontes limitados; evoca a condição daquele que se sente refém dos seus vícios, hábitos e paixões e que sente a sua incapacidade em romper, por si só, as cadeias que o impedem de ser livre… Esta situação será uma situação insuperável, a que o homem está condenado de forma permanente?
• A Palavra de Deus que nos é proposta garante-nos que a situação do homem cego, prisioneiro da escuridão, não é uma situação incontornável, obrigatória, sem remédio … Jesus veio ao mundo, enviado pelo Pai, com uma proposta de libertação destinada a todos aqueles que procuram a luz e a vida verdadeira. Esse Jesus de Nazaré que Se cruzou com o cego à saída de Jericó continua a cruzar-Se hoje, de forma continuada, com cada homem e com cada mulher nos caminhos da vida e oferece-lhes, sem cessar, a proposta libertadora de Deus … É preciso, no entanto, que não nos fechemos no nosso egoísmo e na nossa auto-suficiência, surdos e cegos aos apelos de Deus; é preciso que as nossas preocupações com os valores efémeros não nos distraiam do essencial; é preciso que aprendamos a reconhecer os desafios de Deus nesses acontecimentos banais com que, tantas vezes, Deus nos interpela e questiona …
• O que é que implica aceitar a proposta que Jesus faz? Fundamentalmente implica – como aconteceu com Bartimeu – tornar-se discípulo … Ser discípulo de Jesus é aderir à sua pessoa, acolher os seus valores, viver na obediência aos projectos do Pai, fazer da vida um dom de amor aos irmãos; é solidarizar-se com os pequenos, com os pobres, com os perseguidos, com os marginalizados e lutar por um mundo onde todos sejam acolhidos como filhos de Deus, iguais em direitos e em dignidade; é lutar contra as estruturas que geram injustiça, opressão e morte; é ser testemunha, com palavras e com gestos, da verdade, da justiça, da paz, da reconciliação. Quem aceita seguir o caminho do discípulo escolhe viver na luz e está a contribuir para a construção de um mundo novo.
• Quando reconhecemos o “chamamento” de Deus, qual deve ser a nossa resposta?
Bartimeu, logo que ouviu dizer que Jesus o chamava, atirou fora a sua capa e correu ao encontro de Jesus. O gesto de Bartimeu representa, aqui, a renúncia imediata à vida antiga, ao egoísmo, ao comodismo, à escravidão, aos comportamentos incompatíveis com a adesão a Cristo e a esse caminho novo que Jesus o convida a percorrer. É isso, também, que é pedido a todos aqueles a quem Jesus chama à vida nova …
• Na história do encontro de Bartimeu com Cristo, aparecem outros personagens, com papéis vários. Uns constituem obstáculos à adesão de Bartimeu a Cristo; outros apresentam-se como intermediários entre Cristo e Bartimeu e transmitem ao cego as palavras de Jesus… Este facto serve para nos tornar conscientes do papel daqueles que nos rodeiam no nosso caminho da fé … Ao longo da nossa caminhada, encontraremos sempre pessoas que nos ajudam a ir ao encontro de Cristo e pessoas que (muitas vezes com óptimas intenções) tentam impedir-nos de encontrar Cristo. Precisamos de aprender a discernir entre as várias opiniões que nos são propostas e a dar a devida importância a quem nos ajuda a descobrir o caminho para a verdadeira vida.
• Quem encontra Cristo e aceita o desafio para viver como discípulo tem, a partir daí, um caminho fácil? De forma nenhuma. Tem de abandonar a vida cómoda e instalada em que vivia e enfrentar uma nova realidade, num desafio permanente, num questionamento constante; tem de aprender a enfrentar as críticas, as incompreensões, os confrontos com aqueles que não compreendem a sua opção; tem de percorrer, dia a dia, o difícil caminho do amor, do serviço, da entrega, do dom da vida … É preciso, no entanto, que o discípulo esteja consciente de que o caminho de Jesus não é um caminho que leva à morte, mas é um caminho que leva à ressurreição, à vida verdadeira e eterna.
ALGUMAS SUGESTÕES PRÁTICAS
PARA O 30° DOMINGO DO TEMPO COMUM
(adaptadas de “Signes d’aujourd’hui”
1. A PALAVRA MEDITADA AO LONGO DA SEMANA.
2.
Ao longo dos dias da semana anterior ao 30° Domingo do Tempo Comum, procurar meditar a Palavra de Deus deste domingo. Meditá-Ia pessoalmente, uma leitura em cada dia, por exemplo … Escolher um dia da semana para a meditação comunitária da Palavra: num grupo da paróquia, num grupo de padres, num grupo de movimentos eclesiais, numa comunidade religiosa … Aproveitar, sobretudo, a semana para viver em pleno a Palavra de Deus.
2. BILHETE DE EVANGELHO.
Jesus encontrou obstáculos na sua vida pública: incompreensões dos chefes dos sacerdotes, ciladas colocadas pelos fariseus. Na saída de Jericó, a multidão faz obstáculo à atenção de Jesus, procura fazer calar um mendigo cego. Felizmente, Jesus escuta o grito deste homem e pede aos seus próximos para serem o trampolim entre Ele e o doente: “Chamai-o!. .. Eu quero ter necessidade de vós”. Então temos estas três palavras, as palavras da Igreja que tem por missão levar os homens a Cristo: “confiança … não tenhas medo, Ele vai certamente fazer-te bem. Levanta-te … Ele respeita demasiado a tua liberdade, faz tu mesmo o caminho. Ele chama-te … é Ele que toma a iniciativa e, se Ele te chama, é para te salvar”. Jesus não pede ao homem para se calar. Pelo contrário, dá-lhe a palavra, e esta palavra torna-se para Jesus acto de fé, uma fé que salva. O homem é de tal modo salvo que não somente vê, mas segue Jesus no caminho, tal é a sua dupla cura.
3. À ESCUTA DA PALAVRA.
A vista é a vida. A vista não tem preço. É o caminho do cego à procura de Jesus, da vista, da vida … Filho de David, chama ele Jesus. Para os Judeus, só o Messias há tanto esperado podia ser assim chamado. Evocar David e a sua descendência era proclamar a fidelidade de Deus para com o seu povo. A multidão chamava a Jesus “Jesus de Nazaré”. O cego chama Jesus “Filho de David”. Reconhece em Jesus o Messias. O cego, na sua cegueira física, vê mais longe, mais profundamente, com o olhar interior da fé. Ele recuperou a luz exterior, mas é sobretudo a luz interior, a luz da fé, que vai iluminar o caminho da sua vida. Ele quer seguir e estar com aquele que disse: “Eu sou a Luz da Vida”. E nós? Ficamo-nos muitas vezes pela superfície das coisas, num olhar superficial que nos faz passar ao lado da profundidade dos outros. Daí nascem os preconceitos, as tensões, as recusas. É o olhar da multidão sobre o cego: um mendigo sem interesse, que era necessário calar. Bartimeu recorda-nos que há um outro olhar, o olhar de Deus sobre nós, sobre os outros, sobre os acontecimentos. Cabe a nós perguntarmo-nos qual é o nosso verdadeiro olhar. “Senhor, faz que eu veja!”.
4. PARA A SEMANA QUE SE SEGUE …
“Que queres que te faça?”, diz Jesus ao cego … Não tenhamos medo, nós também, de dizer a Jesus: “que eu veja”. A alegria de Cristo que nos ama é esta fé, esta confiança n’Ele. Não tenhamos medo de Lhe dizer a nossa fé e confiança, muitas vezes!
Grupo Dinamizador
Pe. Joaquim Garrido – Pe. Manuel Barbosa – Pe. Ornelas Carvalho
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