domingo, 30 de junho de 2019

"... O FILHO DO HOMEM NÃO TEM ONDE RECLINAR A CABEÇA.” – Olivia Coutinho


Dia 01 de Julho de 2019

Evangelho de Mt8,18-22

Quantos  de nós, passamos grande parte da nossa vida, nos preocupando excessivamente com o futuro, deixando  de viver o momento presente.  A cada amanhecer de um novo dia, Deus coloca em nossas mãos uma página em branco, que é o momento presente, cabe a nós, escrever nesta página, mais um capítulo da nossa história. História, que poderá ficar gravada no coração de Deus como  nosso passaporte para o céu, só  vai depender das  nossas escolhas. De uma coisa podemos ter certeza: quem colocar Jesus como centralidade da sua vida, vai escrever  uma bela história!
Nenhum de nós, nasceu  do acaso, somos frutos do amor de Deus, plantados aqui na terra, para produzir frutos e só iremos produzir frutos de boa qualidade, se estivermos ligados a Jesus, pois Ele  é a seiva que irriga todo o nosso ser, que  nos possibilita produzir os frutos esperados por Deus.
O evangelho que a liturgia de hoje nos convida  refletir, deixa-nos uma mensagem muito clara: para seguir Jesus,  é preciso estar disposto a enfrentar desafios.
A todo instante, somos chamados a seguir Jesus, Ele faz uso de várias formas para nos chamar, o importante é  não deixarmos que o  seu chamado  fique sem resposta. Devemos estar sempre atentos  com os nossos sentidos bem apurados para não confundirmos o chamado de Jesus, com o chamado do mundo, Jesus nos chama para a vida, o mundo nos chama para a morte.
Nossa vida não nos foi dada para ficar guardada, e nem para ser vivida com reservas, Deus quer que todos nós, vivamos intensamente, pois foi para nos encher de vida, que Ele enviou o seu Filho ao mundo! Jesus veio dar um sentido novo ao nosso existir, nos libertar de nossas próprias amarras. Ele nos convida a entrarmos no seu barco, a nos embrenharmos no mar da vida, remando até mesmo contra a maré.  Pena, que muitos de nós, não respondemos  ao chamado de Jesus, nos escondendo atrás das mais variadas desculpas: "Não vou dar conta, vou terminar  meus estudos primeiro, vou esperar meus filhos crescerem, depois que eu me aposentar..." E assim, vamos arrumando mil desculpas para fugir ao compromisso assumido  no nosso Batismo.
O seguimento a Jesus é exigente, implica em mudança radical no nosso modo de viver, exige de nós, muito mais do que boa vontade, exige compromisso, fidelidade, disposição, desapego... Jesus não nos ilude com facilidades, mas nos garante uma grande recompensa: a vida eterna como herança. Ele é o caminho a verdade e a vida, nossa opção por Ele, tem que ser radical, do contrário, ficamos às margens, como meros expectados dos acontecimentos, cristão pela metade, aquele que escolhe a parte mais fácil da fé, que separa a fé da vida...
Seguir Jesus é optar pela vida,  é estar disposto a buscar algo novo, a enfrentar desafios, a sair das margens e avançar para águas mais profundas.

FIQUE NA PAZ DE JESUS! – Olivia Coutinho
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14º DOMINGO DO TEMPO COMUM-C-Dehonianos



7 Julho 2019
ANO C
14º DOMINGO DO TEMPO COMUM
Tema do 14º Domingo do Tempo Comum
Embora as leituras de hoje nos projectem em sentidos diversos, domina a temática do “envio”: na figura dos 72 discípulos do Evangelho, na figura do profeta anónimo que fala aos habitantes de Jerusalém do Deus que os ama, ou na figura do apóstolo Paulo que anuncia a glória da cruz, somos convidados a tomar consciência de que Deus nos envia a testemunhar o seu Reino.
É, sobretudo, no Evangelho que a temática do “envio” aparece mais desenvolvida. Os discípulos de Jesus são enviados ao mundo para continuar a obra libertadora que Jesus começou e para propor a Boa Nova do Reino aos homens de toda a terra, sem excepção; devem fazê-lo com urgência, com simplicidade e com amor. Na acção dos discípulos, torna-se realidade a vitória do Reino sobre tudo o que oprime e escraviza o homem.
Na primeira leitura, apresenta-se a palavra de um profeta anónimo, enviado a proclamar o amor de pai e de mãe que Deus tem pelo seu Povo. O profeta é sempre um enviado que, em nome de Deus, consola os homens, liberta-os do medo e acena-lhes com a esperança do mundo novo que está para chegar.
Na segunda leitura, o apóstolo Paulo deixa claro qual o caminho que o apóstolo deve percorrer: não o podem mover interesses de orgulho e de glória, mas apenas o testemunho da cruz – isto é, o testemunho desse Jesus, que amou radicalmente e fez da sua vida um dom a todos. Mesmo no sofrimento, o apóstolo tem de testemunhar, com a própria vida, o amor radical; é daí que nasce a vida nova do Homem Novo.
LEITURA I – Is 66,10-14c
Leitura do Livro de Isaías
Alegrai-vos com Jerusalém,
exultai com ela, todos vós que a amais.
Com ela enchei-vos de júbilo,
todos vós que participastes no seu luto.
Assim podereis beber e saciar-vos
com o leite das suas consolações,
podereis deliciar-vos no seio da sua magnificência.
Porque assim fala o Senhor:
«Farei correr para Jerusalém a paz como um rio
e a riqueza das nações como torrente transbordante.
Os seus meninos de peito serão levados ao colo
e acariciados sobre os joelhos.
Como a mãe que anima o seu filho,
também Eu vos confortarei:
em Jerusalém sereis consolados.
Quando o virdes, alegrar-se-á o vosso coração
e, como a verdura, retomarão vigor os vossos membros.
A mão do Senhor manifestar-se-á aos seus servos.
AMBIENTE
Os capítulos 56-66 do Livro de Isaías (designados genericamente como “Trito-Isaías”) são atribuídos pela maior parte dos estudiosos a diversos autores, vinculados espiritualmente ao Deutero-Isaías (o autor dos capítulos 40-55 do Livro de Isaías). Sobre esses autores não sabemos rigorosamente nada, a não ser que apresentaram a sua mensagem nos últimos anos do séc. VI e primeiros anos do séc. V a.C.
Estamos em Jerusalém, vários anos após o regresso do Exílio da Babilónia. A reconstrução faz-se muito lentamente e em condições penosas; a maioria da população de Jerusalém está mergulhada na miséria; os inimigos atacam continuamente e põem em causa o esforço da reconstrução; a esperança está em crise… O Povo pergunta: “quando é que Deus vai realizar as promessas que fez, ainda na Babilónia, através do Deutero-Isaías?”
Os profetas da época procuram, então, apresentar uma mensagem de salvação e alimentar a esperança, a fim de que o Povo recobre forças e confie em Deus. É nesse contexto que podemos situar este hino que a primeira leitura de hoje nos propõe: o profeta apresenta um quadro de restauração da cidade (cf. Is 66,7-14) e convoca os seus habitantes para a alegria.
MENSAGEM
Neste quadro de restauração, o objectivo fundamental do profeta é “consolar” esse Povo martirizado, sofrido, angustiado, que não vê grandes perspectivas de futuro e já perdeu a esperança. Como é que o profeta vai “dizer” a mensagem que Deus lhe confiou?
Todo o quadro gira à volta da apresentação de Jerusalém como mãe. Depois de dar à luz o seu filho (o povo), sem esforço e antes do tempo (cf. Is 66,7), a mãe/Jerusalém alimenta-o com um leite abundante e reconfortante (cf. Is 66,11). As expressões utilizadas (a referência ao “sugar o leite até à saciedade”, ao “seio glorioso”) evocam, de forma bem sugestiva, a imagem da fecundidade, da riqueza, da vida em abundância. Tudo é fácil, rápido, abundante, pleno… No entanto, o profeta está consciente de que é Deus que está por detrás desta corrente de vida e de fecundidade que a mãe/cidade dispensa ao filho/povo.
Na “tradução” da imagem, o profeta põe Deus a fazer chegar à cidade/mãe (para que depois ela distribua pelo filho/povo) a paz e a riqueza das nações. A paz (“shalom”) exprime aqui bem mais do que a ausência de guerra: inclui saúde, fecundidade, prosperidade, amizade com Deus e com os outros; é, portanto, sinónimo de felicidade total. É isso que Deus quer para o seu Povo e que Se propõe oferecer-lhe em abundância.
Particularmente sugestiva é a forma como se fala de Deus. Ele é o pai que dá ao filho/povo a vida abundante e plena, que o acaricia e consola como uma mãe. O profeta propõe ao seu Povo um Deus que ama e que, em cada dia, vem ao encontro dos homens para lhes trazer a salvação. Daí o insistente convite à alegria.
ACTUALIZAÇÃO
Considerar as seguintes questões, para a reflexão:
• Esta proposta de “consolação” vem de Deus e atinge o coração do Povo através da acção e do testemunho profético. É através do profeta que Deus actua no mundo, que consola os corações feridos, que revitaliza a esperança, que salva da morte, que liberta do medo… Todos os crentes são profetas e todos comungam desta missão. Eu assumo e procuro concretizar, dia a dia, esta proposta profética e procuro testemunhar a esperança?
• Deus é o pai que dá vida em abundância e a mãe que acaricia e consola. É esta a perspectiva que temos d’Ele? Sabemos “ler” a nossa vida à luz da bondade de Deus, ver nos acontecimentos sinais do seu amor? Sabemos manifestar-Lhe a nossa gratidão? É este Deus de amor que procuramos testemunhar, com palavras e com gestos?
• O insistente convite à alegria feito pelo profeta atinge-nos também a nós… O medo e a angústia não podem ser os nossos companheiros de viagem, pois acreditamos no amor e na bondade desse Deus que nos acompanha, que nos acaricia, que nos consola e que faz nascer para nós, dia a dia, esse mundo novo de vida plena e abundante.
• Aqueles que a vida feriu e que perderam a esperança encontram nas nossas comunidades (cristãs ou religiosas) um testemunho que os consola e que os anima? Que temos para transmitir aos doentes incuráveis, aos que perderam a família e as referências e vivem na rua, aos imigrantes explorados, aos marginalizados, aos fracassados?
SALMO RESPONSORIAL – Salmo 65 (66)
Refrão: A terra inteira aclame o Senhor.
Aclamai a Deus, terra inteira,
cantai a glória do seu nome,
celebrai os seus louvores, dizei a Deus:
«Maravilhosas são as vossas obras».
A terra inteira Vos adore e celebre,
entoe hinos ao vosso nome.
Vinde contemplar as obras de Deus,
admirável na sua acção pelos homens.
Mudou o mar em terra firme,
atravessaram o rio a pé enxuto.
Alegremo-nos n’Ele:
domina eternamente com o seu poder.
Todos os que temeis a Deus, vinde e ouvi,
vou narrar-vos quanto Ele fez por mim.
Bendito seja Deus que não rejeitou a minha prece,
nem me retirou a sua misericórdia.
LEITURA II – Gal 6,14-18
Leitura da Epístola do apóstolo São Paulo aos Gálatas
Irmãos:
Longe de mim gloriar-me,
a não ser na cruz de Nosso Senhor Jesus Cristo,
pela qual o mundo está crucificado para mim
e eu para o mundo.
Pois nem a circuncisão nem a incircuncisão valem alguma coisa:
o que tem valor é a nova criatura.
Paz e misericórdia para quantos seguirem esta norma,
bem como para o Israel de Deus.
Doravante ninguém me importune,
porque eu trago no meu corpo os estigmas de Jesus.
Irmãos, a graça de Nosso Senhor Jesus Cristo
esteja com o vosso espírito. Amen.
AMBIENTE
Terminamos hoje a leitura da Carta aos Gálatas. Nos domingos anteriores, já dissemos qual é a questão fundamental abordada nesta carta: face às exigências dos “judaízantes” (segundo os quais os cristãos, além de acreditar em Cristo, devem cumprir escrupulosamente a Lei de Moisés e, de forma especial, aderir à circuncisão), Paulo considera que só Cristo interessa e que tudo o resto são leis e ritos desnecessários ou, ainda pior, geradores de escravidão.
Este texto pertence à conclusão da carta (cf. Gal 6,11-18). É uma espécie de remate, no qual Paulo resume toda a sua argumentação anterior a propósito de Cristo, da Lei e da salvação.
MENSAGEM
Paulo começa por denunciar quais os interesses que movem os “judaízantes” que pregam a circuncisão: eles têm por finalidade evitar a perseguição (fazendo do cristianismo apenas um ramo do judaísmo e, por isso, uma “religião lícita” aos olhos do império); além disso, são pessoas desejosas de se evidenciar, para quem a circuncisão que impõem aos outros serve para mostrar o sucesso do seu proselitismo (o “prosélito” era um pagão convertido à observância da fé judaica)…
Isso não tem qualquer importância para Paulo. O único título de glória que interessa ao apóstolo é a cruz de Nosso Senhor Jesus Cristo. Falar da “cruz de Jesus Cristo” é falar do dom total da vida, da entrega de Si mesmo por amor. Esse (e não a circuncisão ou a prática dos rituais da Lei de Moisés) é que é o grande objectivo de Paulo e da sua pregação, pois é a morte para o egoísmo e o nascimento para o amor (cumpridos e representados na cruz) que fazem surgir o “Homem Novo”, o “Israel de Deus”, o novo Povo de Deus.
Precisamente aqui (vers. 15), Paulo inaugura um dos seus temas favoritos, ao qual voltará nas cartas posteriores: o tema do Homem Novo em Cristo Jesus. Na perspectiva paulina, a identificação do cristão com o Cristo da cruz – isto é, com o Cristo do amor total – fará surgir um Homem Novo, liberto do egoísmo e da preocupação consigo próprio, capaz de amar sem medida. Esse Homem Novo, imagem de Jesus Cristo, será capaz de superar o pecado e a morte e de chegar à vida plena, à felicidade total.
De resto, o próprio Paulo luta pessoalmente para chegar a esse objectivo. Aliás, ele já leva “no seu corpo as marcas de Jesus” (vers. 17). Esta indicação não parece referir-se à presença no corpo de Paulo dos sinais físicos da paixão de Jesus (“estigmas”), mas às cicatrizes reais deixadas pelas feridas recebidas por Paulo no exercício do seu apostolado. Na sociedade greco-romana, cada escravo levava uma marca, como sinal da sua pertença a um determinado dono; assim, as marcas do seu sofrimento por causa do Evangelho mostram que Paulo pertence a Cristo, que é propriedade d’Ele: por elas, Paulo demonstra a sua vontade de amar, de dar a vida e a sua pertença inalienável a esse Cristo cujo amor se fez entrega na cruz.
Esta carta é a única em que a palavra “irmãos” aparece na saudação final (vers. 18): é um grito, ao mesmo tempo de angústia e de confiança, que apela à comunhão e que manifesta a esperança no restabelecimento da fraternidade.
ACTUALIZAÇÃO
Para a reflexão, considerar as seguintes questões:
• Como Paulo, cada crente é um enviado a testemunhar o Cristo da cruz – quer dizer, a anunciar a todos os homens que só no amor radical, no amor até às últimas consequências se gera vida e nasce o Homem Novo. Este caminho é, no entanto, um caminho de exigência, pois conduz ao confronto com o pecado, com o egoísmo, com a injustiça, com a opressão. Eu estou, como Paulo, disposto a percorrer este caminho, com coragem profética?
• Existe, por vezes, alguma perplexidade acerca da identidade fundamental do cristão. Qual é, verdadeiramente, a essência da nossa experiência cristã? O discípulo de Cristo é alguém que se distingue pelo uniforme que veste, pela cruz que traz ao pescoço, pelo papel que alguém assinou por ele no dia do baptismo, pelos ritos que cumpre, pela observância de certas leis, ou é alguém que se distingue pela sua identificação com Cristo – com o Cristo do amor, da entrega, do dom da vida?
• Quais são, verdadeiramente os nossos títulos de glória: a conta bancária, os diplomas universitários, o estatuto social, o êxito profissional, a visibilidade nas festas do “jet-set”, os “fans” incondicionais que circulam à nossa volta? Ou são os gestos de amor, de partilha, de doação, de entrega e as feridas recebidas a lutar pela justiça, pela verdade e pela paz?
ALELUIA – Col 3,15a.16a
Aleluia. Aleluia.
Reine em vossos corações a paz de Cristo,
habite em vós a sua palavra.
EVANGELHO – Lc 10,1-12.17-20
Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Lucas
Naquele tempo,
designou o Senhor setenta e dois discípulos
e enviou-os dois a dois à sua frente,
a todas as cidades e lugares aonde Ele havia de ir.
E dizia-lhes:
«A seara é grande, mas os trabalhadores são poucos.
Pedi ao dono da seara
que mande trabalhadores para a sua seara.
Ide: Eu vos envio como cordeiros para o meio de lobos.
Não leveis bolsa nem alforge nem sandálias,
nem vos demoreis a saudar alguém pelo caminho.
Quando entrardes nalguma casa,
dizei primeiro: ‘Paz a esta casa’.
E se lá houver gente de paz,
a vossa paz repousará sobre eles:
senão, ficará convosco.
Ficai nessa casa, comei e bebei do que tiverem,
que o trabalhador merece o seu salário.
Não andeis de casa em casa.
Quando entrardes nalguma cidade e vos receberem,
comei do que vos servirem,
curai os enfermos que nela houver
e dizei-lhes: ‘Está perto de vós o reino de Deus’.
Mas quando entrardes nalguma cidade e não vos receberem,
saí à praça pública e dizei:
‘Até o pó da vossa cidade que se pegou aos nossos pés
sacudimos para vós.
No entanto, ficai sabendo:
Está perto o reino de Deus’.
Eu vos digo:
Haverá mais tolerância, naquele dia, para Sodoma
do que para essa cidade».
Os setenta e dois discípulos voltaram cheios de alegria, dizendo:
«Senhor, até os demónios nos obedeciam em teu nome».
Jesus respondeu-lhes:
«Eu via Satanás cair do céu como um relâmpago.
Dei-vos o poder de pisar serpentes e escorpiões
e dominar toda a força do inimigo;
nada poderá causar-vos dano.
Contudo, não vos alegreis porque os espíritos vos obedecem;
alegrai-vos antes
porque os vossos nomes estão escritos nos Céus».
AMBIENTE
O Evangelho situa-nos, outra vez, no contexto da caminhada de Jesus para Jerusalém. Apresenta-nos mais uma etapa desse “caminho espiritual”, durante o qual Jesus vai oferecendo aos discípulos a plenitude da revelação do Pai e preparando-os para continuar, após a sua partida, a missão de levar o Evangelho a todos os homens.
A história do envio dos 72 discípulos é uma tradição exclusiva de Lucas. Seria uma história estranha e inesperada, se a víssemos como um relato fotográfico de acontecimentos concretos: de onde vêm estes 72, que não são nomeados nem por Mateus nem por Marcos e que aqui aparecem surgidos do nada? Trata-se, fundamentalmente, de uma catequese através da qual Lucas propõe, aos discípulos de todas as épocas, uma reflexão sobre a missão da Igreja, em caminhada pelo mundo.
MENSAGEM
Trata-se, portanto, de uma catequese. Nela, Lucas ensina que o cristão tem de continuar no mundo a missão de Jesus, tornando-se testemunha, para todos os homens, dessa proposta de salvação/libertação que Cristo veio trazer.
O texto começa por nos apresentar o número dos discípulos enviados: 72 (vers. 1). Trata-se, evidentemente, de um número simbólico, que deve ser posto em relação com Gn 10 (na versão grega do Antigo Testamento), onde esse número se refere à totalidade das nações pagãs que habitam a terra. Significa, portanto, que a proposta de Jesus é uma proposta universal, destinada a todos os povos, de todas as raças.
Depois, Lucas assinala que os discípulos foram enviados dois a dois. Trata-se de assegurar que o seu testemunho tem valor jurídico (cf. Dt 17,6; 19,15); e trata-se de sugerir que o anúncio do Evangelho é uma tarefa comunitária, que não é feita por iniciativa pessoal e própria, mas em comunhão com os irmãos.
Lucas indica, ainda, que os discípulos são enviados às aldeias e localidades onde Jesus “devia de ir”. Dessa forma, indica que a tarefa dos discípulos não é pregar a sua própria mensagem, mas preparar o caminho de Jesus e dar testemunho d’Ele.
Depois desta apresentação inicial, Lucas passa a descrever a forma como a missão se deve concretizar.
Há, em primeiro lugar, um aviso acerca da dificuldade da missão: os discípulos são enviados “como cordeiros para o meio de lobos” (vers. 3). Trata-se de uma imagem que, no Antigo Testamento, descreve a situação do justo, perdido no meio dos pagãos (cf. Ben Sira 13,17; nalgumas versões, esta imagem aparece em 13,21). Aqui, expressa a situação do discípulo fiel, frente à hostilidade do mundo.
Há, em segundo lugar, uma exigência de pobreza e simplicidade para os discípulos em missão: os discípulos não devem levar consigo nem bolsa, nem alforge, nem sandálias; não devem deter-se a saudar ninguém pelo caminho (vers. 4); também não devem saltar de casa em casa (vers. 7). As indicações de não levar nada para o caminho sugerem que a força do Evangelho não reside nos meios materiais, mas na força libertadora da Palavra; a indicação de não saudar ninguém pelo caminho indica a urgência da missão (que não permite deter-se nas intermináveis saudações típicas da cortesia oriental, sob pena de o essencial – o anúncio do Reino – ser continuamente adiado); a indicação de que não devem saltar de casa em casa sugere que a preocupação fundamental dos discípulos deve ser a dedicação total à missão e não o encontrar uma hospitalidade mais confortável.
Qual deve ser o anúncio fundamental que os discípulos apresentam? Eles devem começar por anunciar “a paz” (vers 5-6). Não se trata aqui, apenas, da saudação normal entre os judeus, mas do anúncio dessa paz messiânica que preside ao Reino. É o anúncio desse mundo novo de fraternidade, de harmonia com Deus e com os outros, de bem-estar, de felicidade (tudo aquilo que é sugerido pela palavra hebraica “shalom”). Esse anúncio deve ser complementado por gestos concretos de libertação, que mostrem a presença do Reino no meio dos homens (vers. 9).
As palavras de ameaça a propósito das cidades que se recusam a acolher a mensagem (vers. 10-11) não devem ser tomadas à letra: são uma forma bem oriental de sugerir que a rejeição do Reino trará consequências nefastas à vida daqueles que escolhem continuar a viver em caminhos de egoísmo, de orgulho e de auto-suficiência.
Nos vers. 17-20, Lucas refere o resultado da acção missionária dos discípulos. As palavras com que Jesus acolhe os discípulos descrevem, figuradamente, a presença do Reino enquanto realidade libertadora (as serpentes e escorpiões são, frequentemente, símbolos das forças do mal que escravizam o homem; a “queda de Satanás” significa que o reino do mal começa a desfazer-se, em confronto com o Reino de Deus).
Apesar do êxito da missão, Jesus põe os discípulos de sobreaviso para o orgulho pela obra feita: eles não devem ficar contentes pelo poder que lhes foi confiado, mas sim porque os seus nomes estão “inscritos no céu” (a imagem de um livro onde estão inscritos os nomes dos eleitos é frequente nesta época, particularmente nos apocalipses – cf. Dn 12,1; Ap 3,5; 13,8; 17,8; 20,12.15; 21,27).
ACTUALIZAÇÃO
Para a reflexão, considerar as seguintes questões:
• O Evangelho que hoje nos é proposto sugere, essencialmente, que os discípulos – a totalidade dos discípulos – são responsáveis pela continuação no mundo do projecto libertador de Jesus, do projecto do Reino. Estamos verdadeiramente conscientes disto? Como é que, na prática, anunciamos Jesus? Jesus já chegou, efectivamente, ao nosso local de trabalho, à nossa escola, à nossa paróquia, à nossa comunidade religiosa? De quem é a responsabilidade, se Jesus ainda parece estar ausente de tantos sectores da vida de hoje? Conseguimos dormir tranquilos quando o egoísmo, a injustiça, a escravidão assentam arraiais à nossa volta e impedem o Reino de acontecer?
• O ser “cordeiro no meio de lobos” e o não levar “nem bolsa, nem alforge, nem sandálias” sugere que o anúncio do Reino não depende do poder dos instrumentos utilizados. Procurar conquistar poder económico ou político para depois impor o Evangelho, controlar os mass-media ou utilizar sofisticadas técnicas de marketing para “vender” a proposta do Reino é negar a essência do Evangelho – que é amor, partilha, serviço, vividos na simplicidade, na humildade, no despojamento…
• O “não andeis de casa em casa” sugere que o missionário deve contentar-se com aquilo que põem à sua disposição e viver com simplicidade e sem exigências. O seu objectivo não é enriquecer ou viver de acordo com o último grito do conforto ou da moda; a sua prioridade é o anúncio do Reino: tudo o mais é secundário.
• O anúncio do “Reino” não se esgota em palavras, mas deve ser acompanhado de gestos concretos… O missionário tem de mostrar nos seus gestos o amor, o serviço, o perdão, a doação que ele anuncia em palavras (se isso não acontecer, o seu testemunho é oco, hipócrita, incoerente e não convencerá ninguém).
ALGUMAS SUGESTÕES PRÁTICAS PARA O 14º DOMINGO DO TEMPO COMUM
(em parte adaptadas de “Signes d’aujourd’hui”)
1. A PALAVRA MEDITADA AO LONGO DA SEMANA.
Ao longo dos dias da semana anterior ao 14º Domingo do Tempo Comum, procurar meditar a Palavra de Deus deste domingo. Meditá-la pessoalmente, uma leitura em cada dia, por exemplo… Escolher um dia da semana para a meditação comunitária da Palavra: num grupo da paróquia, num grupo de padres, num grupo de movimentos eclesiais, numa comunidade religiosa… Aproveitar, sobretudo, a semana para viver em pleno a Palavra de Deus.
2. ACOLHER OS FIÉIS DE PASSAGEM.
Os textos de hoje convidam-nos à alegria, a ver longe… Neste domingo e ao longo dos meses de Julho e Agosto (tempo de férias, de passagens…), deveria haver uma atenção particular aos fiéis de passagem. Logo no início da celebração, poder-se-á fazer uma referência e, se possível, uma breve apresentação (sobretudo nas assembleias menos numerosas). Poderá haver mesmo uma saudação inicial aos fiéis de passagem que estão na assembleia. O celebrante pode ainda dirigir algumas palavras noutra língua, no caso de haver um bom grupo de estrangeiros. O importante é que eles se sintam acolhidos como irmãos em comunhão na Eucaristia.
3. ECO AO EVANGELHO.
A paz na construção do Reino de Deus… Seria bom “noticiar”, nos avisos finais, algumas acções concretas que acontecem no nosso mundo, no nosso país, no lugar onde estamos… a favor da paz e da construção do reino de Deus. Se possível, alguma acção onde os cristãos se possam envolver directamente…
4. ORAÇÃO NA LECTIO DIVINA.
Na meditação da Palavra de Deus (lectio divina), pode-se prolongar o acolhimento das leituras com a oração.
No final da primeira leitura:
“Deus fiel, que velas o teu Povo como uma mãe o seu filho, nós Te damos graças pelas consolações que Tu lhe anunciaste outrora, quando estava desanimado e desorientado.
Confiamos-Te a nossa solidariedade para com os exilados e as vítimas das catástrofes, das guerras e das violências, para com todos aqueles que são expulsos das suas casas”.
No final da segunda leitura:
“Pai, nós Te damos graças pela cruz de Nosso Senhor Jesus Cristo. Era um instrumento de morte, mas tornou-se para nós e para o mundo inteiro a origem de uma nova criação e de um novo Israel de Deus.
Nós Te pedimos por todos os nossos irmãos que trazem no seu corpo a marca dos sofrimentos. Que a graça de Nosso Senhor Jesus Cristo esteja sempre com o nosso espírito”.
No final do Evangelho:
“Mestre da seara, bendito sejas pelo teu Filho Jesus, pelos setenta e dois discípulos e todos os missionários que nos revelaram a presença do teu Reino. Nós Te bendizemos, porque os nossos nomes estão inscritos nos céus.
Mestre da seara, nós Te pedimos: que o teu reino venha, haja paz nas nossas casas! Envia operários para a tua seara”.
5. BILHETE DE EVANGELHO.
Jesus envia os seus discípulos dois a dois, porque está consciente daquilo que lhes é confiado: uma mensagem difícil de proclamar, nem sempre bem recebida. Ele sugere-lhes para rezar para que sejam numerosos no campo da seara; se há trabalho, são precisos trabalhadores. Previne-os: a sua fragilidade encontrará forças hostis. Devem pregar o Reino de Deus, mas Satanás espera-os e procurará impedir o estabelecimento deste mundo melhor. Jesus pede-lhes para estarem completamente despojados de dinheiro, de saco, de sandálias, de congratulações, para estarem apenas preocupados com o crescimento do Reino que se reconhece no dom da Paz e com o levantar dos homens e mulheres que a doença impede de estar de pé. Os discípulos podem, então, pôr-se a caminho. Estão prevenidos, Jesus não os deixa na ilusão. É respeitando este contracto que encontrarão a felicidade, a alegria completa.
6. À ESCUTA DA PALAVRA.
«A seara é grande, mas os trabalhadores são poucos. Pedi ao dono da seara que mande trabalhadores para a sua seara». É nesta palavra que se baseia a “oração pelas vocações”, em particular pelas vocações ao ministério presbiteral. Jesus dirige-se, primeiramente, a 72 discípulos que designou para além dos Doze Apóstolos. Os nomes têm muitas vezes um sentido simbólico. A tradução grega do Génesis (capítulo 10) dá uma lista de todas as nações que povoam a terra: 72! Podemos, assim, compreender que Jesus envia os discípulos a todas as nações. A missão de anunciar o Evangelho não está reservada apenas ao grupo dos Doze, é confiada, finalmente, a todos os discípulos, para irem até aos confins da terra. É toda a Igreja que é constituída missionária e missionada! Rezar pelas “vocações” é pedir a Deus para fazer de cada baptizado um testemunho da Boa Nova da salvação dada em Jesus. E se os trabalhadores são poucos, é talvez porque os baptizados não estão ainda suficientemente conscientes da sua missão. Em Igreja, normalmente não deveria haver cristãos que se contentam em ser “consumadores espirituais”. Todos são chamados a ser “pedras vivas”. Além disso, a seara não pertence aos ceifeiros. É a seara do mestre, que envia trabalhadores para a “sua seara”. Não se trata de um mero detalhe! É Deus que, em Jesus, semeou a boa semente. Este grão, de seguida, cresceu sozinho, até ao tempo da ceifa. Os trabalhadores vêm recolher o fruto de um trabalho que os precedeu. Os ceifeiros nunca devem esquecer que um Outro está em acção há muito tempo no coração dos homens para neles semear o grão do seu amor. Todo o ministério na Igreja está apenas ao serviço do Espírito Santo, já presente no segredo de cada ser humano. Então, compreendemos melhor o porquê de estes servos não deverem agir como se o êxito do seu ministério dependesse exclusivamente dos seus esforços!
7. ORAÇÃO EUCARÍSTICA.
Oração Eucarística I. É longa, mas é uma oportunidade para fazer memória dos santos que deram a sua vida pelo Reino. Depois dos nomes de Matias e Barnabé, pode-se acrescentar: “de todos os discípulos que o Senhor enviou a trabalhar na sua seara e de todos os santos…”
8. PALAVRA PARA O CAMINHO…
“Ide! Envio-vos!” Julho/Agosto: multidões deslocam-se para lugares turísticos. Para uns, tempo de distância da prática religiosa. Para outros, ocasião para recuperar energias na fé. “A seara é grande, mas os trabalhadores são poucos. Ide! Envio-vos!” Como os setenta e dois discípulos, eis-nos enviados àqueles que encontraremos neste verão. Com quem iremos “perder tempo” para falar desta espantosa notícia: “Está perto de vós o reino de Deus”? E porque não ocuparmos as férias (ou em parte delas) numa acção de voluntariado, no nosso país ou em país de missão?!
https://youtu.be/krAmZSXyxhA
UNIDOS PELA PALAVRA DE DEUS
PROPOSTA PARA
ESCUTAR, PARTILHAR, VIVER E ANUNCIAR A PALAVRA NAS COMUNIDADES DEHONIANAS
Grupo Dinamizador:
P. Joaquim Garrido, P. Manuel Barbosa, P. José Ornelas Carvalho
Província Portuguesa dos Sacerdotes do Coração de Jesus (Dehonianos)
Rua Cidade de Tete, 10 – 1800-129 LISBOA – Portugal
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Que tens a ver connosco, Filho de Deus?-Dehonianos


3 Julho 2019
Lectio
Primeira leitura: Génesis 21, 5.8-20
Abraão tinha cem anos quando nasceu Isaac, seu filho. O filho cresceu até à idade em que deixou de mamar, e nesse dia Abraão ofereceu um grande banquete. 9Sara viu que o filho que a egípcia Agar dera a Abraão estava a brincar. 10E ela disse a Abraão: «Expulsa esta escrava e o filho, porque o filho desta escrava não herdará com o meu filho Isaac.» 11Esta frase desgostou profundamente Abraão, por causa de Ismael, seu filho. 12Mas Deus disse-lhe: «Não te preocupes com a criança e com a tua escrava. Faz tudo quanto Sara te pedir, pois de Isaac há-de nascer a descendência que usará o teu nome. 13Contudo, farei sair também uma nação do filho da escrava, porque também ele é teu filho.» 14No dia seguinte de manhã, Abraão tomou pão e um odre de água, deu-o a Agar e pô-lo sobre os ombros dela; depois, mandou-a embora com o seu filho. Ela partiu e, embrenhando-se no deserto de Bercheba, por lá andou ao acaso. 15Tendo-se acabado a água do odre, deixou o filho debaixo de um arbusto 16e foi sentar-se do lado oposto, à distância de um tiro de arco, porque dizia: «Não quero ver o meu filho morrer.» Sentou-se, pois, do lado oposto e começou a chorar. 17Deus escutou a voz do menino, e o mensageiro de Deus chamou do céu Agar e disse-lhe: «Que tens tu, Agar? Nada temas, porque Deus ouviu a voz do menino, do lugar em que está. 18Ergue-te, vai buscar outra vez o teu filho, toma-o pela mão, pois farei nascer dele um grande povo.» 19Deus abriu-lhe os olhos e ela viu um poço onde foi encher o odre e deu de beber ao filho. 20Deus protegeu o menino. Ele cresceu, residiu no deserto e tornou-se um hábil arqueiro.
A narrativa do nosso texto deve ser lida em paralelo com o capítulo 16, pois provavelmente se trata de uma variante da mesma tradição. O objectivo desta narrativa é o mesmo. Quer mostrar que o projecto de Deus avança, apesar da mesquinhez humana. Além disso, mais uma vez se dá uma explicação popular dos nomes de Isaac (v. 9) e de Ismael (v. 17).
O banquete que assinala o desmame do filho da promessa oferece a ocasião para confrontar os dois filhos de Abraão. Esta narrativa, ao contrário da de Gn 16, apresenta Ismael quase da mesma idade que Isaac que brinca com ele. É o suficiente para suscitar os ciúmes de Sara, que pressiona Abraão para que afaste o filho de Sara (. 10). A reacção de Deus, que apoia a posição de Sara, não seria de esperar (cf. v. 12). Mas, mais uma vez, vemos como os caminhos de Deus são diferentes dos nossos. O Senhor convida Abraão a não afastar o filho Ismael, porque também ele será pai de numerosa descendência. É um momento carregado de emoções, bem apresentado pelo autor sagrado. Deus é sempre aquele que escuta o grito do pobre e do oprimido que, neste caso, são Agar e o filho destinado a morrer. O «mensageiro de Deus» abriu os olhos a Agar que viu um poço perto dela e deu de beber ao filho. A intervenção divina deu coragem a Agar e perspectivou um futuro feliz para Ismael. Assim se vão delineando os destinos de dois povos irmãos, os ismaelitas e os israelitas, ainda hoje unidos por um destino de hostilidades e de partilhas.
Evangelho: Mateus 8, 28-34
Naquele tempo, 28quando Jesus chegou à outra margem, à região dos gadarenos, vieram ao seu encontro dois possessos, que habitavam nos sepulcros. Eram tão ferozes que ninguém podia passar por aquele caminho. 29Vendo-o, disseram em alta voz: «Que tens a ver connosco, Filho de Deus? Vieste aqui atormentar-nos antes do tempo?» 30Ora, andava a pouca distância dali, a pastar, uma grande vara de porcos. 31E os demónios pediram-lhe: «Se nos expulsas, manda-nos para a vara de porcos.» 32Disse-lhes Jesus: «Ide!» Então, eles, saindo, entraram nos porcos, que se despenharam por um precipício, no mar, e morreram nas águas. 33Os guardas fugiram e, indo à cidade, contaram tudo o que se tinha passado com os possessos. 34Toda a cidade saiu ao encontro de Jesus e, vendo-o, rogaram-lhe que se retirasse daquela região.
Mais uma vez, Mateus retoma uma história do Evangelho de Marcos (Mc 5, 1-20), contando-a de modo mais sintético. Por exemplo, ao falar dos porcos, refere uma grande vara, e não de cerca de dois mil porcos, como diz Marcos (5, 2ss.). Mas também amplia pormenores. Por exemplo, em vez de um possesso, como faz Marcos, fala de dois.
Fundamentalmente, a cena pretende descrever um encontro de Jesus com os pagãos, dominados pelas forças do mal, como já aconteceu no episódio do centurião (Mt 8, 1-17). Mas, enquanto o centurião acreditou e aceitou Jesus, os habitantes de Gádara não crêem e rejeitam-no.
A imagem dos «sepulcros», a força de Jesus diante dos demónios e a sua «fraqueza» diante dos homens faz desta cena o claro reflexo de uma meditação sobre a paixão, incluindo a rejeição pelos homens, bem expressa no pedido dos gadarenos para que Jesus se retire da sua cidade. A expressão «antes do tempo» (v. 29) também indica a relação desta cena com a paixão, quando Jesus, ainda que expulso da cidade santa, irá vencer sobre a força negativa da morte, da dispersão da Igreja, abrindo passagem para que fosse possível «passar por aquele caminho» (v. 28). O poder de Jesus só se revela no mistério insondável da cruz.
Meditatio
Comove-nos ler a história de Agar, perdida no deserto com o seu menino, e profundamente desesperada porque o vê condenado a morrer de sede. «Não quero ver o meu filho morrer!», exclamou (v. 16). Agar nem se lembra de rezar. Mas Deus escuta o choro da criança, «e o mensageiro de Deus chamou do céu Agar e disse-lhe: «Que tens tu, Agar? Nada temas, porque Deus ouviu a voz do menino... Ergue-te, vai buscar outra vez o teu filho, toma-o pela mão» (vv. 17-18). A escrava encontrava-se, com o seu filho, numa situação desesperada. Mas Deus é fiel e intervém. E escutamos as palavras que havemos de acolher com muita atenção: «Deus abriu-lhe os olhos e ela viu um poço onde foi encher o odre e deu de beber ao filho» (v. 19). O poço já lá estava. Mas Agar estava como que cega, por causa do seu desespero, e não o via. A intervenção de Deus faz-lhe ver a salvação. Quando Deus nos ilumina, conseguimos ver a realidade das coisas e encontrar soluções para a nossa perplexidade e incerteza. Há que pedir a Deus a sua luz, a luz do seu Espírito, na oração. Há que pedi-la também para os que governam este mundo. Ser-lhes-á mais fácil encontrar soluções justas para tantos conflitos, que cobrem de sangue a terra, para tantas injustiças, que causam imensos sofrimentos a tantos dos nossos contemporâneos. Iluminados pelo Senhor, saberão encontrar leis justas e respeitosas da dignidade das pessoas. Tantas vezes estamos próximos do Salvador, e não O vemos. Tantas vezes fazemos como os habitantes de Gádara que, depois do milagre, pediram a Jesus que se afastasse: «Toda a cidade saiu ao encontro de Jesus e, vendo-o, rogaram-lhe que se retirasse daquela região» (v. 34). Estava a prejudicar os seus negócios mesquinhos? O seu egoísmo cegava-os. Por isso, não conseguiram ver n´Ele o libertador poderoso contra o demónio!
Não é fácil entrarmos no cumprimento de onda do Senhor, sintonizar com o seu pensamento. Há momentos em que isso se torna particularmente difícil, porque Deus vai mais longe que o nosso humano bom senso. É o que nos ensinam as leituras de hoje. Deus pede a Abraão que apoie a repúdio de Sara. Abraão consente, obedece à palavra, e o Senhor abençoará o bebé, aparentemente condenado a morrer. Para libertar os endemoninhados de Gádara, prejudica a economia dos criadores de porcos... Deus, por vezes, propõe-nos caminhos que não são os nossos, que são exigentes. Mas não exerce violência sobre a nossa liberdade. Deixa-nos sempre livres para optar num sentido ou noutro. Uma coisa é certa: quando a sua palavra nos incomoda, nunca é em vista da morte, mas da vida.
Oratio
Senhor, só Tu tens palavras de vida eterna! A quem iremos pedir ajuda e salvação? Quero agradecer-Te porque, cada dia, a tua palavra ecoa no meu coração, sempre viva, sempre nova, sempre exigente, sempre provocante. Que jamais me esconda atrás dos meus cálculos mesquinhos. Que eu Te siga pelos caminhos da liberdade e do amor, porque sempre lanças os meus pecados para o fundo do mar, e me dás possibilidade de ressuscitar como nova criatura, amada por Deus Pai. Amen.
Contemplatio
Jesus viera para operar a grande obra da reconciliação. Tudo estava preparado e, no entanto, leva uma longa vida de trinta anos, desconhecida, escondida, em aparência inactiva e inútil. O Redentor tinha sido prometido ao género humano e anunciado pelos profetas. Os sinais da sua vinda estavam marcados. Era esperado pelos justos com um ardente desejo. Prodígios foram realizados na altura do seu nascimento. A própria natureza manifestou a sua alegria pela vinda do Criador. Uma estrela maravilhosa surpreendeu os sábios do Oriente e conduziu-os ao presépio. Mas logo a seguir, que silêncio! Tudo retorna à obscuridade e à calma. Os que acreditavam verdadeiramente, os que seguiam a atracção da graça, a voz dos anjos e as inspirações do Espírito Santo, conservavam no seu coração a recordação dos mistérios que tinham tido um brilho tão curto. Adoravam no silêncio, na esperança e no abandono, os decretos da sabedoria, do amor e da misericórdia de Deus. E esta vida obscura, vida de submissão, de trabalho e da misericórdia de Deus vai durar trinta anos! Quem é que está em condição de aprofundar as vias da sabedoria, do amor e da bondade de Deus? Quem pode conceber e contar os actos de virtude destes anos de obscuridade? E então porquê tudo isto? Porquê esta viagem penosa e longa ao país pagão e idólatra? Porque Jesus era vítima, porque era libertador e redentor; porque isto correspondia aos desígnios de misericórdia que os homens não podiam compreender perfeitamente. (Leão Dehon, OSP 3, p. 41s.).
Actio
Repete frequentemente e vive hoje a palavra:
«Pai, nas tuas mãos entrego o meu espírito» (Lc 23, 46).

Senhor, salva-nos, que perecemos!-Dehonianos


2 Julho 2019
Lectio
Primeira leitura: Génesis 19, 15-29
Naqueles dias, ao amanhecer, os mensageiros insistiram com Lot, dizendo-lhe: «Ergue-te, foge com a tua mulher e as tuas duas filhas que estão aqui, a fim de não morreres também tu no castigo da cidade.» 16E como ele se demorava, os homens agarraram-no pela mão, a ele, à mulher e às duas filhas, porque o Senhor queria poupá-los, e conduziram-nos para fora da cidade. 17Depois de os terem conduzido para fora, um dos mensageiros disse-lhe: «Escapa-te, se quiseres conservar a tua vida. Não olhes para trás nem te detenhas em parte alguma do vale. Foge para o monte, de contrário morrerás.» 18Lot disse-lhe: «Não, Senhor, peço-te 19Este teu servo mereceu a tua benevolência, pois demonstraste a tua imensa generosidade para comigo, conservando-me a vida, mas não poderei fugir até ao monte, pois a destruição atingir-me-ia antes e eu morreria. 20Há aqui perto uma cidade, na qual obterei refúgio. É muito pequena; permiti que eu vá para lá. É tão pequena! E salvarei a minha vida.» 21Ele disse-lhe: «Concedo-te ainda o favor de não destruir a cidade a que te referes. 22Apressa-te, porém, a refugiar-te nela, pois nada posso fazer antes de lá chegares.» Por isso, deram àquela cidade o nome de Soar. 23Erguia-se o sol sobre a terra, quando Lot entrou em Soar. 24Então, o Senhor fez cair do céu, sobre Sodoma e Gomorra, uma chuva de enxofre e de fogo, enviada pelo Senhor. 25Destruiu estas cidades, todo o vale e todos os habitantes das cidades e até a vegetação da terra. 26A mulher de Lot olhou para trás e ficou transformada numa estátua de sal. 27Abraão levantou-se de manhã cedo e foi ao lugar onde tinha estado na presença do Senhor. 28Voltando os olhos para o lado de Sodoma e Gomorra e para a extensão do vale, viu elevar-se da terra um fumo semelhante ao fumo de uma fornalha. 29Ao destruir as cidades do vale, porém, Deus recordou-se de Abraão e salvou Lot do cataclismo com que arrasou as cidades onde habitava Lot.
A imaginação, apoiada em vagas orientações bíblicas, situa Sodoma na zona sul da margem ocidental do rio Jordão. Ainda hoje aí se podem ver blocos salinos de formas caprichosas, que causam forte impressão a quem os observa. Mas não há vestígios materiais que permitam identificar a cidade. Os seus eternos vestígios consistem em ser símbolo de um mundo corrompido e paradigma da justiça e do juízo de Deus. É essa a perspectiva do autor sagrado. Sodoma, e a sua terrível destruição, realçam o contraste entre a hospitalidade de Abraão e a falta de hospitalidade dos seus habitantes. Lot, que escolheu a melhor parte, perde tudo: terra, bens, mulher. A sua posteridade nascerá de incesto com as filhas. Abraão, pelo contrário, tendo confiado na promessa de Deus, terá uma descendência numerosa e possuirá a terra. O nosso texto começa com uma dramática tensão entre a solicitude dos mensageiros e a demora de Lot. Só o parentesco com Abraão o salva. Graças a esse parentesco, Deus usa de «uma grande misericórdia» para com ele, permitindo-lhe refugiar-se em Soar.
A narrativa termina com Abraão a olhar, do alto de um monte, a desgraça das cidades pecadoras. Não se trata do olhar curioso de Sara, que ficou petrificada, mas do olhar de quem se sente objecto da "memória" de Deus que salva.
Evangelho: Mateus 8, 23-27
Naquele tempo, 23Jesus subiu para o barco e os discípulos seguiram-no. 24Levantou-se, então, no mar, uma tempestade tão violenta, que as ondas cobriam o barco; entretanto, Jesus dormia. 25Aproximando-se dele, os discípulos despertaram-no, dizendo-lhe: «Senhor, salva-nos, que perecemos!» 26Disse-lhes Ele: «Porque temeis, homens de pouca fé?» Então, levantando-se, falou imperiosamente aos ventos e ao mar, e sobreveio uma grande calma. 27Os homens, admirados, diziam: «Quem é este, a quem até o vento e o mar obedecem?»
De modo muito estilizado, Mateus refere o episódio da tempestade acalmada. O propósito de Mateus não é tratar o acontecimento em si, mas indicar o seu significado. A Igreja é uma barca em tormenta, onde está Jesus e os discípulos. «Os discípulos seguiram-no», diz-nos o texto (v. 23). Esta palavra traduz, para Mateus, o aspecto essencial do discipulado: «seguir» Jesus. De facto, o verbo «seguir» é utilizado unicamente quando se trata de Jesus. Indica a união do discípulo com o Jesus da história, a participação na sua vida, a entrada no Reino através da pertença a Cristo pela obediência e pela confiança. Dizer a Jesus: «Desperta, Senhor, porque dormes?» (Sl 44, 24) e «Senhor, salva-nos, que perecemos!», significa reencontrar-se como crentes, como fiéis, como discípulos, e encontrar Jesus como Senhor e Cristo. Na sua presença não há tempestade, não há paixão, não há morte que resistam. A sua autoridade e o seu poder restauram a ordem da graça. Os discípulos nem sempre correspondem com fé e confiança ao senhorio de Jesus. O sono de Jesus representa o drama da morte do Filho do homem, que desafia a Igreja à fé e à serena confiança no Pai como Aquele que «se fez obediente até à morte e morte de cruz» (Fl 2, 8).
Meditatio
A leitura do livro do Génesis apresenta-nos o cuidado de Deus em salvar Lot da catástrofe das cidades pecadoras. Impressiona-nos tal cuidado. O texto insiste em sublinhá-lo: «Ao amanhecer, os mensageiros insistiram com Lot, dizendo-lhe: «Ergue-te, foge com a tua mulher e as tuas duas filhas que estão aqui, a fim de não morreres também tu no castigo da cidade» (v. 15). Lot não revelava pressa, adiava a decisão de partir, queria permanecer na sua casa, no seu ambiente. Talvez esperasse para ver e, se o perigo se tornasse iminente, então, partir. Mas os mensageiros tomam-no pela mão e conduzem-no para fora da cidade. Depois insistem, mais uma vez: «Escapa-te, se quiseres conservar a tua vida. Não olhes para trás nem te detenhas em parte alguma do vale. Foge para o monte, de contrário morrerás» (v. 17). Mas Lot continua a protelar a partida, e atreve-se a pedir para não ir para muito longe: «Há aqui perto uma cidade, na qual obterei refúgio. É muito pequena; permiti que eu vá para lá» (v. 20).
O Senhor faz tudo para nos salvar. Mas nós, muitas vezes, somos reticentes, desinteressados. Não nos damos conta dos perigos que corremos. Teimamos em permanecer nos nossos hábitos e rotinas. Estamos apegados aos nossos bens, às circunstâncias comuns da nossa vida. Deus convida-nos a tomar caminhos seguros, honestos, e nós preferimos atalhos obscuros, ambíguos. Não queremos renunciar decididamente às situações perigosas. Mas Deus é perseverante e insiste. Temos sorte com um Pai tão cuidadoso, que conhece os perigos muito melhor do que nós e nos convida a escutá-l´O, a avançar, para atingirmos a vida em plenitude.
O evangelho apresenta-nos uma situa&cced
il;ão diferente. Os Apóstolos estão em alto mar, na barca com Jesus. «Levantou-se, então, no mar, uma tempestade tão violenta» (v. 24). Quando se está numa barca e se levanta uma tempestade, não há alternativas. Há que enfrentar decididamente o perigo, pois não é possível fugir. Os Apóstolos não encontraram outra solução senão rezar. Jesus dormia. Por isso, «aproximando-se dele, os discípulos despertaram-no, dizendo-lhe: «Senhor, salva-nos, que perecemos!» (v. 25). Jesus, «levantando-se, falou imperiosamente aos ventos e ao mar, e sobreveio uma grande calma» (v. 26). A oração dos Apóstolos, mais do que fé, manifestava medo. Por isso, Jesus repreende-os: «Porque temeis, homens de pouca fé?» (v. 26).
Quem embarcou com Jesus não deve ter medo. O mais importante é mesmo ter embarcado com Ele. Ainda que o Senhor pareça dormir, não nos abandona. Isso não significa que tenhamos sempre uma vida tranquila, sem problemas, sem dificuldades. Mas estamos certos da sua ajuda e da sua vitória final.
Tanto a primeira leitura, como o evangelho, nos garantem que o mais importante é estarmos unidos a Deus no amor. Essa união pressupõe o desapego de muitas coisas secundárias. Só os que são capazes de se desapegar do que é secundário podem salvar-se, podem chegar à vitória: «Em tudo isso - escreve Paulo - saímos mais do que vencedores,graças àquele que nos amou» ( Rm 8, 37). E continua o Apóstolo: «Estou convencido de que nem a morte nem a vida, nem os anjos nem os principados, nem o presente nem o futuro, nem as potestades, nem a altura, nem o abismo, nem qualquer outra criatura poderá separar-nos do amor de Deus que está em Cristo Jesus, Senhor nosso» (vv. 38-39).
Oratio
Senhor, meu Deus, como és grande, como és benevolente! Os céus não podem conter-Te. Mas, ao vires à terra, fizeste-Te pobre e completamente disponível. Fizeste-Te nosso pão de cada dia. Queres saciar-nos de vida e de amor. Dá-nos um coração agradecido, um coração generoso e alegre. Dá-nos um coração que nos permita testemunhar a tua benevolência, a tua amizade por todos os homens. Torna-nos intercessores audazes, para que a nenhum dos homens e mulheres deste mundo falte a alegria de saber-se pensado, escolhido e amado por Ti, desde toda a eternidade. Amen.
Contemplatio
Se a alma for fiel a estas primeiras sugestões da graça, Nosso Senhor reduplica a solicitude, porque o bom acolhimento feito a uma graça leva-o a conceder outra. Se o pecador for surdo a estas sugestões sem ser desprovido de generosidade, Nosso Senhor far-lhe-á a graça de lhe enviar uma provação que provoque o regresso a si mesmo. Durante esta prova, fala mais amigavelmente ao seu coração; faz-lhe sentir vivamente toda a torpeza do seu estado, todo o perigo da sua situação. Procura promover nele um sentimento de humildade. Se o pecador for fiel às sugestões da graça, se não recuar diante do esforço a fazer para tomar consciência da miséria na qual caiu, para ver a porcaria de que se sujou, a lepra de que se cobriu, Nosso Senhor recompensa este primeiro sentimento tornando-o mais vivo. O coração penetrado de um desprezo profundo por si mesmo abre-se à acção divina. Um toque poderoso parte então este coração humilhado e ele confessa a sua falta. Geme pela sua miséria, que lhe aparece então em toda a sua torpeza. Compara o seu estado ao dos servos fiéis que vivem numa doce paz de alma sob os olhares benevolentes de Nosso Senhor. O sentimento da sua indignidade é então tão vivo, que ele exclama como o filho da parábola: «Meu Deus, não sou digno de ser vosso filho, mas tende piedade de um pobre coração contrito e humilhado». Levanta-se então resolutamente para entrar de novo em graça com Deus. O Coração de Jesus, emocionado de compaixão, facilita a esta querida alma a penosa caminhada à qual finalmente se resolveu. Nosso Senhor acolhe de braços abertos o infeliz que desde este instante se torna de novo seu filho bem-amado. (Leão Dehon, OSP 4, p. 123s.).
Actio
Repete frequentemente e vive hoje a palavra:
«Senhor, salva-nos, que perecemos!» (Mt 8, 25)

As raposas têm tocas-Dehonianos


1 Julho 2019
Lectio
Primeira leitura: Génesis 18, 16-33
Naqueles dias, os homens que tinham estado com Abraão, junto do Carvalho de Mambré, levantaram-se e partiram em direcção de Sodoma, e Abraão acompanhou-os para deles se despedir. 17O Senhor disse, então: «Ocultarei a Abraão o que vou fazer? 18Ele deve tornar-se uma nação grande e poderosa e Eu abençoarei nele todos os povos da Terra. 19Escolhi-o, de facto, para que dê ordens a seus filhos e à sua casa depois dele, no sentido de seguirem os caminhos do Senhor, praticando a justiça e a rectidão, a fim de que o Senhor cumpra a favor de Abraão as promessas que lhe fez.» 20O Senhor acrescentou: «O clamor de Sodoma e Gomorra é imenso e o seu pecado agrava-se extremamente. 21Vou descer a fim de ver se, na realidade, a conduta deles corresponde ao brado que chegou até mim. E se não for assim, sabê-lo-ei.» 22Os homens partiram dali, e encaminharam-se para Sodoma. Abraão, porém, continuava ainda na presença do Senhor. 23Abraão aproximou-se e disse: «E será que vais exterminar, ao mesmo tempo, o justo com o culpado? 24Talvez haja cinquenta justos na cidade; matá-los-ás a todos? Não perdoarás à cidade, por causa dos cinquenta justos que nela podem existir? 25Longe de ti proceder assim e matar o justo com o culpado, tratando-os da mesma maneira! Longe de ti! O juiz de toda a Terra não fará justiça?» 26O Senhor disse: «Se encontrar em Sodoma cinquenta justos perdoarei a toda a cidade, por causa deles.» 27Abraão prosseguiu: «Pois que me atrevi a falar ao meu Senhor, eu que sou apenas cinza e pó, continuarei. 28Se, por acaso, para cinquenta justos faltarem cinco, destruirás toda a cidade, por causa desses cinco homens?» O Senhor respondeu: «Não a destruirei, se lá encontrar quarenta e cinco justos.» 29Abraão insistiu ainda e disse: «Talvez não se encontrem nela mais de quarenta.» O Senhor disse: «Não destruirei a cidade, em atenção a esses quarenta.» 30Abraão voltou a dizer: «Que o Senhor não se irrite, por eu continuar a insistir. Talvez lá se encontrem trinta justos.» O Senhor respondeu: «Se lá encontrar trinta justos, não o farei.» 31Abraão prosseguiu: «Perdoa, meu Senhor, a ousadia que tenho de te falar. Talvez não se encontrem lá mais de vinte justos.» O Senhor disse: «Em atenção a esses vinte justos, não a destruirei.» 32Abraão insistiu novamente: «Que o meu Senhor não se irrite; não falarei, porém, mais do que esta vez. Talvez lá não se encontrem senão dez.» E Deus respondeu: «Em atenção a esses dez justos, não a destruirei.» 33Terminada esta conversa com Abraão, o Senhor afastou-se, e Abraão voltou para a sua morada.
As três personagens misteriosas que encobrem a manifestação de Deus a Abraão em Mambré (Gn 18, 1s.) puseram-se a caminho de Sodoma, como que para assinalá-la, enquanto Deus fica com o patriarca (Gn 18, 16.22), para suscitar nele precisamente a questão da cidade pecadora. A passagem que agora nos ocupa faz de prólogo à narração do pecado de Sodoma (Gn 19). Abraão, o «amigo de Deus», escolhido para ser o pai de uma grande nação, é apresentado como o grande intercessor, no contexto de uma precisa reflexão teológica. O Patriarca aparece, de facto, como o «pai da justiça e do direito», realidades que são a vida de aliança com Deus. O narrador indica o verdadeiro objectivo da narrativa no solilóquio de Deus. É importante que Abraão e a sua descendência compreendam o sentido do castigo de Sodoma, de modo que seja salva a justiça divina. O "caso" da cidade pecadora é um bom exemplo para tratar o tema da salvação dos justos e da punição dos maus, bem como do papel de um intercessor. No v. 20 é apresentado o clamor de Sodoma e Gomorra e o seu pecado. Por enquanto não se sabe de que pecado se trata. No capítulo 19 ficaremos a saber que se trata de uma gravíssima falta contra a hospitalidade. Voltam, então, à cena as três personagens da narrativa anterior, cujas funções se tornam claras. Duas dirigem-se a Sodoma, enquanto Deus continuava junto de Abraão. Abraão aparece como poderoso intercessor, sumamente interessado em salvar os justos. Deus acaba por se mostrar interessado em salvar as cidades em atenção a poucos justos. Bastavam dez. Aqui, Abraão detém-se. Não ousa avançar para o caso de haver um só justo. Ainda passará muito tempo, antes de aparecer o único Justo (cf. Is 53) capaz de salvar a todos pela oferta da própria vida e com o sacrifício perfeito, Jesus «sempre vivo a interceder por nós» (Heb 7, 21).
Evangelho: Mateus 8, 18-22
Naquele tempo, 18vendo Jesus em torno de si uma grande multidão, decidiu passar à outra margem. 19Saiu-lhe ao encontro um doutor da Lei, que lhe disse: «Mestre, seguir-te-ei para onde quer que fores.» 20Respondeu-lhe Jesus: «As raposas têm tocas e as aves do céu têm ninhos; mas o Filho do Homem não tem onde reclinar a cabeça.» 21Um dos discípulos disse-lhe: «Senhor, deixa-me ir primeiro sepultar o meu pai.» 22Jesus, porém, respondeu-lhe: «Segue-me e deixa os mortos sepultar os seus mortos.»
Jesus decide «passar à outra margem» (v. 18). Mas, antes de executar a sua decisão, ilustra as exigências requeridas a quem O quer seguir, as exigências da fé. Quem quiser seguir a Cristo, como o escriba, deve saber ao que se compromete, qual o modo de vida que o espera, quem é Aquele a quem escolheu. Sabendo isso, há-de estar disposto a aceitar os sofrimentos, as adversidades e a paixão como passagens obrigatórias. Foi esse o caminho do Senhor e Mestre, Jesus Cristo. A expressão «as raposas têm tocas e as aves do céu têm ninhos; mas o Filho do Homem não tem onde reclinar a cabeça» está construída em estilo oriental: depois de duas imagens positivas, vem uma negativa. Alguns exegetas vêem aqui uma alusão ao celibato de Jesus: não tem casa, não tem família. A expressão «Filho do Homem», que aparece pela primeira vez no evangelho, indica a precariedade de Jesus, o seu ser sem casa nem raiz, sem referência nem refúgio. A contraposição entre Jesus e «os mortos» indica a ruptura que «Aquele que vive» veio inserir na experiência dos homens. Aquele que é a Vida, aponta o Caminho: não ter onde reclinar a cabeça, para dormir e para morrer, é condição para que a vida seja restituída à sua verdade.
Meditatio
A intercessão de Abraão é um exemplo de familiaridade e de respeito para com Deus. Abraão actua como os orientais gostavam, e gostam, de actuar no mercado: negoceiam, regateiam. Fala com Deus como falaria com um homem: «Se encontrar...cinquenta... quarenta e cinco... quarenta...trinta... vinte... dez...». Está consciente de que não tem direito a nada, porque
é «apenas cinza e pó». Parece que Deus gosta da insistência e que, a cada novo pedido, condescenda com Abraão: «Não destruirei». Assim fica confirmado o papel de intercessores que os santos exercem no mundo. Abraão não ousa avançar mais na sua oração e perguntar: «E se houver apenas um justo?» O sentido da corresponsabilidade era tão forte no Antigo Testamento, que ninguém pensaria em tal possibilidade. Só muitos séculos depois virá ao mundo único justo capaz de salvar, não só as cidades corruptas, mas também toda a humanidade, purificando-a com o seu sangue. Em Jesus, Deus estará mais connosco, e escolherá amigos para associar à sua missão de Salvador. No evangelho de hoje, escutamo-l´O a afirmar a urgência de O seguirmos, por amor, desapegando-nos de tudo. Se aderirmos a Ele com todo o nosso ser e a nossa vida, seremos seus amigos, seus colaboradores e válidos intercessores em favor dos irmãos.
Como cristãos, e como dehonianos, somos unidos «à acção de graças e à intercessão de Cristo», sentimo-nos «chamados a colocar toda a nossa vida ao serviço da Aliança de Deus com o seu Povo», e actuamos em prol da «unidade dos cristãos e de todos os homens» (Cst 84)
Sabemos que as nossas frágeis forças humanas são insuficientes para realizar esta missão, mas recordamos a consoladora promessa de Cristo: «Eis que Eu estou convosco todos os dias até ai fim do mundo» (Mt 28, 20). Jesus, o Justo, que a todos salva, é o Emanuel, o Deus connosco, sobretudo por meio da Sua presença na Eucaristia, onde, como no Céu, vive a interceder por nós. A presença eucarística de Jesus, ensina-nos a fazer-nos eucaristia, presença amorosa e solícita no meio dos irmãos, a interceder por eles, a ser servidores da Aliança e a actuar em prol da unidade entre os cristãos e entre todos os homens: a «ser profetas do amor e servidores da reconciliação dos homens e do mundo em Cristo» (Cst 7).
Oratio
Bendito és Tu Senhor, nosso Pai, que nos envias o Espírito do teu Filho, para que possamos ser com Ele advogados e intercessores do teu povo. Em união com Cristo, oferecemo-nos a Ti e intercedemos pela salvação de todos homens. Infunde a tua misericórdia e a tua paz sobre os justos e os injustos, sobre os pobres e os infelizes, sobre os violentos e os que sofrem perseguição. Escuta, ó Pai, a nossa súplica e perdoa as nossas culpas. Renova o nosso coração e acolhe-nos na tua presença. Faz de nós um sacrifício perene e agradável. Amen.
Contemplatio
Embora toda a graça venha de Deus, o Sagrado Coração quer premiar todos os seus Santos: «Recebei, diz-lhes, a coroa, a auréola e a alegria que meu Pai vos preparou desde toda a eternidade». A mim, Nosso Senhor quer dizer-me: «Eis os meus amigos, eis aqueles que lavaram as suas túnicas no sangue do Cordeiro, vieram da grande tribulação, e agora servem a Deus no seu templo, estão ao abrigo das necessidades da vida terrestre e deixo-os beber nas fontes refrescantes das minhas chagas e sobretudo do meu Coração» (Ap7, 14). Como a S. João na grande visão de Patmos, Nosso Senhor mostra-me sucessivamente os profetas e os apóstolos, amadurecidos pela sabedoria, os evangelistas que conduzem o carro da Igreja, os mártires que levam a palma da vitória, as virgens que seguem por toda a parte o cordeiro e a multidão dos confessores que cantam o seu reconhecimento. Que grande lição para meditar! Eis, portanto, o caminho do céu: a sabedoria dos anciãos, o zelo dos evangelistas, dos pontífices e dos padres, a pureza das virgens, a piedade dos confessores, a força de alma dos mártires. Eis para mim um tema infinito de reflexões. E vejo que os anjos e os Santos colocam nos seus turíbulos celestes as orações da Igreja militante com as suas; e como hoje recorro à intercessão de todos os Santos, é de uma infinidade de turíbulos que as minhas humildes preces e louvores unidas às preces dos Santos se elevarão para Deus com uma eficácia infinita. (Leão Dehon, OSP 4, p. 419s.).
Actio
Repete frequentemente e vive hoje a palavra
«O Senhor é clemente e cheio de compaixão» (Sl 145 (144), 8).