Domingo
Hoje se cumpriu esta passagem da Escritura.
Este Evangelho tem duas partes:
1) Início do Evangelho de Lucas, em que ele declara a sua intenção.
2) Jesus, citando o profeta Isaías, expõe o programa da sua missão
libertadora. Essa missão é de salvação integral, voltada prefencialmente para
os excluídos da sociedade: pobres, cativos, cegos e oprimidos.
Par nós, como Igreja, continuarmos essa missão de Jesus a nós confiada,
temos de denunciar qualquer opressão e exploração da pessoa humana. Denunciar e
colaborar na libertação, como fazia Jesus. Temos de praticar e promover a
justiça, combatendo as forças da morte presentes no mundo.
Contudo, não podemos julgar que o Reino de Deus se limita à libertação
temporal, pois seu conteúdo fundamental é a salvação e a graça de Deus. Só a
graça nos traz a completa libertação.
O primeiro passo é a nossa conversão para a justiça e o amor aos irmãos.
Só se entende a libertação se ela partir de dentro de nós. Esse é o nosso
desafio. Os pobres só se libertam quando nós nos tornamos pobres, evitando todo
paternalismo. O paternalismo é justamente o rico ajudando o pobre e continuando
no seu mundo de rico.
A reconstrução da figura original do homem, restabelecida e apresentada
a nós na pessoa de Jesus Cristo, exige transforma “Cristo em minha vida e a
minha vida em Cristo”. Pensar como Jesus pensou, falar como Jesus falou, amar
como Jesus amou, viver como Jesus viveu.
É magnífico o trabalho dos artistas que restauram imagens, pinturas e
afrescos que foram danificados. Cada um de nós é chamado a ser esse artista em
nós mesmos e nos nossos irmãos. É a imagem de Deus, vocação original do homem,
que é restaurada.
“Vós sois o corpo de Cristo” (1Cor 12). O amor mútuo, que nos leva à
mútua colaboração, cada um com o seu dom, faz da Comunidade cristã o corpo vivo
de Cristo presente ali no bairro. “Se alguém disser: “Amo a Deus”, mas odeia o
seu irmão, é mentiroso; pois quem não ama o seu irmão, a quem vê, não poderá
amar a Deus, a quem não vê. Este é o mandamento que dele recebemos: quem ama a
Deus, ame também seu irmão” (1Jo 4,20-21).
Os primeiros cristãos procuraram por em prática essa denúncia de Jesus
às injustiças da sociedade. Por isso muitos foram condenados à morte. Apesar
disso, a Igreja não desiste de continuar essa missão de Jesus.
No programa, Jesus mistura o vertical e o horizontal, a dedicação ao
corpo e a dedicação à alma. Ele não as separa, pois o próprio Criador não separou,
criando-nos corpo, alma e espírito misturados. Quem ama verdadeiramente a Deus,
ama também o seu próximo, privilegiando os excluídos. E esse amor inclui também
a proteção à natureza, evidentemente.
Neste Evangelho, Jesus fala que veio proclamar o “ano da graça do
Senhor”. Essa expressão é sinônima de “ano sabático”. O Povo de Deus do Antigo
Testamento celebrava, a cada sete anos, o ano sabático, que não era nada mais
que o descanso semanal do sábado ampliado para um ano todo. “Durante seis anos
semearás a terra e recolherás os seus frutos. No sétimo ano, porém, deixarás de
cultivar a terra, para que se alimentem os pobres, e os animais selvagens comam
o resto” (Ex 23,10-11).
O “ano da graça do Senhor”, em Isaías (Is 61,1-2), está expresso como
“ano do agrado do Senhor”. Portanto, é viver bem com Deus, obedecendo os seus
mandamentos e fazendo a sua vontade. O livro do Deuteronômio determina que no
ano sabático todas as terras deviam voltar às tribos originais, conforme foi
dividido quando o povo chegou à Terra Santa. Também as dívidas deviam ser
perdoadas e os escravos libertados.
Quando Jesus falou que veio proclamar o ano da graça do Senhor, ele quis
dizer que, de agora para frente, todos os anos são sabáticos. O ano da graça do
Senhor é um ano sabático permanente, não só para todos os anos, mas para todos
os dias do ano. Esta é a lei do novo Povo de Deus, a Igreja.
Esse permanente ano da graça do Senhor, custou a morte de Jesus, como
oferta total dele por nós. Amar não é dar coisas ao próximo, mas buscar a sua
felicidade, mesmo que para isso precisemos sacrificar a nossa vida. “Ninguém
tem maior amor do que aquele dá a vida por seus amigos” (Jo 15,13).
O amor só é verdadeiro se inclui, desde o começo, uma doação da vida. O
amor, ou é total, ou não é amor. Amor parcial não existe, é apenas caricatura
de amor ou egoísmo com o nome de amor. Quando vemos um mendigo na rua e lhe
damos um trocado, ou apenas um sorriso, não lhe estamos dando apenas um trocado
ou um sorriso, mas a nossa vida toda a ele, se necessário for.
O Evangelho mostra também o protagonismo do Espírito Santo na vida, obra
e missão de Jesus. É o Espírito que intervém desde o seu nascimento e batismo.
Nós também fomos ungidos pelo Espírito Santo no Batismo e na Crisma, a fim de
atuar como Cristo atuou, vencendo o mal do mundo e sendo mensageiro da Boa
Nova.
Havia, certa vez, um homem que admirava muito a criação de Deus, mas
vivia encabulado com uma coisa: Por que nunca chegamos até o horizonte? A gente
olha, ele está a um km de nós. Se caminhamos até lá, ele já foi para frente e
está a mais um km de dós. Não entendo, dizia ele. E nas suas orações sempre
pedia uma explicação para Deus.
Um dia, Deus apareceu para ele em sonho e lhe disse: “É para que você
esteja sempre caminhando! O horizonte faz você ir para frente, por isso que
você nunca o atinge”.
A continuidade da missão de Jesus na libertação tanto de nós mesmos como
dos nossos irmãos, é como o horizonte. É um trabalho contínuo que só
concluiremos no final da nossa vida, quando nos encontrarmos com Deus.
Maria Santíssima, a discípula fiel do Senhor, viveu de forma plena esse
programa do seu Filho. Que ela nos ajude a vivê-lo também.
Hoje se cumpriu esta passagem da Escritura.
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