Comentários Prof.Fernando*
2ºdom
do Tempo comum / após epifania 17
janeiro 2015
Uma festa de casamento
não mais serás chamada a
desamparada,
nem tua terra, a
abandonada;
serás chamada: minha preferida;
e tua terra terá um
esposo. (Isaías 62,4)
1) Festa de casamento
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Em vez de desamparo e abandono, a
promessa é de construção de uma vida juntos, é promessa de casamento. E com
muita festa. Começando pela festa de casamento. O poema de Isaías trata disso.
Da superação de situações do passado, para um novo modo de vida, na condição de
casados. É mudança da água para o vinho, tema da narrativa de Caná na
3ª.leitura.
·
A imagem do casamento não tem,
entre nós hoje, a mesma força que para os ouvintes dos primeiros cristãos. No
mundo antigo em geral, a mulher não era reconhecida a não ser quando protegida
pelo marido, e era estimada mais pela capacidade de gerar filhos para o
trabalho e renda da família do que por sua própria dignidade. Hoje casar não desperta
o mesmo impacto simbólico como no tempo dos escritos bíblicos. Na bíblia a imagem
do carinho e cuidado de Deus (o marido) pelo seu povo (a esposa) é comparação
habitual. Em particular, a civilização de Israel carregava uma noção tão forte de
proteção à mulher (pelo casamento) que a legislação dava enorme importância ao
cuidado com as viúvas (bem como ao órfão e ao estrangeiro). A viúva perdeu a proteção
(como órfãos e estrangeiros não tinham quem os criasse ou entendesse). Leia-se
a passagem de hoje (1ªleitura) de Isaías que usa o sentido do desamparo e do
casamento.
·
Também Jesus de Nazaré – judeu
que era, e profundamente fiel à Lei (não veio para jogar fora a Lei mas levá-la
à perfeição) – tinha especial cuidado com as viúvas e com os mais desprezados e
pobres. Em todo caso mesmo hoje ainda existe algum apreço pelo casamento, em que
pese o fato de nem sempre haver festa ou rito religioso. Em que pese também a
grande mudança nas leis civis de união e separação...
2) Uma nova Criação
·
Conhecemos o famoso Prólogo de
João, um poema genial semelhante aos textos de filosofia antiga, onde conceitos,
grávidos de sentidos, demandam ser desdobrados na sua interpretação: o Verbo, a
Palavra, o Lógos, o Princípio, a Luz, a Vida. Outros termos, tipicamente
bíblicos, se acrescentam: a luz e as trevas – o mundo, os seus, e o que era seu
- a testemunha e o testemunho – nascer do sangue, da carne, da vontade do Homem
e de Deus – possuir o poder de ser filho de Deus – a Glória, a Graça e a
Verdade. E o Verbo se fez Carne, e armou
sua própria barraca no meio de nosso acampamento.
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O texto começa com uma espécie de
atualização do Gênesis: No princípio era
o Verbo nos remete ao No princípio
criou Deus os céus e a terra. Nos capítulos 1 e 2 do texto joanino, como
sabemos João usa como roteiro literário a distribuição dos acontecimentos em
“dias” da semana como no relato da Criação em Gênesis 1. Assim, 1,29 é o 2ºdia (29= No dia
seguinte, João viu Jesus que vinha a ele e disse: Eis o Cordeiro de Deus, que
tira o pecado do mundo). Depois nos versos 35 e 43 registram-se o 3º e 4º dias (35=No dia seguinte,
estava lá João outra vez com dois dos seus discípulos; 43=No dia seguinte, tinha Jesus a intenção de dirigir-se
à Galiléia. Encontra Filipe e diz-lhe: Segue-me).
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“Três dias depois”, portanto, no fim da semana, surge o relato da festa de casamento em Caná,
na Galiléia. É ao final desta (“repetição” da) semana da criação que Jesus faz
seu Primeiro milagre. “Os simbolismos se amontam”, diz o comentarista (o
biblista) Konings; e completa: “Abundância de vinho é um sinal dos tempos
messiânicos (Am9,13¬15; Joel4,18-21). Este vinho novo é o último e o melhor” (cf.
Mc 2,22), transformando a água das abluções judaicas”.
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Na
primeira parte de seu evangelho João organizou seu texto em torno de 7 “Sinais”.,
O primeiro deles nesta festa em Caná. O casamento é a comparação de João para
indicar: chegou o tempo das “núpcias do Cordeiro” (cf. Apocalipse19,9), a união
de Deus com a humanidade.
3) Água e vinho
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A
água da Terra, junto com o ar (que também quer dizer sopro, o Espírito),
conjugados ao calor (ou fogo) do sol e à própria terra, talvez seja o bem mais
precioso dentre os “quatro elementos” tão bem conhecidos em todas as culturas,
especialmente nas mitologias chinesa (oriente) e grega (ocidente). Mas é por
causa da água se fazem guerras (a interminável tensão entre judeus e palestinos sobre a posse de territórios
tem no controle da água um de seus fatores). Por causa da água perdida na exploração
irracional dos recursos da Terra, grandes cidades ou estados (como São Paulo no
Brasil e a Califórnia nos EE.UU, entre outros) correm o risco de colapso. A
falta de água (ou seu excesso nos oceanos devido à extinção das geleiras do
Ártico) tornou-se preocupação real em todo mundo, como recentemente se debateu
no fórum internacional da Conferência de Paris realizada em dezembro de 2015.
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Nós somos a água.
A imagem do primeiro milagre de Jesus de Nazaré indica a passagem para uma
condição mais perfeita. Naquele tempo não havia consciência hodierna a respeito
do desperdício ecológico. Água era apenas água: dom da natureza, sem ligação
com medidas de economia ou correção do desperdício. Em Caná se afirma que a boa
e velha água, simples e tão comum, pode ser ainda melhor, mudada no mais
precioso dos vinhos do mundo como exclamou o Mestre de cerimônias em Caná: “é costume servir primeiro o vinho bom e,
depois, quando os convidados já estão quase embriagados, servir o menos bom.
Mas tu guardaste o vinho melhor até agora”.
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Com todas as
dificuldades (ecológicas, econômicas, políticas e sociais) que o mundo enfrenta
atualmente (guerra e morte, migração e desemprego, poluição e doenças) parece
que é mais fácil dessalinizar a água do mar do que transformar o ser humano. Parece
que precisamos mudar, “da água para o vinho”, como se diz... Trata-se de modificar
completamente culturalmente o modo de viver (antes que seja um “modo de morrer”).
É preciso continuar a festa da vida, na alegria, dançando – todos – no mesmo
baile, da Casa que (deveria ser) comum, compartilhando – todos – os bens da
Terra. Sem fome e sem terrorismo. Sem armas e sem violência.
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Só mudando a
mentalidade, para sermos capazes de reconhecer em nossa sociedade e em nossa
Terra – como nos lembra a 2ª.leitura numa carta de Paulo – que há diversidade de dons, variedade de
serviços e diversas também são as forças, mas um só o Espírito, um só Senhor,
um mesmo Deus que age (dá energia) a tudo e a todos (cf. 1Coríntios
12,4-11). Realmente seria grande o proveito
comum, continua Paulo, se aproveitássemos de uns e outros o bom de cada um:
a sabedoria, o conhecimento, a fé, o dom
de curar doenças, o dom de realizar milagres, de falar palavras divinas, o
discernimento dos espíritos, a comunicação entre línguas: falando-as e
traduzindo-as. Tudo isto vem do mesmo Espírito que espalha seus dons.
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Assim se muda a
água em vinho.
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